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‘Sobre Ratos e Homens’ resgata laços de amizade em tempos difíceis

Clássico ganha nova versão depois de estrear pela primeira vez há 60 anos, com Augusto Boal, no Teatro de Arena

colunista convidado
Por Leandro Nunes
Atualização:

Em 1992, John Malkovich fazia no cinema a morada de um espírito infantil em busca de descanso. No papel do grande e frágil Lennie, o ator transitava entre o corpo forte de um trabalhador rural e a inocência de uma criança. Essa foi a quarta adaptação cinematográfica de Sobre Ratos e Homens, obra de John Steinbeck que o colocava junto do amigo ágil e corajoso, George (Gary Sinise) em uma expedição pelos Estados Unidos à procura de trabalho. A nuvem negra da Grande Depressão de 1929 ainda pairava sobre o mundo quando a obra foi publicada, em 1937. Além do cinema, a história de amizade ainda ganhou a Broadway e passou pelo palco do Teatro Arena, pelas mãos de Augusto Boal. Hoje, cerca de 60 anos depois, o espetáculo faz temporada no Sesc Bom Retiro, com direção de Kiko Marques.

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Tal como são longas e extensas as adaptações da obra de Steinbeck, o desejo de montar a saga da dupla de amigos também tem longa estrada com os também amigos Ando Camargo e Ricardo Monastero. “No dia em que o Ando me contou que amava esse texto, corri até uma lan house para assistir ao filme do Sinise e percebi a razão do encantamento”, conta Monastero. Com o pano de fundo de uma crise econômica, a dupla busca sobreviver como trabalhadores braçais em fazendas. Na aridez da realidade, as diferenças dos dois amigos passa a uni-los – a esperteza de George com a força física de Lennie. “Eles ainda tinham tempo para sonhar”, conta Monastero. “Desejavam ter uma fazendo própria, com segurança e sustento. Algo que, naqueles tempos, qualquer um sonharia.”

De qualquer forma, a peça não pretende retratar o momento histórico. Ando explica que o propósito é reafirmar a força da amizade em tempos difíceis. Ainda que o Brasil não esteja na era do ouro, o ator reflete que a desunião se tornou um hábito e que, por isso, deve ser interrompido, até mesmo entre os artistas do palco. “O teatro nunca caminhou sozinho. Sempre foi feito por uma coletividade. Na maioria das vezes, é mais fácil buscar o seu próprio interesse”. Para Monastero, a relação humana tem o grande protagonismo na peça. “É o simples desejo de contar uma história e de olhar para a grandeza de uma amizade.” Para ele, isso está presente na encenação. “Não queríamos que nenhuma assinatura atrapalhasse a experiência de contar essa história.”

O diretor ressalta que as sutilezas dos personagens formam um retrato muito real da condição humana. “Lennie é uma figura que precisa de ajuda. Ele é vítima de si e do momento que vive, mas, apesar de tudo, ele continua mantendo a doçura e a inocência que George, e a maioria de nós, já perdemos”, conta Marques. Essa sensibilidade desemboca na interpretação de Ando que procurou seu próprio caminho para além dos diversos intérpretes de Lennie. “O personagem de Malkovich transita entre o infantil e a loucura, mas, no livro, não há uma explicação clara para o atraso intelectual de Lennie. Busquei meios de representar uma criança aprisionada no corpo de um homem.” No caso de Monastero, o ator brasileiro que viveu George no Brasil foi nada menos que Gianfrancesco Guarnieri. “São todas coisas boas e fortuitas pra celebrar a força dessa narrativa.”

SOBRE RATOS E HOMENS. Sesc Bom Retiro. Al. Nothmann,185. Tel.: 3332-3600. 5ª, 6ª e sáb., 21h; dom., 18h. R$ 9 / R$ 30. Até 17/4.

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