Capitais da moda preveem um déficit de 600 milhões de dólares devido à covid

Veja um exame do que vem ocorrendo nos quatro principais núcleos da moda no mundo, com o setor prevendo uma segunda temporada perdida

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Por Kim Bhasin , Angelina Rascouet e Flavia Rotondi
Atualização:

Anualmente, durante quatro semanas em fevereiro e março, milhares de executivos, celebridades, influenciadoras e modelos se encontram nas grandes capitais mundiais da moda para assistir aos desfiles. E associada a isto está uma economia multimilionária que resulta em investimentos e gastos de turismo em locais como Nova York, Londres, Paris e Milão.

Caila Quinn posa fora da New York Fashion Week no Spring Studios em Nova York. Foto: Dia Dipasupil/Getty Images/AFP

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Pela segunda temporada consecutiva, tudo isto foi eliminado pela pandemia. Quase todos os desfiles serão virtuais, como ocorreu em setembro. Os hotéis de luxo, normalmente repletos da mais fina flor do mundo da moda, praticamente estarão vazios, clubes e locais de eventos não terão festas, museus e exposições de arte serão espaços fantasma, e as butiques de luxo ficarão sem o dinheiro que vem das clientes dispostas a pagar milhares de dólares por um vestido ou uma bolsa.

As quatro cidades devem contabilizar uma perda de 600 milhões de dólares em atividade econômica nesta temporada, segundo dados compilados pela Bloomberg.

Abaixo, um exame do que vem ocorrendo nos quatro principais núcleos da moda no mundo, com o setor prevendo uma segunda temporada perdida:

Nova York

Pouco depois de terminarem os últimos desfiles em fevereiro do ano passado, a cidade de Nova York se tornou o epicentro da pandemia do coronavírus, contabilizando dezenas de milhares de mortes. Um recrudescimento da pandemia na região nordeste dos Estados Unidos acarretou novas restrições para os negócios, apesar de os índices começarem a declinar recentemente. Entretanto, a Semana da Moda de Nova York, que começou no último fim de semana, vem sendo realizada virtualmente.

Mais de 100 eventos estão no calendário, de painéis a apresentações via streaming e alguns desfiles que incluem elementos físicos. Pilares do mundo da moda como Rebecca Minkoff e Jason Wu participarão como de hábito e mais de uma dezena de jovens estilistas estarão no foco do Black in Fashion Council.

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Modelos apresentam a coleção de Rebecca Minkoff na Semana de Moda de Nova York Foto: Angela Weiss / AFP

Segundo o Council of Fashion Designers of America, esta primavera no hemisfério norte será mais dura, ainda mais difícil do que a última temporada. “Será um grande desafio para todos nós à medida que o mundo enfrenta uma pandemia e uma recessão econômica cada vez mais devastadoras”, afirmou Tom Ford, chairman do CFDA em carta dirigida ao setor.

A Semana da Moda de Nova York costuma gerar centenas de milhões de dólares de receitas anuais, superando o arrecadado pelo torneio de tênis US Open, segundo o Joint Economic Committee do município. Durante tempos normais, o evento atrai mais de 150 mil pessoas que lotam os hotéis de Manhattan, animam a vida noturna da cidade e gastam muito dinheiro.

Londres

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Foi um início de ano confuso para Londres, com a variante do vírus se transmitindo com mais facilidade e forçando um terceiro lockdown, embora a vacina dê esperanças de que um novo aumento catastrófico da infecção talvez seja evitado. O British Fashion Council realizará o evento somente digital a partir de 19 de fevereiro, com exibição de moda feminina e masculina de 95 estilistas de renome, como Victoria Beckham.

A Semana de Moda de Londres normalmente gera mais de US$ 374 milhões, segundo o FashionUnited’s Business Intelligence. E o Oxford Economics estima que 240 mil empregos diretos, representando mais de um quarto de toda a mão de obra do setor de moda inglês, serão perdidos por causa da pandemia, incluindo os empregos indiretos, que chegam a 350 mil.

