'Não convivo bem com a ideia de ser escalado'

Determinado, Gabriel Braga Nunes pula da Record para posto de protagonista do horário nobre da Globo

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Por Patricia Villalba
Atualização:

Maria de Fátima (Glória Pires), de Vale Tudo; Laura (Cláudia Abreu) e Renato Mendes (Fábio Assunção), de Celebridade; Olavo (Wagner Moura), de Paraíso Tropical. O papel de vilão em uma novela de Gilberto Braga é tão cobiçado, pois é coisa que promete e é capaz de mudar a carreira de um ator.

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Gabriel Braga Nunes não esconde que o posto fazia parte dos seus sonhos, mas um ano antes, quando ainda era o Tony Castellamare de Poder Paralelo, na Record, mal poderia imaginar que estaria estreando amanhã como o Léo Brandão, de Insensato Coração, a nova novela das 9 da Globo. "É um personagem absolutamente odioso, principalmente porque é muito carismático. E, quando você percebe que uma pessoa é mau-caráter e vê a capacidade de sedução que ela tem, isso nos dá quase que uma revolta, não é?", detalha ele, numa conversa com o Estado no café da Livraria Argumento, no Leblon, na terça.

Fora Natal e ano-novo, foi o primeiro dia de folga do ator desde o começo de dezembro, quando foi confirmado como substituto de Fábio Assunção no elenco. É uma volta sem dúvida triunfal à Globo, depois de cinco anos na Record, onde fez cinco novelas. Ele, no entanto, não gosta de falar em "saída" ou "volta". Verdade seja dita, nunca assinou contrato longo com nenhuma emissora e prefere o que se chama de "contrato por obra". E, nesse esquema, meio cigano, tem conseguido fazer só o que tem vontade. Quem o vir amanhã, cheio de ímpeto em cena, não terá dúvidas de que deu certo.

Você ficou cinco anos na Record, fez uma participação em As Cariocas e, quando se achava que até enfrentaria a "geladeira" da Globo, acabou como protagonista de Insensato Coração. Como tem passado estes últimos tempos?

Olha... Esse movimento todo, para mim, nunca aconteceu. Nunca fui da Globo, nunca fui da Record. Fui freelancer a vida inteira. Estreei no SBT, logo depois fiz uma minissérie na Record e depois uma novela na Globo. Coincidiu que fiquei seis anos na Globo. Daí, recebi um convite para protagonizar Essas Mulheres (2005) na Record. Coincidiu de eu ficar cinco anos na Record. Nunca troquei nada por nada. A questão sempre foi qual trabalho mais me interessava. É com isso que lido. Não tenho dúvidas de que nesse momento estou fazendo o que mais tenho vontade.

Mas por que foi fazer As Cariocas? O convite partiu de algum movimento seu?

Não. Quando terminou Poder Paralelo, decidi ter um ano fora da televisão - estava fazendo cinema e tocando guitarra. No meio disso, rolou o convite da Amora (Mautner, diretora) para As Cariocas. Estava há dois meses sem contrato com a Record. As coisas são mais simples do que as pessoas imaginam. Não há tabu. Nisso, encaixa-se a questão de eu ter entrado no lugar do Fábio (Assunção). A troca de atores é normal, há exemplos em filmes, novelas e peças. Pouquíssimas obras têm o elenco original imaginado pelo autor. Não foi nada de outro mundo.

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Desde o começo da carreira quis trabalhar assim, solto?

Não foi uma decisão, aconteceu assim. Mas sempre fui muito temeroso de perder a independência sobre a decisão do que quero fazer. Isso me assusta muito. Não convivo bem com a ideia de ser escalado, prefiro a ideia de decidir o que fazer. Faço questão de participar, de ser um agente fundamental, digamos assim, nas decisões de cada passo que dou na vida.

Agindo assim, perdeu algo ou só ganhou?

Ah, você perde a clássica estabilidade financeira que ser funcionário de uma empresa proporciona - é assim com qualquer profissional. Ao mesmo tempo, essa estabilidade te impede de dar saltos maiores.

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Há uma mítica em torno do "vilão do Gilberto Braga", posto que é cobiçado. Era seu sonho também?

Há muitos anos tenho vontade de trabalhar com o Dennis (Carvalho, diretor) e o Gilberto. Sempre quis chegar perto do know-how desses dois. De certa forma, esse convite está ligado a uma ambição minha desde lá atrás, quando comecei a fazer televisão. O convite veio como uma luva, num momento em que estou podendo me dedicar exclusivamente a isso. Vou ficar até setembro mergulhado de cabeça nesse personagem. Estou muito feliz. Sabe a sensação de estar trabalhando satisfeito com o seu dia a dia? Isso é importante. Faço 39 anos em fevereiro e essa sensação de trabalhar acreditando, engajado, é muito importante para mim.

Quem te deu o telefonema?

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O Dennis. Falou "pode vir aqui conversar?". Sentei, ele me mostrou 18 capítulos e disse "vai encarar?". Não tive dúvida. Fechei na sexta e na quarta estava gravando. Foram quatro dias entre fechar e gravar. Comecei gravando cena do segundo e do 17.º, ou seja, tive de estudar os 18 capítulos.

Já falou com o Fábio?

Sim, somos amigos. Fábio sempre foi uma referência pra mim. Adoro o trabalho dele. Não que eu procurasse imitá-lo, mas alguma coisa no jeito dele interpretar sempre serviu de referência pra mim. Então, o convite acontecer nessa circunstância é uma coisa que me estimula. Fico orgulhoso de fazer um personagem que era dele antes.

Tem medo de ser comparado a ele?

Não. Acho que não vai acontecer, porque ninguém viu como ele faria o personagem. E essa discussão só vai durar até o dia da estreia. Quando começar a novela, a substituição dos atores deixa de ser assunto.

Ainda sente a ansiedade da estreia?

Sim, estou ansioso porque tem muita coisa gravada e ainda não vi nada. Dá um frio na barriga - nunca fiz isso de ter 18 capítulos prontos antes da estreia. Se bem que, depois de 15 anos, a experiência faz com que você saiba mais ou menos como vai ficar. Mesmo assim, acontece de você se enganar - acha que a cena foi ótima, sai felizão, e quando vê, o superlegal ficou meio esquisito. Daí, pensa "fecha essa boca, Gabriel!"

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Você trabalhou também no SBT e na Record. O que faz da Globo melhor?

Queria muito ter trabalhado na Manchete na época do (Walter) Avancini... A Globo tem um know-how absurdo. A gente vê a reprise de Vale Tudo e percebe que, em 1988, ela já era uma grande empresa de novela. Acho que a Record tem percorrido um caminho incrível. No tempo em que estão produzindo, percebe-se que o crescimento foi fantástico.

Já que citou Vale Tudo, você acha que nestes 15 anos da sua carreira, a telenovela melhorou?

Olha, é óbvio que a qualidade técnica nesses 23 anos deu um salto enorme. Mas aquela era uma época em que os atores ainda não tinham tanta preocupação com a imagem. Você percebe que eles estavam muito mais na cena, mais focados na situação dramática. Nesse sentido, acho que a gente perdeu muito. Porque a relação que todas as pessoas tinham com o texto era muito mais forte do que a gente tem hoje. Dos 90 para cá, os atores já crescem com um dado de preocupação com a imagem externa. Em Vale Tudo você vê que as pessoas fazem a cena sem se defender para a câmera. Estão olhando no olho umas das outras e falando o texto. Por isso, sou daqueles que acredita que dramaturgia e boas interpretações é o que sustenta o sucesso de uma novela.

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