Sex Pistols: sai disco com trilha do filme

A trilha de The Filth and The Fury chega às lojas para lembrar que os Sex Pistols passaram à posteridade como os melhores exemplares comportamentais de uma geração. Eles eram o punk rock

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Por Agencia Estado
Atualização:

Nós declaramos guerra à Inglaterra sem saber por quê, diz John Lydon, um pequeno cavalheiro inglês inteligente, com dentes fracos, cabelo amarelo e olhar de rato de desenho animado. Ele se refere ao tempo em que era conhecido como Johnny Rotten (Joãozinho Podre) e encabeçava uma banda-revolução que tomou de assalto a segunda metade dos anos 70: os Sex Pistols. A crença reafirmada de Lydon em descrever sua intuição como estúpida e seu papel na revolução punk como inócuo nunca convence completamente. E foi por não estar completamente convencido que o diretor Julian Temple (que ficou famoso em 1978 por The Great Rock and Roll Swindle, outro filme sobre Johnny Rotten e sua turma) voltou ao tema no ano passado, produzindo um novo filme sobre o grupo. A trilha desse filme, The Filth and The Fury, chega agora às lojas por meio da gravadora Virgin Records. Sua história é contada tendo a trilha de uma época como fundo - The Who (Pictures of Lily), Roxy Music (Virginia Plain), Alice Cooper (School´s Out), David Bowie (The Jean Genie), New York Dolls (Looking for a Kiss), entre outros. O grupo Sex Pistols foi formado em 1975 por Paul Cook e Steve Jones. Depois, teve como integrantes Rotten, Jones, Cook e Glen Matlock - mais tarde substituído por Sid Vicious, que morreu de overdose de heroína em 1979. Na trilha lançada agora pela Virgin, não há nada de tão trágico. É até ingênua e bem-comportada, se for ouvida com atenção. Os Pistols não passaram à história como criadores de um gênero (os Stooges carregam esse título) nem como os expoentes de um tipo de música. Naquela época, os palcos já tinham gente como Buzzcocks, X-Ray Spex, Joy Division, Siouxsie and the Banshees. Mas eles passaram à posteridade como os melhores exemplares comportamentais de uma geração. Eles eram o punk rock. Encarnavam seus ideais niilistas como poucos o faziam. Afrontavam, portavam-se com a selvageria calculada, eram trôpegos e improvisados como a cartilha exigia. Performance crua - Seu disco Never Mind the Bollocks Here´s the Sex Pistols entra no ranking dos mais importantes da história justamente por registrar essa performance crua, emocional, que documentava em si mesma um impasse da cultura pop. Qual é a distância que separa o astro do rock do seu público? Para os Pistols, não poderia haver distância, e aí estava o seu segredo. A trilha do filme tem bons momentos, principalmente nos standards God Save the Queen, a faixa que abre o disco - são apenas duas dos Pistols (a outra é Holidays in the Sun) e um pot-pourri (Submission, Did You No Wrong, Anarchy ind the UK, Pretty Vacant, Liar, No Feelings, I Wanna Be Me e Problems). Mas são medíocres tocando, tanto que o cetro do punk inglês ficou mesmo é com o The Clash. O que a trilha de Filth and Fury faz é mapear o que era o mundo conhecido pelos Pistols naquela época em que cresciam e o que fez suas cabeças. Há desde um reggae pré-histórico de Simaryp (Skinhead Moonstomp), de 1970, até um inacreditável Alice Cooper cantandoI´m Eighteen, em 1977. Lydon adquiriu uma impressionante autocrítica sobre aqueles anos dos Pistols recentemente. Ele não se conforma com o fato de que suas bandeiras de "no future" tenham sido, no fim das contas, apenas uma grande estratégia orquestrada por Malcolm McLaren, o homem que reuniu a banda. "Há ainda um sentimento bom, mas eu estou doente de ver essa história", disse Steve Jones, que compareceu com John Lydon à avant premiére do filme sobre os Pistols, no festival Sundance, nos Estados Unidos. "Há ainda uma pequena parcela de emoção envolvida - principamente quando abrimos God Save the Queen e Anarchy, isso ainda me toca", disse o músico. Lydon manteve sua atitude crítica. "Há um monte de tristeza nisso", disse. "Qualquer coisa sobre pessoas morrendo está ainda ecoando e nós não estamos celebrando nossos grandes e maus egos aqui", ele afirmou, acrescentando que, por 20 anos, teve de tolerar pessoas dizendo-lhe o que era e o que não era. "Isso foi crescendo, explodiu no filme e aqui está", disse. "Nós estivemos trabalhando nisso por três sólidos anos - não acho que estivemos valsando e no fim saímos pedindo nossa recompensa." Nem Malcolm McLaren, dono do arcabouço teórico dos Pistols, poderia imaginar que aqueles meninos desdentados que recrutou pudessem tornar-se tão críticos em relação à própria trajetória. Humor rude - No início dos anos 70, McLaren era dono de uma butique em Londres, especializada num tipo de roupa "antifashion". Ele empresariou o New York Dolls em 1975, quando o grupo fez sua última turnê. Naquela época, Matlock, Cook e Jones já procuravam por um cantor para seu grupo. McLaren pescou nas ruas um garoto de 19 anos, que vira jogando numa jukebox e que era conhecido por seu humor rude. Era John Lydon, que nunca tinha cantado antes. Dez minutos após sua primeira turnê numa escola de subúrbio, em 6 de novembro de 1975, o diretor da escola veio e desligou os amplificadores. Era o começo de uma lenda, que o filme de Temple quer ajudar a revelar, ou desvelar. Em março de 1977, Glen Matlock deixou o grupo para formar a banda Rich Kids e foi substituído por John Ritchie, amigo de Rotten, que não tocava instrumento algum e chamava a si mesmo de Sid Vicious. Aí começa a porção trágica da história toda, mas para essa parte é melhor ver o filme de Alex Cox. Não é mais um lance musical. The Filth and the Fury. CD duplo com as canções do filme de Julian Temple. Virgin Records. Preço médio: R$ 24. À venda nas lojas.

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