A peleja do noticiário contra o dragão da trama

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Por Mário Vianna
Atualização:

Está difícil conciliar o noticiário com a teledramaturgia nacional. Tornar a ficção o mais próximo possível da realidade é apenas uma das opções que um escritor tem à disposição. A não ser que seja integrante da equipe de colaboradores, dramaturgo nenhum é obrigado a seguir a cartilha realista de Aguinaldo Silva, a espiritualista de Walcyr Carrasco ou a lisérgica de Tiago Santiago. Tem pra todos, esse é o segredo de uma boa programação de novelas. Caso opte pelo caminho realista, o autor enfrenta uma barreira gigantesca: a própria realidade, especialmente num país como o nosso, onde os jornais oferecem uma manchete mais alucinada que a outra, dia após dia. Quando você pensa que o escândalo X atingiu o fundo do poço, aparece o bafafá Y dando mais uma cavucada. Haja criatividade para imitar a vida real. Onde quer que esteja com a cabeça, seria temerário para um novelista bolar uma trama em que o suspeito de assassinar a filha fosse o próprio pai. Se este autor criasse uma madrasta jovem, bonita e descontrolada, então, seria tachado de misógino e preconceituoso. Quem sabe até levaria um processo de alguma associação brasileira das madrastas de bom coração? Há também a batalha contra os critérios de autoclassificação da emissora que leva a novela ao ar. Algumas vezes, eles são bem maleáveis, conforme o humor do dono. Se a primeira-dama do canal não gostar de um personagem, pouco importa a opinião do público - o personagem vai pras cucuias. Mas quando o governo ou a sociedade aperta o parafuso, as emissoras transformam os bastidores de uma novela numa piada rasteira. Há poucas semanas, o mesmo jornal trazia a proibição de um travesti na novela Beleza Pura e o envolvimento de um jogador de futebol com três travestis. Como não dá pra mudar a realidade do boleiro, altera-se a "realidade" da novela. E o que seria um personagem engraçado e passageiro, acaba virando um mártir sem precisão. Compreendo que muita gente se ofenda e não queira ver as "liberdades" das novelas atuais. Mas como essas pessoas reagem na hora do telejornal? Tiram o som da TV? e-mail: mvianinha@hotmail.com

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