Maria Fernanda Cândido promove ciclo de leituras dramáticas

Atriz fala do encontro com grandes obras teatrais na Casa do Saber e do longa 'Meu Amigo Hindu' que contracena com Willen Dafoe

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colunista convidado
Por Leandro Nunes
Atualização:
A poesia permite uma aproximação particular com ela. A poesia não exclui, ela agrega, acolhe as pessoas” Foto: Eduardo Nicolau|Estadão

O último ano do curso de Terapia Ocupacional estava chegando ao fim e Maria Fernanda Cândido estava aflita, como todo jovem universitário, com a apresentação de seu trabalho de conclusão de curso na Universidade de São Paulo (USP). Sua decisão foi convidar pessoas para algo que ela ainda não imaginava qual seria o resultado. Chamou funcionários e usuários dos Centros de Apoio Profissionalizante Educacional Social, o Capes, e pacientes de centros de reabilitação para acidentados no trabalho e portadores de deficiências. “Vamos fazer um sarau!”, ela sorri ao relembrar do episódio enquanto se arruma em um dos sofás verdes da Casa do Saber.

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O local é um centro que oferece cursos livres, palestras , debates e oficinas do qual a atriz é sócia desde a fundação em 2004. Tal qual a noite de sarau na época da faculdade, Maria Fernanda viu no encontro de ideias um grande gerador de oportunidades. Foi de uma reunião entre amigos que surgiu a Casa do Saber. “A gente chamava de sarau etílico-filosófico”. Como o próprio nome diz, as reuniões para conversar sobre grandes filósofos e seus conceitos eram regadas a taças de vinho. O resultado disso brotou em uma das paredes da Casa na qual exibe a agenda de cursos: “Introdução à Filosofia”, “O Pensamento dos Pensadores”, “A Razão e seus Limites”. Além de outros temas como gastronomia, ciência e religião.

O apreço da atriz pelo mundo das ideias ultrapassa as paredes até alcançar o texto teatral. Desde o ano passado, o espaço promove um ciclo de leituras de dramaturgias clássicas. Em um deles, Trotski no Exílio, empenhou artistas e personalidades para dar voz a mais de 50 personagens do texto de Peter Weiss. Na ocasião, o ator Antonio Fagundes viveu o intelectual. “Até precisamos transmitir a leitura para outras salas. Foi lotação máxima”, conta a atriz. E a ideia, desde o começo, é de que fossem apenas leituras. “É tão gostoso ler um peça por inteiro, inclusive as rubricas. Ler para si é diferente de ler em volta alta. As coisas e personagens vão ganhando vida.”Em janeiro, a atriz fez sua primeira participação. Além de clássicos, a programação de 2016 já inclui textos de autores contemporâneos, como Amores Líquidos, de Otávio Martins. Daqui a duas semanas, Maria Fernanda vai se preparar para a leitura de Lísitrata, de Aristófanes, pela direção de Elias Andreato. A comédia narra uma greve de sexo realizada por um grupo de mulheres liderado pela ateniense a fim de que gregos e espartanos parassem de guerrear. “Já começa a dar um frio na barriga de novo”, ela brinca. “São diretores com os quais eu sempre desejei trabalhar e agora isso pode acontecer.”

Para Maria Fernanda, todas essas atividades são como espaços de reflexão. Ela conta que não tem o hábito de comentar ou mesmo acompanhar polêmicas surgidas na internet. “Estamos sendo bombardeados o tempo todo. Olha!”, ela aponta para uma placa de uma palestra sobre o recente lançamento do foguete norte-coreano. “Eu tenho as minhas opiniões mas não tenho a necessidade de opinar o tempo todo.” Seu negócio é a ação. No ano passado, a atriz deu voz e rosto para a campanha 10 Medidas Contra a Corrupção. “Nós colhemos assinaturas e já temos mais de um milhão e meio”, aponta.

E no que diz respeito ao Brasil, Maria Fernanda compreende que ser otimista deve ser uma característica intrínseca de um cidadão, tanto no campo das artes quanto no da política. “O Brasil está caminhando bem. Não estamos na lama, como muita gente pensa”, acredita. “Eu não espero muita coisa dos políticos. Acredito que o governo é reflexo de seu povo, portanto, nós é que governamos, que colocamos eles lá. Se não estamos satisfeitos, temos que protestar”, acrescenta a atriz, que demonstra apoio às manifestações populares. “Elas conseguem parar a cidade. Que bom! Deixe o povo protestar.”

Tamanha segurança entra em contraste com a personagem Lívia, que interpreta no longa Meu Amigo Hindu e que estreia em março. A atriz contracena com Willen Dafoe e vive a esposa do diretor de cinema Diego. O homem sofre de uma doença fatal e passa a fazer tratamento. Ao receber alta, a mulher o abandona e ainda leva todos os quadros da casa. “É um filme que trata do tema da morte, mas fala essencialmente sobre a vida.” O elenco não poderia ser mais brasileiro. Dirigido por Hector Babenco, integram ele Barbara Paz, Selton Mello, Reynaldo Gianecchini e Guilherme Weber. “Foi todo gravado em inglês”, ela se orgulha.

Uma pausa e o telefone toca. “Desculpe, meu marido disse que ia me ligar nesse horário”. Maria Fernanda troca algumas frases em francês com o empresário Petrit Spahir. Na televisão, a atriz gravou a minissérie Dois Irmãos, inspirada na obra de Milton Hatoum. “Ele já deu um curso aqui. Foi maravilhoso”, ela retorna, e ainda desmente a notícia de que estará em Velho Chico, próxima novela das 21h da Globo. Por um instante, enquanto gira seu anel de pedra da lua no dedo, Maria Fernanda parece sonhar. Como Fernando Pessoa, o seu poeta predileto, ela também parece ter em si todos os sonhos do mundo.

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PROGRAMAÇÃO

27/2 – Lisístrata  Direção de Elias Andreato    19/3 – A Resistível Ascensão de Arturo Ui Direção de Fernando Neves

30/4 – Macunaíma  Direção de Cristiane Paoli Quito    21/5 – A Porta da Frente Direção de Marcia Abujamra 

CICLO DE LEITURAS. Casa do Saber R. Dr. Mario Ferraz, 414 Itaim. Tel.: 3707-8900. Sábados, 12h. Grátis.

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