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Detentos do Presídio Adriano Marrey preparam peça inspirada em 'O Alquimista', de Paulo Coelho

Entre os presos estão Patrick Levy e João Toscani, filhos de diretores de teatro e tiveram contato com o tráfico de drogas

Por Camila Tuchlinski e Caio Nascimento
Atualização:

Patrick Santos Levy tinha apenas cinco anos quando entrou para o mundo artístico. Começou fazendo comerciais, participou do programa TV Fofão, na Bandeirantes, e atuou em novelas como Éramos Seis (1994), que volta ao ar na Globo neste mês numa nova versão, As Pupilas do Senhor Reitor (1994) e Sangue do Meu Sangue (1995), no SBT. Na adolescência, ele teve contato com as drogas na escola. “Comecei com a maconha e fui para a cocaína. Acabava tendo que traficar para conseguir dinheiro para comprar, porque não tinha coragem de pedir para o meu pai”, relembra.  O pai de Patrick, que morreu em 2008, era Felipe Levy, ator, diretor, produtor e que teve participação nos programas Os Trapalhões e Bronco, com Ronald Golias, e nos filmes de Amácio Mazzaropi

Patrick Levy, de 42 anos, um dos detentos do complexo Adriano Marrey, que participa de oficina de teatro na prisão. Foto: Hélvio Romero/ Estadão

A história de Patrick está entre as de 2.200 detentos da Penitenciária Adriano Marrey em Guarulhos, na Grande São Paulo. Mas não é caso isolado.  João Carlos Toscani, de 43 anos, também é de família de artistas. “Meu pai trabalhava em teatro, mas sempre acompanhei da plateia. Eu achava legal, via muito as peças do meu pai, os trabalhos na televisão. Mas aquilo não era para mim. Gostava mais de praticar esportes e acabei não fazendo nada. Vim me interessar dentro da cadeia”, afirma.

João Toscani também é filho de diretor de teatro. Ele é um dos detentos da Penitenciária Adriano Marrey. Foto: Hélvio Romero/Estadão

“Não é porque estou preso que esse sonho saiu de dentro de mim. É algo que pretendo continuar a partir de então Aqui, os diretores nos dão liberdade total para poder criar. Eu dirijo a peça (O Alquimista) junto com meu companheiro Cristian”, acrescenta.Patrick Levy dirige a peça O Alquimista, de Paulo Coelho, junto com o companheiro de presídio Cristian Martins. “Quando eu venho para cá (o teatro), eu esqueço que estou preso e viajo no personagem. Me desligo totalmente do lugar que estou”, diz Patrick fechando os olhos. João Carlos Toscani também se sente assim. “Eu praticamente ‘saio’ da cadeia. Parece que a mente desliga. Por mim, ficaria aqui das 8h às 16h, sem problema. Você esquece que está na cadeia”, relata. Sobre o futuro fora da cadeia, ambos pretendem seguir a carreira teatral. “Tinha tudo para seguir esse caminho lá fora, mas vim parar dentro da cadeia e acabei descobrindo como é que funcionava. Aqui são 24 homens que não têm nada a ver com o teatro. Eu pretendo seguir carreira artística, principalmente na área de teatro. Você exercita muito a mente”, garante João Toscani. “Fiz cursos profissionalizantes antes, mas não faculdade de Rádio, TV, etc. Aqui já consegui terminar o Ensino Fundamental. Quero fazer a prova do Encceja (Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos) para que eu possa voltar a fazer o que eu amo, porém agora com mais afinco. E poder ter a oportunidade de mostrar que sou uma pessoa diferente”, conclui Patrick Levy.  Igor Rocha escolheu a obra de Paulo Coelho para a encenação dos presos. O agente penitenciário, que está no projeto ‘Arte, transformando vidas’ desde o início (2010), acredita no poder dos palcos para a mudança comportamental e de percepção de mundo dos detentos. “Meu maior sonho é que isso vire política pública. Nós temos um sistema carcerário brasileiro engessado. Ninguém pergunta ao funiconário o que é necessário, simplesmente vão fazendo. Isso é uma problemática. A própria sociedade cobra. Cobra um sentimento de vingança, 'toca fogo naquilo', 'mata todo mundo'. Qual a moral e a ética que eles pedem?" desabafa. 

O agente penitenciário Igor Rocha, que é um dos fundadores do projeto 'Arte, transformando vidas' (desde 2010). Foto: Hélvio Romero/Estadão

Além de comandar o teatro no cárcere, Igor Rocha foi convidado pela TV Globo como consultor da série Carcereiros, da Globoplay. A reportagem do Estado conseguiu autorização judicial para entrar na Penitenciária Adriano Marrey e conversar com os detentos que participam do projeto.

Assista ao vídeo:

Três integrantes do elenco de Sintonia, da Netflix, participaram do projeto teatral no Presídio Adriano Marrey. Conheça a história de Leonardo Campos, o personagem Lindão da série; clique aqui.

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