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Comportamento tóxico dos homens é a nova saga de humor de Otávio Muller

Em 'Questão de Falha', ator e humorista reúne experiências pessoais e abre bastidores da criação com participação ativa do público: 'Pode criticar, dizer que está uma droga'

Por Leandro Nunes
Atualização:

Apesar de a pandemia ter furtado o palco dos artistas e da plateia, o teatro continua repensando a sociedade. Em um movimento inédito, as artes da cena parecem ter descoberto na tecnologia a chance de se conectar com o espectador em qualquer lugar do mundo. É nesse ritmo que o ator e comediante Otávio Muller abre Questão de Falha, nesta sexta, 5, um projeto que marca seu retorno aos palcos, ainda que virtual. 

O tema escolhido não é novidade, nem está longe de ser superado. O comportamento tóxico de muitos homens – em geral brancos, heterossexuais, e quase sempre poderosos – não deu trégua quando todo mundo podia se aglomerar nem agora, durante a pandemia. Não é difícil testemunhar pelas ruas, grupos de homens sem máscara – o que não é comum entre as mulheres.  Para o artista, isso explica muito a situação atual do Brasil. “É muita prepotência achar que somos invencíveis. O homem foi criado para achar que o mundo é dele. Nosso país é dominado por homens, politicamente falando. Até a gente chegar a esse mundo tão chinfrim de hoje em dia.”

Em 'Questão de Falha', ator reúne experiências pessoais e abre bastidores da criação com participação ativa do público Foto: André Prado

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Há 5 anos, o ator experimentou uma sensação semelhante. Quando estreou A Vida Sexual da Mulher Feia, baseado no livro de Claudia Tajes, se divertiu ao interpretar uma mulher honesta com suas experiências amorosas, mas também percebeu que precisava enxergar seu “lugar de fala” no campo da arte. No solo, Muller interpreta Maricleide, que tem grande autocrítica e uma certa indisposição para a velha ditadura da beleza. “Como humorista, acredito que a interpretação é o grande barato de um ator, mas, às vezes, é preciso pedir desculpas, e se restringir.”

Agora no novo projeto, Muller chama a atenção para experiências vividas por muitos homens, o que pode explicar parte do comportamento machista, mas sem perder a chance de se divertir. “Há relatos de como já foi comum o pai levar os meninos para iniciar a vida sexual com prostitutas, aquelas molecagens de colégio, que parecem ter graça, mas que no fundo são imbecilidade, e também a dificuldade de o homem ter certas conversas com o pai.”

A cada cena, Muller vai solicitar a participação da plateia, que pode interagir ativamente durante a sessão na plataforma. Comentários e sugestões são bem-vindos, assim como as críticas. “Não estou pronto e não quero estar pronto. Vai ser uma desconstrução absoluta.”

Enquanto a produção teatral aguarda momentos mais oportunos para uma estreia presencial, Muller se define como um admirador de um modo mais tradicional de teatro. “Costumo funcionar melhor na sala de ensaio, e isso na pandemia é muito complicado. A gente até tenta algumas coisas durante os encontros virtuais, mas é um desafio para qualquer ator”, comenta. É com bastante nostalgia que ele recorda de Orlando, espetáculo de 1989, inspirado no romance histórico de Virginia Woolf, dirigido por Bia Lessa, tendo no elenco Fernanda Torres, Júlia Lemmertz, Marcos Oliveira, Dany Roland, Cláudia Abreu e Muller. “Quando começamos a ensaiar, ainda não havia previsão de estreia. Seis meses se passaram e, quando soubemos da data, nos preparamos ainda por mais dois. Agora isso é impensável.”

Sua recente direção para o palco, o musical Novos Baianos, com texto de Lúcio Mauro Filho, também despertou saudades no artista. “Teatro é para rasgar o coração e fui cercado por um elenco criativo e cheio de energia.”  A montagem resgata a cena musical brasileira dos anos 1960 e 1970 e relembra o grupo formado por Baby Consuelo, Galvão, Moraes Moreira, Paulinho Boca de Cantor e Pepeu Gomes. Com elenco formado por músicos, atores e compositores, a montagem fez temporada em São Paulo no fim de 2019, uma das últimas experiências pré-pandemia. “Foi bom reviver o espírito livre dos Novos Baianos. Já estávamos pensando em novos trabalhos quando a quarentena botou todo mundo em casa.”

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'Quero trazer 'Benzinho' para a nova novela

Drama. Com Karine Teles no filme de Gustavo Pizzi Foto: BIANCA AUN

Se um dos ofícios do artista é contar histórias, para Otávio Muller a missão pode ser realizada com risos e lágrimas, tudo junto. Foi assim no Zorra, programa que deixou em 2019, e em sua despedida na Escolinha do Professor Raimundo. “Durante o período mais crítico da pandemia, eu pedi para voltar para a Escolinha, porque os outros projetos foram afetados”, diz. O encerramento da sexta temporada se deu no começo de janeiro deste ano, com direito a improviso com o personagem Baltazar da Rocha. No último episódio, o ator retirou a peruca e agradeceu os parceiros. “Em um ano tão difícil foi como uma vitamina para mim”, confessa. 

Agora Muller tem que conviver com a ansiedade de seu novo personagem na novela Um Lugar ao Sol, que deverá suceder Amor de Mãe, ambas afetadas pela pandemia. “Ainda não comecei as gravações, mas vou interpretar um homem gordo que paquera uma mulher gorda, a atriz Ana Baird. A novela nunca lhe dá o personagem pronto porque ele sempre muda, além de ser influenciado pelo público.”

Para explicar o novo papel, Muller recorre ao filme de Gustavo Pizzi, em que contracenou com Karine Teles, sobre as dores e as alegrias de uma família cheia de sonhos. “Quero trazer o clima de Benzinho para a nova novela.”  Além do ator, estão no elenco de Um Lugar ao Sol, Marieta Severo, Alinne Moraes, Andréa Beltrão, Mariana Lima, Gabriel Leone e Maria Flor.

SERVIÇO. QUESTÃO DE FALHA. TEATRO FAAP. SEX, SÁB, ÀS 21H, DOM., ÀS 19H. ESTREIA HOJE, 5. ATÉ 21/2. R$ 30. INGRESSO NA PLATAFORMA SYMPLA. 

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