Serviços de streaming tentam tirar usuário da zona de conforto

Sites inovam para concorrer com Netflix e HBO Go e driblar 'bolha algorítmica'

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Por Matheus Mans
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Não é fácil encontrar novidades em plataformas de streaming, como HBO Go e Netflix. Os serviços, cada vez mais inteligentes e regidos por um poderoso algoritmo, entendem gostos e preferências do usuário, dando apenas indicações de filmes e séries que o deixem em sua zona de conforto. É a “bolha algorítmica”, um dos males do mundo tecnológico de hoje. Dois serviços brasileiros, porém, acabam de surgir e já começam a caminhar na contramão desse movimento.

Serviços de streaming querem que o espectador reflita sobre o que assiste Foto: Lionsgate

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Um deles, o Mappa, criou uma verdadeira estrutura de guerra para desafiar o conforto dos usuários. Fundado por três brasileiras, o serviço também é regido por um algoritmo, uma série de códigos baseados em inteligência artificial. Ao contrário da Netflix e afins, porém, o site brasileiro quer fazer com que usuários quebrem suas barreiras e avancem fronteiras em relação ao conteúdo que é oferecido pelas plataformas, cada vez maior e mais disperso no sistema.

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Para isso, as três criadoras elaboraram uma plataforma um tanto quanto chocante por seu poder de sugestão. O usuário, que precisa pagar uma taxa ao mês de R$ 10, responde a uma série de perguntas, que vão desde questões sobre os gostos diários até um estranho questionamento sobre a possibilidade de querer quatro braços. Depois, a pessoa escolhe o modo de usar o Mappa: se quer se divertir, “sair da caixinha” ou passar a vida a limpo.

Em qualquer um dos modos, o resultado é único: levar a pessoa a pensar em meios de usar o streaming de modo diferente. Afinal, o Mappa libera só três dicas por vez e ainda há a possibilidade de debater significados com outros usuários. “A gente está na contramão do mercado”, diz Débora Emm, cofundadora. “Além de sugerir conteúdos fora da zona de conforto, também não incentivamos as ‘maratonas’. Queremos que as pessoas pensem no que estão assistindo.” 

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Em duas semanas de experiência com o aplicativo, o resultado foi interessante. Dentre as sugestões, a belíssima série Chef’s Table, da Netflix; o curta The Runner, no Vimeo, que faz pessoas falarem de assuntos delicados enquanto praticam corrida; e o longa-metragem The Other Dream Team, sobre um time de basquete da Lituânia. Todos diferentes entre si, mas com o objetivo de fazer o espectador pensar e refletir sobre o significado e o impacto das coisas que está assistindo.

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E a aposta de Débora é alta. Hoje, a estrutura do Mappa é invejável: são oito curadores de conhecimento, que selecionam filmes, série e vídeo de várias plataformas e sites; e uma equipe de tecnologia e design para cuidar do funcionamento. Além disso, o Mappa recebeu um investimento inicial de R$ 2,5 milhões para começar a funcionar em novembro deste ano. “Nossa ideia, porém, é que a gente sobreviva com a assinatura mensal dos usuários”, afirma ainda Débora.

Sommelier. Outro site que vai nesse sentido é o Filmmelier – combinação de “filme” com a expressão “sommelier”. Como o próprio nome já diz, o site faz uma curadoria especializada em filmes que estão em plataformas como Netflix, iTunes e Google Play. A ideia é que o usuário possa navegar entre categorias de filmes sem as amarras da “bolha algorítmica” e se perder em meio às sugestões de conteúdo para conseguir, enfim, se encontrar dentro do mar de informações do streaming.

“Nosso objetivo é iluminar conteúdos em plataformas de streaming e de video-on-demand que não são tão divulgados, como filmes de baixo orçamento ou independentes”, explica Fábio Lima, criador do Filmmelier. “Além disso, nós só temos curadoria humana. Nada de algoritmos. Afinal, acreditamos que, no futuro, é inevitável a interferência humana para a seleção de filmes em uma plataforma de streaming. O conteúdo está cada vez maior e mais disperso.”

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Há quase um ano no ar, o Filmmelier já acumula bons números. Até o momento, são mais de 1 mil filmes catalogados e o objetivo é expandir, ao longo dos próximos anos, ainda mais o conteúdo com novas plataformas e ainda mais apuração do conteúdo que entra ali. “Queremos que o Filmmelier seja a tela inicial de quem está buscando algum filme para assistir no streaming”, afirma Fábio ao Estado. “Queremos fazer a conexão entre o usuário e os conteúdos”, espera também.

Para especialistas, plataformas de curadoria de conhecimento e conteúdo é um nicho que deve ganhar cada vez mais espaço em um mundo digital. “Cada vez mais, teremos mais e mais conteúdo entrando nesses serviços”, afirma Pedro Domingues, professor de ciências da computação da Universidade de Washington. “Não se surpreenda se, daqui a alguns anos, a gente tenha dezenas de serviços de curadoria para diferentes tipos de conteúdo. É um processo sem volta.”

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