Quando se fala em festival de teatro no Brasil, Ruth Escobar surge como primeira e principal referência. A atriz e produtora foi responsável por uma considerável revolução nos palcos de São Paulo.
Em 1974, quando realizou o primeiro Festival Internacional de Teatro, Ruth apresentou ao público criações de vanguarda inimagináveis para quem vivia sob a ditadura: títulos de Grotowski, e Bob Wilson, dois dos maiores diretores do século 20.
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A iniciativa deixou rastros: quatro anos mais tarde, quando Antunes Filho estreou o seu surpreendente Macunaíma, lá estavam as marcas desses criadores – especialmente a plasticidade de Wilson. Nossos espetáculos nunca mais seriam os mesmos.
Até hoje, o legado dessa pioneira reverbera. A MIT-SP, Mostra Internacional de Teatro de São Paulo, que já teve quatro edições, assume a grande produtora como inspiração. Os moldes são outros, mas o objetivo semelhante: aproximar a cidade das mais potentes obras do panorama contemporâneo.
O festival teve outra edição, em 1976. E retornou em novo formato nos anos 1990. Mas a atuação de Ruth foi além: ainda nos anos 1960, criou o próprio teatro e alcançou grande repercussão com montagens dirigidas pelo franco-argentino Victor Garcia. Por O Balcão (1969), levou todos os prêmios daquele ano.
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Sua carreira, contudo, não se fez só de sucessos. Muitas vezes, nublou-se a zona de separação entre a carreira artística e a militância política. Em 1966, experimentou o fracasso com uma versão de Julio César, de Shakespeare, com tradução de Carlos Lacerda, ex-governador do Rio. Envolveu-se nas lutas pela redemocratização. Para driblar a censura, concebeu um ciclo secreto de leituras dos textos proibidos. Chegou, inclusive, a se eleger deputada estadual por dois mandatos. Mas retornou ao teatro e só se retirou quando o Alzheimer, diagnosticado em 2000, começou a causar-lhe problemas, inclusive judiciais.
Para conseguir o que queria, Ruth Escobar não poupava esforços nem sempre primava pela diplomacia. Invadia gabinetes de políticos e empresários, dizia o que queria e quando queria. Era arrasadora: tão festejada quanto polêmica. Com sua personalidade forte, conquistou admiradores, desafetos e, indubitavelmente, um lugar de destaque na história da arte brasileira.