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Símbolo cultural, Osesp ainda busca identidade

Por João Marcos Coelho
Atualização:

Seis décadas de existência já são motivo mais do que suficiente para comemorar muito. Principalmente por seu caráter de excepcionalidade num país em que as iniciativas públicas raramente ultrapassam os anos de um mandato. Acostumamo-nos de tal maneira com este absurdo, que os 60 anos da Osesp precisam, sim, ser comemorados com pompa. Mas de 1954 a 1973, ela praticamente não existiu. Foram apenas espasmos erráticos, até o maestro Eleazar de Carvalho assumir a orquestra, àquela altura desativada, entre 1973-96. Então, estamos falando de 41 anos de existência efetiva. Destes, ainda é preciso descontar ao menos uma década perdida, a final da era Eleazar, tamanha a penúria vivida pela orquestra. Apesar das integrais sinfônicas de Mahler, Beethoven e Brahms feitas aos trancos e barrancos, a orquestra não brilhou. Apenas sobreviveu. Em 1997, após a morte de Eleazar, John Neschling só assumiu o cargo com a garantia de realizar seu projeto ambiciosíssimo. Com mão de ferro e 28 horas diárias de dedicação, mudou o patamar da instituição: a Osesp ganhou a Sala São Paulo, gravou extensivamente e fez turnês internacionais. Criticava-se sua atitude autoritária - mas ele era do ramo. Discordava-se pontualmente. Com sua saída, em janeiro de 2009, a conciliação falou mais alto. Um colegiado contratou o maestro francês Yan Pascal Tortelier, que jamais se entendeu com os músicos e aqui passou um terço da temporada anual. Trocou-se o autoritarismo pelo vazio de poder artístico. Isso, para uma orquestra jovem em relação aos padrões europeus e norte-americanos, é perigosíssimo. Até 2012, quando Marin Alsop substituiu Tortelier, o molho quase desandou. Apesar das atrações internacionais, a orquestra não possuía DNA próprio. Alsop, titular em Baltimore e com agenda superlotada na Europa, também permanece um terço do tempo aqui. Resultado: muitos regentes convidados, repertórios às vezes pesados demais se sucedendo semanalmente e pouco tempo de ensaio. Alsop reforçou o projeto de internacionalização da Osesp no circuito europeu, no qual trafega bem a partir da base londrina. Isso é bom. Mas a orquestra atrelou-se ao convencional feijão com arroz internacional. São escassas as razões para a gravação de uma integral em curso das sinfonias de Prokofiev para a Naxos. Razões que se multiplicariam para uma integral de referência de um Claudio Santoro. O natural para uma orquestra brasileira de referência é gravar... compositores brasileiros. Santoro compôs 14 sinfonias. Com Neschling, a Osesp chegou a gravar duas num CD BIS de 2006. Depois parou. É lícito e nos orgulha exportar a Osesp como símbolo cultural do País. Mas são de fato necessárias as coencomendas com orquestras europeias e norte-americanas para compositores norte-americanos, do leste europeu e russos? Por que não o caminho inverso? Que tal atrair sinfônicas como as de Baltimore, Sydney e da Universidade Northwestern para coencomendas de obras a compositores brasileiros jovens? Por que não? São ajustes finos, diriam os mais generosos. Mas podem ser sinais de desvios mais profundos que a médio prazo podem provocar fissuras irremediáveis. 

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