Dupla brasileira estreia peça de Strindberg em festival na Dinamarca

Embate de mulheres em ‘A Mais Forte’, de 1880, inspirou versão moderna, ambas com Adriana Lessa e Isabella Lemos no CPH Stage, em Copenhague

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Por Leandro Nunes
Atualização:

É possível ler, de um só fôlego, a peça de câmara A Mais Forte, de August Strindberg. Escrita em 1889, isso seria um grande luxo para a Srta. Y, personagem que não diz uma palavra diante das ameaças verborrágicas da Sra. X. Estreou ontem, 1º, no festival CPH Stage, em Copenhague, a montagem estrelada por Adriana Lessa e Isabella Lemos.   O projeto com direção do dinamarquês Soren Hellerup, radicado em São Paulo, aposta na força de um diálogo tão contundente quanto não convencional. “Elas estão numa armadilha”, adianta. Ao chegar a um bar, Sra. X encontra a antiga colega de palco, às vésperas do Natal, sentada sozinha em uma mesa. A mulher casada passa a relembrar da antiga amizade entre as duas e contar sua rotina de mãe e esposa. “Existe uma superfície de felicidade, um demonstração de poder da parte de uma mulher socialmente colocada e que por isso, pode desdenhar da outra”, explica o diretor. Aos poucos, sem conseguir respostas da atriz solteira, Sra. X passa a provocá-la, atacando com ódio e desentendimentos. Para Adriana, que vive a Srta. Y, a força da interpretação está em manter sua presença. “O silêncio também é uma forma de afronta e meu corpo precisa demonstrar isso. É uma forma de comunicar.”

Lugar de fala. Em cada peça, uma mulher fica em silêncio Foto: JF DIORIO/ESTAD?O

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O projeto também integra uma versão com a resposta da mulher solteira para a casada. Escrita pela dinamarquesa Dorrit Willumsens, A Mais Forte II prepara a vingança de Beth que toma o poder da fala para depreciar Anne. 

Ambientada em 1978, o diálogo atualiza a condição social de mulheres modernas, mas também recupera a continuidade de uma opressão bem mais antiga. “Esses confrontos são ecos do machismo”, diz o diretor. “Ainda que elas celebrem suas conquistas, como a possibilidade de ter relacionamentos abertos e o próprio feminismo, existe um interesse em brutalizar.” Se na primeira peça, o garçom, vivido por Daniel Calazans, recebe as moças com cavalheirismo e as ajuda a retirar o casaco para que se sentem, na segunda a ausência de formalidades revela mulheres mais independentes.

De boca fechada dessa vez, Isabella diz que é preciso construir o embate no corpo. “Ouvir é um exercício que nos localiza, é quase uma meditação. Se você não está meditando, você dorme. E, ao ouvir tantas afrontas, fica impossível não reagir.” 

O festival internacional, que vai até 11 de junho, reúne espetáculos da Noruega, Alemanha, Turquia, entre outros. Desde o anúncio da programação, os ingressos para ambas as peças brasileiras estavam esgotados para todas as sessões, que vão até 4 de junho. O objetivo é estrear no Brasil ainda no segundo semestre desse ano. 

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