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Sai em CD a trilha sonora de "Lavoura Arcaica"

Por Agencia Estado
Atualização:

A trilha musical de Lavoura Arcaica é a terceira composta para cinema - ele escreveu muito para balé e teatro - por Marco Antônio Guimarães, fundador, principal compositor e arranjador e ainda construtor dos curiosos instrumentos (exóticos não seria bem a palavra; ele inventa instrumentos porque há sons que imagina que não são produzidos por nenhum dos existentes) usados pelo grupo Uakti. Antes, Marco Antônio musicou Kenoma, de Eliana Caffé, e Outras Histórias, de Pedro Bial, trilha premiada. Estas duas foram feitas para os filmes prontos, música basicamente escrita para cenas já terminadas - música funcionando como auxiliar da narrativa, de certa forma submetida (até onde o peculiaríssimo, personalíssimo trabalho do músico se deixa submeter) às imagens, ao tom dos diálogos, à determinada carga de emoção já estabelecida pelo diretor, pelos atores. Em Lavoura Arcaica, o procedimento foi outro, como diz o próprio diretor Luiz Fernando Carvalho. Confessa que não sabe tocar nenhum instrumento e que faz dessa falta um impulso para compreender imagens. E que a música de Marco Antônio orientou-o na montagem do filme. A música, em suas palavras: "Esse demônio sonoro que respira com o filme, que não tem nome, que está para além de nós." "Foi o Luiz Fernando quem quis assim", conta Marco Antônio Guimarães. "Quem nos aproximou foi Fernando Veloso, coregógrafo do Grupo Corpo, para o qual já escrevi várias peças." O diretor de Lavoura Arcaica havia ouvido discos do Uakti e achou que aquela sonoridade era a ideal para o filme que imaginava. "Eu não havia lido o livro de Raduan Nassar", confessa Marco Antônio. "Tinha curiosidade pela obra, e pelo escritor - soube que ele havia parado de escrever, o que me intrigava", prossegue. Luiz Fernando entregou-lhe um exemplar do livro. "Leia; depois conversamos", disse ao músico. Algum tempo depois, tiveram a primeira reunião formal. "Foi naquela mesa da casa da fazenda, na própria locação do filme", diz Marco Antônio. "Sentamo-nos todos: a equipe técnica, o diretor e eu" - os atores não compareceram a essa reunião. "Luiz Fernando foi lendo o livro e comentando as cenas. Levou livros de arte, para que tivéssemos idéia da atmosfera de época; livros com figurinos, mobilário - e uma pilha de discos com o tipo de música que imaginava para o filme." Depois disso, Marco Antônio voltou para a casa, ou melhor, para o escritório, em Belo Horizonte, que chama de oficina (é onde cria e fabrica os instrumentos, onde ensaia com o Uakti, aliás, Oficina Instrumental Uakti). E começou a trabalhar - ia mandando o resultado para o diretor do filme. "Ele montou muita coisa sobre a música", reitera o compositor. "E, embora ele não conheça música, formalmente, ele sabe muito mais de música do que eu", admira-se. "Pelos trabalhos que conheço e vim a conhecer dele, vejo que ele trabalha muito bem a combinação de imagem e melodias", diz. "Quando percebi esse dom, passei a mandar-lhe sugestões: ´Isso pode ser legal para a cena de Ana na capela´" - e assim Lavoura Arcaica foi ganhando corpo. "Mas tudo nasceu dos comentários iniciais dele; portanto, muito da trilha é dele, de Luiz Fernando Carvalho." Marco Antônio Guimarães passou dois anos compondo. Se juntasse tudo o que escreveu, daria para fazer três CDs. Seja como for, a primeira versão de Lavoura Arcaica tinha quatro horas de duração; a versão final tem 180 minutos. E a trilha sonora foi editada num CD simples, com lançamento pela gravadora Trama. Marco Antônio usou, para a abertura, uma canção folclórica libanesa, que é interpretada pelo Grupo de Música Árabe Almaza. Para as outras interpretações, convocou companheiros do Uakti, montou um quarteto de violoncelos (queria dar um tom solene ao sabor quase sempre mourisco da trilha), mais oboé, saxofones, vozes. A música, no filme, é sempre intensa: "Está sempre presente, mas não incomoda o espectador", diz Marco Antônio. "E isso se deve ao ano inteiro que Luiz Fernando gastou na ilha de edição", conta. Mas, por mais que Marco Antônio Guimarães dê créditos a Luiz Fernando Carvalho, o fato é que ele criou uma obra-prima - uma nova obra-prima, que se junta à obra extraordinária desse músico de formação erudita, ex-violoncelista de sinfônicas, aluno de Walter Smetak, colaborador habitual de Milton Nascimento e vencedor, pela trilha de Lavoura Arcaica, dos prêmios dos festivais de Brasília e Cuba.

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