Modelo apresenta uma criação durante o desfile Mark Fast na London Fashion Week. Foto: REUTERS/Henry Nicholls

Em 2011, Carlo Carello, proprietário de um clube noturno, organizou uma festa durante a Semana de Moda para Roberto Cavalli na Battersea Power Station. Agora ele precisou demitir 80% dos funcionários do seu clube Raffles, um local icônico no bairro de Chelsea. “Realizávamos duas ou três festas durante o evento”, disse Carello. “Uma atividade como a nossa está sendo dizimada”, acrescentou.

Para piorar a situação, mais um problema ameaça o setor da moda britânico. De acordo com a Brexit Walpole, organização que representa as marcas de luxo inglesas, como Burberry, marcas menores deixaram de realizar negócios com a União Europeia porque “há um entendimento imperfeito” de país para país quanto às taxas a serem cobradas agora que o Reino Unido está fora da União Europeia”.

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Milão

Quando a Semana de Moda de Milão tiver início em 23 de fevereiro, ela será totalmente digital, salvo algumas apresentações onde um número limitado de compradores e da mídia foi convidado para assistir. A noite de abertura será uma festa ao vivo pelo Instagram com um DJ e não uma explosão de pessoas numa cidade que, no ano passado, registrou um dos maiores números de mortes por causa da pandemia.

Modelos apresentam criações da coleção masculina K-Way outono / inverno 2021, um dos poucos desfiles não virtuais durante a semana de moda em Milão, Itália. Foto: REUTERS/Alessandro Garofalo

Para manter a cidade envolvida e permitir que as pessoas assistam aos desfiles de marcas emblemáticas italianas como Armani, Prada e Dolce & Gabbana, a Italian Fashion Chamber instalou telões enormes em locais estratégicos no centro de Milão.

“Será um gesto simbólico”, afirmou Carlo Capasa, chairman da entidade e seu diretor executivo. “Será um lembrete para as pessoas de Milão que a moda ainda faz parte da vida de todos, e é resiliente apesar da crise da covid, ainda capaz de representar os valores, a criatividade e a competência da cidade”.

Em anos passados, cada uma das quatro semanas de moda de Milão gerou 30 milhões de euros com os gastos das pessoas em hotéis e restaurantes. Segundo Capasa, essa receita deve cair pelo menos 80%.

Paris

Há um ano, Nicolas Ghesquiere, da Louis Vuitton, realizou seu desfile dentro do Louvre, uma exibição monumental que o cineasta de moda Loic Prigent descreveu como: “uma canção do cisne dos tempos livres de covid”. Foram-se os dias em que a lista de celebridades atraía multidões nas filas para entrar no museu mais visitado do mundo. Desta vez a Semana de Moda feminina de Paris será on-line, com início previsto para primeiro de março.

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Segundo o Institut Français de la Mode, as Semanas de Moda de Paris geravam 450 milhões de euros anuais antes da pandemia. Embora as estimativas, desde que eclodiu a pandemia, não tenham sido publicadas ainda, o montante previsivelmente caiu, disse Pascal Morand, Chairman da Féderation de La Haute Couture et de La Mode, que organiza o evento.

Um mágico e uma modelo apresentam uma criação do estilista indiano Manish Arora durante a Paris Fashion Week. Foto: REUTERS/Benoit Tessier

Cinco dos 12 hotéis de luxo de Paris estão abertos, mas com taxas de ocupação que variam de 5% a 15%, segundo Christophe Laure, chairman da entidade que regula o setor. Antes da covid-19, durante a Semana de Moda, todos os hotéis de luxo estavam abertos, com 80% a 100% dos quartos reservados. “A situação é muito preocupante”, afirmou Laure.

Para Pascal Morand a covid-19 pelo menos democratizou o acesso aos desfiles, com seu formato digital, e os números mostram isso. O desfile de moda masculina da Louis Vuitton no outono do ano passado, sob o comando de Virgil Abloh foi visualizado quase 500 mil vezes na página da marca no YouTube, ao passo que o desfile de 2021 já reuniu mais do que o dobro desse número.

Mas Morand aguarda o dia em que os tradicionais desfiles de moda retornarão, uma vez que a experiência digital “nunca substituirá totalmente a sensação de estar presente”.

TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO