Salvador vê "O Franco Atirador" de Weber

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Por Agencia Estado
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Considerada uma das óperas mais populares da Alemanha de todos os tempos, O Franco Atirador, de Carl Maria von Weber, será mostrada ao público baiano no Teatro Castro Alves nos dias 3, 4 e 5 de agosto. A montagem reunirá solistas internacionais como a soprano holandesa Kelly God, o tenor Michael Rabsilber e o baixo Gregor Dalal, regidos pelo maestro Ulrich Vogel (todos alemães). Eles não cobraram nada para se apresentar na Bahia, vieram pelo mero prazer de mostrar sua arte e graças à amizade com o dublê de padre e maestro Hans Bönisch, um verdadeiro Dom Quixote alemão nos trópicos, lutando há nove anos para "apresentar" a música clássica a pessoas acostumadas a ouvir axé music e pagode. Bönisch é um dos fundadores e principal dirigente da Associação Barroco na Bahia, criada, curiosamente na Alemanha com objetivo de universalizar a música clássica. "O povo tem o direito de ouvir uma música mais refinada", diz o padre que mudou-se para Salvador, no início dos anos 90, a convite do então cardeal-arcebispo da capital baiana Dom Lucas Moreira Neves, um amante da música erudita. Maestro e organista conhecido na Alemanha, já gravou seis discos, padre Hans conseguiu com a ajuda de empresas alemães montar e instalar um monumental órgão tubular (com mil tubos e avaliado em R$ 300 mil) na Catedral Basílica de Salvador. Formou também um coro de câmera, integrado por 50 freqüentadores de sua paróquia na periferia de Salvador e uma orquestra de câmera com músicos da Universidade Federal da Bahia. O Franco Atirador é a quinta ópera de autor alemão montada graças aos esforços de padre Hans. As outras foram Fidélio, A Flauta Mágica e O Rapto do Serralho, todas de Mozart e Hänsel und Gretel, de Humpudinck. Além de convidar os músicos, ele percorre empresas alemães à busca de patrocínio para concretizar as apresentações. "Prefiro não revelar quanto custa montar uma ópera dessas, só posso dizer que as dificuldades são muitas pois é difícil convencer as empresas a investir em cultura, embora tudo acabe dando certo, o que é um milagre", afirma. Pela arte, o cenógrafo alemão Henning Manthe, que já havia feito os cenários de duas montagens anteriores do Barroco da Bahia, A Flauta Mágica e Hänsel und Gretel, também se integrou ao projeto de O Franco Atirador, tendo trabalhado na confecção das peças que procuram recriar o ambiente da floresta da região da Boêmia, onde se passa a história, na Alemanha e Bahia. Quando não está envolvido na montagem das óperas, padre Hans com sua trupe, percorre igrejas, associações de bairros e cidades do interior levando música clássica para platéias que nunca tiveram contato com o estilo. "As pessoas adoram, percebem a diferença para esses ritmos que tocam nas ruas de Salvador", garante. Desde 1991 quando Bönisch aportou em Salvador, o Barroco da Bahia já realizou 324 concertos. Os mais inebriantes sem dúvida são os realizados aos domingos de manhã na Catedral Basílica, quando o padre-maestro toca o órgão tubular cujo som se expande na acústica do templo, que foi o antigo colégio dos Jesuítas de Salvador, onde estudou padre Antonio Vieira, principal orador sacro da língua portuguesa. O ambiente não poderia ser mais propício: o atual edifício da Catedral, foi construído com blocos de pedra lioz importados de Portugal no século 17. A capela-mor, cujo revestimento em talha esculpida na madeira é coberta com fina camada de ouro, encantou o pesquisador francês Germain Bazin, principal divulgador do barroco brasileiro na Europa. Outro entusiasta da obra, o arquiteto Lúcio Costa, um dos construtores de Brasília, identificou nos retábulos dourados da Catedral, quatro períodos da história da arte sacra brasileira. Durante os concertos, as pessoas se acomodam nos bancos da igreja, voltadas para a capela-mor, admirando os santos, os símbolos do barroco brasileiro como as pencas de frutas tropicais (mamão, cacau e abacaxi), esculpidos na talha. Mas a música vem de cima, do coro, situado no lado oposto da capela-mor, a cerca de cinco metros do piso do templo, onde os artistas se apresentam. No último domingo, padre Hans convidou para o concerto a soprano Kelly God, o baixo Gregor Dalal e o maestro Ulrich Vogel. Foram 12 peças, a maioria de autores alemães, que encantaram a platéia. "Veja só, num domingo de sol como esse, eles preferiram ouvir música clássica ao invés de ir à praia", orgulha-se padre Hans. O público é bem eclético: pode ser alguém da "fina flor" da sociedade baiana, freiras dos inúmeros conventos da cidade ou as "mulheres da vida", dos inferninhos instalados em ruas periféricas do Centro Histórico. Eles se encontram na democracia musical de padre Hans. Quem trocou a praia pelo programa musical domingo passado, se emocionou com a Ave Maria de Schubert, cantada por Kelly, com Oração de Hugo Wolf, interpretada por Gregor, e Pomp e Circunstances, de Edward Elgar, tocada no orgão tubular pelo padre Hans. História A primeira apresentação de O Franco Atirador (Der Freischütz) ocorreu em Berlim, em 18 de junho de 1821, data considerada um marco na história da ópera pois marcou o inicio do período "romântico" da música. Carl Maria von Weber foi aplaudido de pé após a apresentação e se tornou um dos compositores mais populares da Alemanha. Richard Wagner, seu sucessor como mestre da capela de Dresden, disse certa feita que "nunca houve um músico mais alemão que Weber". Ele captou as expectativas, ansiedades e desejos da pequena burguesia alemã com a história de O Franco Atirador. Na região da Boêmia, após a Guerra dos 30 anos, Kuno, o guardião das florestas do duque, procura um marido para a filha Agathe para sucedê-lo como o chefe dos caçadores. Segundo a tradição, o candidato deve provar suas habilidades, vencendo uma competição de tiro ao alvo. Max é o nome ideal para o posto, mas terá que suplantar a inveja do ardiloso Casper, caçador veterano que almeja o posto de guardião da floresta e faz um pacto com o demônio para atrapalhar os planos do rival. Os elementos de folhetim, amor, ódio, ambição, caráter, com as pitadas de sobrenatural e a eterna disputa entre o bem e o mau, contribuíram para transformar O Franco Atirador na ópera mais popular da Alemanha ao lado de A Flauta Mágica, de Mozart. O Franco Atirador - Teatro Castro Alves, dias 3 e 4 às 20h e dia 5 às 18h. Ingressos de R$ 30, a R$ 50. Elenco - baixos: Gregor Dalal e Tom Mehnert, soprano: Kelly God e Sussane Müller, tenor: Michael Rabsilber, barítono: Stefan Mosemann. Com o Coro de Câmera Barroco da Bahia e Orquestra Sinfônica da Bahia.

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