Muitos rappers nem sabem, mas a origem dos dois elementos cruciais do rap foram introduzidos na música pela primeira vez na Jamaica, na virada dos anos 50 para os 60. Para incrementar as discotecagens, os DJs jamaicanos inventaram o "toast", modalidade de improviso vocal sobre as bases instrumentais que saíam das caixas dos "sound systems" - unidades móveis que animavam festas nas áreas urbanas e pobres da ilha com os ritmos ska e rockeasteady. Trinta anos depois, nos Estados Unidos, o "toaster" inspirou o MC do hip hop e os DJs norte-americanos integraram o recurso de riscagem no vinil, o "scratch", ao adereço instrumental. Nasceu, assim, a matéria-prima do rap. Parte da história da influência jamaicana no rap será contada na semana que corre, em São Paulo, com apresentações de dois ícones fundamentais da black music. O DJ Afrika Bambaataa, de 42 anos, considerado fundador da cultura hip hop, faz discotecagem hoje no Clube Piratininga em comemoração luxuosa dos dois anos da festa Jive. De sexta a domingo, o palco do Sesc Pompéia recebe Lee Perry, de 66 anos, responsável pela produção dos primeiros compactos de Bob Marley & the Wailers e co-inventor do mais popular ritmo jamaicano, o reggae. Ainda que, aparentemente, cada uma das apresentações aponte para uma direção diferente, Bambaataa e Perry trazem contribuições musicais em comum. Ambos são criadores essenciais para os gêneros que difundiram. Além de trazer no currículo a faixa People Funny, Boy, de 1968 - considerada a primeira gravação de reggae -, o jamaicano pode orgulhar-se também de ser um dos principais difusores, ao lado de King Tubby e Augustus Pablo, do gênero chamado "dub". Espécie de remix dos hits de reggae (com baixo e bateria em destaque), o dub pode ser considerado a primeira manifestação eletrônica da música pop e é inspiração direta para o gênero conhecido atualmente como drum´n bass. Bambaataa subiu mais um degrau na escada evolutiva da música eletrônica, no começo dos anos 80, com a invenção do eletro funk - o primeiro rascunho da dance music. Além disso, ele é responsável pela união dos quatro elementos (MC, DJ, grafiteiro e breaker) na cultura hip hop. Ou seja: um fazendo reggae e outro fazendo rap, ambos contribuíram para o avanço tecnológico da música eletrônica que, a partir dos anos 90, vem arrastando multidões de jovens para as raves em todo mundo. Outra particularidade que os une é o fato de ambos sido DJs de festas antes de iniciarem carreira no mercado fonográfico. Lee Perry, discotecando em Kingston, capital jamaicana, a partir da década de 50 e Afrika Bambaataa no Bronx, bairro de Nova York. As intersecções do reggae com o rap transparecem, atualmente, em trabalhos de rap nacional - principalmente no álbum Atualmente Quilombos, Hoje Periferia, do grupo Z´África Brasil, no uso de vocais "ragga", uma evolução do toast. No cenário internacional, o britânico Roots Manuva e o grupo francês Saïan Supa Crew também se aventuram na fusão dos dois gêneros. Festival Dub Mamute com Lee Perry, entre outros. Sexta, sábado e domingo no Teatro do Sesc Pompéia (R. Clélia, 93, tel. 3871-7700). R$ 20. Festa de 2 anos da Jive, com discotecagem de Afrika Bambaataa. Hoje no Clube Piratininga (al. Barros, 375. Tel. 3159-4346). R$ 20.