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O chefe de ‘Dexter’ comenta os novos jeitos de ver TV

Scott Buck diz que público mudou com serviços sob demanda e locadoras virtuais, mas séries ainda são feitas como antigamente

Por Clarice Cardoso
Atualização:

Um homem capaz de atos deploráveis é um herói aos olhos de uma grande audiência. O quase vilão que vira queridinho do público tem se tornado comum nas séries, e um dos mais marcantes da TV contemporânea é Dexter Morgan, da série homônima, vivido por Michael C. Hall em oito temporadas.

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A série trata de um serial killer que, guiado por um rígido código de ética criado por seu pai, mata com requintes de crueldade criminosos que conseguiram escapar da polícia. A premissa é ousada, e as primeiras temporadas guardam um tom de atrevimento que manteve o público interessado. Depois, vieram alguns tropeços, e ela parecia se repetir. “Era quase inevitável estando há tanto tempo no ar”, admite Scott Buck, o showrunner, ou seja, o grande nome por trás de Dexter.

“Quando qualquer série começa a envelhecer, as fórmulas passam a soar familiares para quem a acompanha de perto. Aí, você se vê diante de um dilema: tentar surpreender e acabar com algo um pouco diferente, ou deixar como está, correndo o risco de se tornar previsível. Nos dois casos, você vai decepcionar alguém”, explica ao Estado por telefone do Rio, onde participou do 2.º Programa Globosat de Roteiristas.

“A responsabilidade principal de um showrunner é entregar ao público a série de que gosta, ser inovador e manter-se fiel à sua proposta original, o que fica mais difícil ao longo dos anos.”

Com tanta experiência na televisão, Scott tem uma visão privilegiada das mudanças no comportamento do telespectador em relação ao conteúdo. Mesmo no Brasil, já são consideráveis as opções que oferecem a liberdade de decidir como e quando ver seu programa favorito: há a TV sob demanda, os sites como o Netflix e os aparelhos, que algumas operadoras brasileiras oferecem há alguns anos, que permitem gravar a programação e assistir quando quiser. Isso muda a relação que nós temos com aquilo a que estamos vendo, e Scott nota em si mesmo esses efeitos.

“Eu mesmo não faço ideia de quais programas estão no ar, há anos não sei. Porque mesmo que eles não estejam em serviços sob demanda, eu posso gravá-los e ver depois. São muito poucos os títulos que me cativam a ponto de me fazer ir para casa na hora exata em que vão ao ar, e acho que isso se aplica a boa parte da audiência norte-americana. Uma tendência que tende a se espalhar. O roteirista tem de estar ciente de que há opções de mais. Não estamos naquela época em que alguém via o que estivesse passando. A gente vê exatamente o que quiser”, afirma.

Outro hábito que cresce entre grupos de fãs é o de comprar caixas de DVDs ou o de assinar um serviço como o Netflix e assistir a toda uma temporada de uma vez só – o que em inglês tem até nome, “binge-watching”. Isso sim, ele diz, representa um desafio para um roteirista: “O modo como pensamos a narrativa precisa ser outro. É o caso dos ganchos de suspense ao fim dos episódios”.

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Serviços como o Netflix e, mais recentemente, nos EUA, a Amazon, passaram a não só prover conteúdo, mas a produzi-lo. House of Cards, do primeiro, é uma febre que entrou para a história ao vencer um Globo de Ouro. Para Scott, porém, a inovação vai só até a exibição. “A mudança no jeito de ver TV ainda não alterou o modo de escrever, fazer e produzir programas”, crava. “Muitas dessas séries recém-lançadas são benfeitas, mas são produzidas de um jeito muito similar às tradicionais. O que ressalto é que abrem um mercado maior para os roteiristas, e quanto mais canais e espaços de exibição, melhor para nós”, arremata.

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