Bia Reis
18 de fevereiro de 2015 | 12h12
Yuji tem apenas 7 anos, mas já é um guerreiro samurai, embora ainda não saiba. A descoberta se dá depois que ele convida alguns amigos para brincar no jardim de casa. Um deles sugere que todos arranquem as mudas de cerejeiras do pai de Yuji para transformá-las em espadas. Os garotos puxam da terra as frágeis árvores, menos Yuji, que pensa no quanto o pai ama o jardim. O menino mais forte o desafia a arrancar a muda, e ele nega. Apanha. Não reage. Chora. É chamado de covarde. Se envergonha. Tenta replantá-las quando os amigos partem. Em vão.
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O avô e o pai chegam em casa e observam a destruição. Yuji conta o que aconteceu, pede desculpas, diz que foi covarde. Quando o pai sai, o avô o chama. Carinhoso, diz a última coisa que o menino esperava ouvir: “Você é um samurai”. Explica, então, que ele segue as sete virtudes do Bushido, o caminho do guerreiro, gi (justiça), yuu (coragem), jin (compaixão), rei (educação), makoto (sinceridade), chuugi (lealdade) e meiyo (honra). Depois, mostra a Yuji como ele utilizou cada virtude na situação em que se envolveu, mesmo a contragosto.
É assim, com amor e poesia, que o escritor André Kondo começa O Pequeno Samurai. O texto, que recebeu menção honrosa na categoria infantil do Prêmio João-de-Barro, em 2009, foi lançado recentemente pela editora FTD, numa linda edição com ilustrações de Alexandre Rampazo.
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Com a alegria de descobrir-se samurai vem a triste notícia de que a família deixará o Japão. Com medo de perder a terra e não ter o que comer, os pais de Yuji decidem imigrar para o Brasil. É por volta de 1908, quando os primeiros japoneses aportam em solo brasileiro.
Kondo conta a emocionante despedida de Yuji dos avós. Durante a viagem, o menino conhece pessoas e aprende com elas. Também ensina. O livro é narrado sob o ponto de vista de Yuji, e há passagens e diálogo engraçados, como quando ele conhece o capitão do navio:
“Dizem que o capitão é a pessoa mais importante do navio, mas o capitão do nosso navio não parecia importante. Mesmo com seu uniforme de botões dourados, sapatos brilhando e chapéu de capitão na cabeça, ele não parecia importante. Acabei dizendo isso a ele:
– E por que você acha isso? – o capitão perguntou, achando graça.
– Em primeiro lugar, uma pessoa importante não conversa com crianças – respondi.
– Quem disse isso? – capitão riu.
– Sempre quando os adultos dizem que vão falar alguma coisa importante, eles me mandar sair. Dizem que não é assunto de criança.
O capitão caiu na gargalhada.
O livro traz como pano de fundo a imigração japonesa para o Brasil, mas não há didatismo. Há poesia, sim, muita poesia.
As ilustrações de Rampazo, que já esteve outras vezes nesta Estante de Letrinhas, como em A Princesa e o Pescador de Nuvens, conversam com perfeição com o texto de Kondo. São igualmente delicadas e poéticas. Para dar a atmosfera de uma história que se passa no início do século passado, Rampazo optou por envelhecer as imagens. Ilustrações em páginas duplas iniciam cada capítulo. Depois, Rampazo trabalha apenas na faixa horizontal inferior de cada página. Uma lindeza.
Serviço
O Pequeno Samurai
Escritor: André Kondo
Ilustrador: Alexandre Rampazo
Editora: FTD
Preço: R$ 38; 64 páginas
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