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Boca de urna do Oscar: eleitores da academia comentam suas escolhas

Vinte membros da academia contam motivos para votar ou não em cada um dos filmes indicados

Por Brooks Barnes
Atualização:

LOS ANGELES - A votação para a 91.ª edição do Oscar termina nesta terça, 19, com aproximadamente 8.200 “iniciados” da indústria cinematográfica usando um website privado para indicar seus escolhidos. O que passa na cabeça deles na hora de decidir? Num mundo perfeito, cada um assumirá sua tarefa com a máxima seriedade, assistindo a todos os filmes e deixando de lado qualquer tipo de preconceito para avaliar apenas o grau de arte na tela. Mas Hollywood não é uma utopia.

Chadwick Boseman e Michael B. Jordan em 'Pantera Negra', que concorre ao Oscar Foto: Matt Kennedy/Marvel

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Essa votação tem a ver com intolerâncias pessoais e rancores mesquinhos. Tem a ver também com quem tem a maior parte de amigos no grupo votante, composto por 69% de homens, 84% deles brancos, apesar dos anos de luta pela diversidade. E envolve uma questão de negócios – mais propriamente, se a Netflix deve ser incorporada ao setor ou mantida à parte como um clube, independente da qualidade dos filmes que ela tem oferecido.

Assim, como experimento, perguntei a 20 membros da academia (não diretamente associados com os indicados deste ano) como avaliam os oito candidatos ao prêmio de melhor filme. Nenhum deles falou sobre sua escolha, mas as respostas dizem muito sobre o Oscar em particular e Hollywood em geral. Eis um amálgama dos comentários.

Pantera Negra

Um eleitor muito crítico e mais antigo comparou os filmes de super-herói a “algo que escoa como lixo atrás dos restaurantes de fast-food”. Depois, confessou que não assistiu a Pantera Negra

Mas muitos disseram que colocariam este filme próximo do topo dos seus votos – citando as atuações impressionantes dos atores, o design de produção suntuoso e sua importância cultural. (A academia usa um sistema de votação complicado para o melhor filme, chamado “preferencial”, em que os indicados recebem notas de um a oito e as segunda e terceira posições têm tanto peso quanto a primeira).

O problema, pelo menos para alguns, é que Pantera Negra foi produzido pela Marvel, que pertence à Disney, que tornou qualquer outro estúdio um azarão de bilheteria. E será ainda pior quando a Disney concluir sua aquisição da 20th Century Fox. “E agora é de supor que vamos dar à Disney o Oscar de melhor filme?”, questionou um eleitor de um estúdio concorrente.

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Infiltrado na Klan

Dirigido por Spike Lee, Infiltrado na Klan recebeu elogios por sua originalidade e seu peso intelectual. Como disse um eleitor, “é o tipo de filme que persiste nos livros de história. Ninguém vai perguntar ‘você votou realmente nesse filme?’ por vários anos’”. Do lado negativo, filmes agraciados com a estatueta normalmente criam um vínculo mais emocional com os eleitores. Já Infiltrado na Klan foi “profundamente admirado, mas sem necessidade de assisti-lo novamente”.

Mas Spike Lee poderá ser a melhor esperança de a cerimônia ter um momento viral. Alguns gostam da ideia de vê-lo no palco recebendo o prêmio e criticar duramente os estúdios por marginalizarem as minorias. “Consegue imaginar?”, disse um eleitor. (Lee também é indicado ao Oscar de melhor diretor pela primeira vez em sua carreira.)

Bohemian Rhapsody

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O filme biográfico sobre a banda Queen, dirigido por Bryan Singer (pelo menos até ele ser demitido por mau comportamento), está entre uma das mais surpreendentes indicações ao prêmio de melhor filme que se tem memória – e isso diz alguma coisa, considerando que o filme Babe, o Porquinho Atrapalhado disputou o Oscar em 1996. Os eleitores usaram palavras como “superficial” e “confuso” para descrever Bohemian Rhapsody, que recebeu críticas não muito entusiasmadas e levou a um protesto por atenuar o lado gay de Freddie Mercury.

Quase todos admitiram ter sido um prazer assistir ao filme diante da atuação de Rami Malek como Mercury (indicado ao Oscar). Todos os 20 eleitores disseram que votariam em Malek para melhor ator.

O que surpreendeu é que muitos disseram que não apoiaram o envolvimento de Bryan Singer com o filme. O diretor há muito tempo vem recebendo alegações de má conduta sexual e novas acusações de abuso de garotos menores de idade foram publicadas no The Atlantic um dia depois das indicações serem anunciadas. Singer rejeitou as alegações e qualificou o artigo de “difamação homofóbica”.

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A Favorita

Os eleitores gostam de estar no time vencedor. E este filme que tem por cenário a corte da Rainha Ana (cerca de 1710), embora admirado pelas atuações das atrizes, roteiro e figurinos, foi derrotado em várias premiações anteriores ao Oscar. “Adoro este filme, mas não vou desperdiçar meu voto”, disse um eleitor, acrescentando que estava aguardando a premiação do Bafta (da academia de cinema e TV britânica) para tomar sua decisão. (A Favorita abocanhou sete prêmios, mas perdeu o de melhor filme para Roma.) Outros pareceram indecisos quanto a se A Favorita tem uma mensagem positiva sobre mulheres (Olivia Colman, Emma Stone e Rachel Weisz lideram o elenco) ou reforça o estereótipo das Meninas Malvadas (que tramam, traem e manipulam).

Green Book: O Guia

Ninguém achou que essa comédia da época da segregação era perfeita. Não poderia ter um toque de sutileza? E aquela cena do frango fez todos se envergonharem. Mas O Guia tocou profundamente muitos dos eleitores. Um produtor já por volta dos 60 anos disse que o final do filme feliz “o comoveu”. Peter Farrelly, que dirigiu o filme e foi um dos responsáveis pelo roteiro, também se mostrou um promotor eficaz, alguns eleitores observaram, com seu discurso simples na cerimônia do Producers Guild Awards em janeiro. “Quando você fez um filme como Debi e Lóide, jamais espera conquistar um prêmio”, disse Farrelly, referindo-se a um dos seus primeiros filmes. “Estou imensamente agradecido”, comentou.

Roma

Dirigido por Alfonso Cuarón e distribuído pela Netflix, Roma parece estar provocando uma crise de consciência. Devemos votar em Roma porque achamos que é o melhor? Ou não o apoiamos, independente do seu mérito artístico, porque consideramos a Netflix uma ameaça ao frequentador de cinema? Embora a empresa tenha levado Roma para 250 cinemas independentes nos EUA, igual a muitos lançamentos em língua estrangeira, a gigante do streaming na maior parte das vezes evita os cinemas. O filme tem eleitores nos dois campos. Alguns que são contra a Netflix me disseram que votariam em Cuarón para melhor diretor como uma forma de mitigar a culpa. A principal queixa no caso de Roma é seu ritmo mais lento. Um eleitor descreveu o filme em branco e preto como uma obra importante, mas entediante.

Nasce uma Estrela

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É uma estrada longa e acidentada para o Oscar. Este remake, que se tornou um enorme sucesso e era principal candidato ao prêmio de melhor filme no ano passado, num determinado ponto, perdeu o interesse.

Alguns eleitores disseram ter perdido seu entusiasmo depois de o filme receber apenas uma das cinco indicações para o Golden Globe, a de melhor música. Outros culparam Lady Gaga (que tem o papel principal no filme) por seus discursos (no Globo de Ouro e da National Board of Review) que consideraram nauseantes. Alguns eleitores mais velhos disseram ter assistido novamente à versão de Nasce uma Estrela de 1954, com Judy Garland, e chegaram à conclusão de que a atual não era boa, especialmente na sua segunda parte. “É uma obra-prima durante 40 minutos”, disse um produtor.

Vice

Uma única pessoa disse-me que votaria em Vice, sobre Dick Cheney, ex-vice presidente americano, dirigido e escrito por Adam McKay. “Sou amigo de um dos produtores e por isto acho que devo votar nele”, disse um eleitor. Outros elogiaram as atuações (especialmente as de Christian Bale e Amy Adams), mas queixaram que o filme, no geral, se preocupou demais com sua própria engenhosidade e truques visuais.

O movimento de protesto chamado #OscarsSoWhite de 2015 e 2016 também paira sobre Vice. Uma organização como a Academia, repleta de velhos indivíduos brancos, conceder o prêmio de melhor filme do ano a uma película sobre um velho sujeito branco? “Seremos crucificados”, disse um eleitor.

TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO 

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