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René Ferrer deixa o rap pela tradição

Radicado no Rio, cantor cubano volta às fontes no segundo álbum e une com sutileza o samba aos ritmos da terra natal

Por Agencia Estado
Atualização:

O cantor e compositor cubano René Ferrer lançou o primeiro álbum-solo, El Loco Soy Yo em 2003, ano em que se radicou no Brasil trazido pela diretora de cinema Carolina Sá, com quem se casou. Ali já promovia o intercâmbio entre Havana e Rio, cantando um samba, Omama, azeitado pelo suingue latino. Fazia então parte da turma dos rappers que figuraram na compilação Soy Rapero, produzida pelos brasileiros Kassin e Guga Stroeter, lançada um ano antes. Reflexo dos novos ares, a sonoridade do segundo CD, Obatalá no Quiere Guerra (Cambucá Music), tempera a tradição cubana com a cadência brasileira, sutilmente assimilada. A sintonia entre as duas vertentes, que vem da ascendência africana, encontra êxito igual na evocação de divindades do candomblé. Se o álbum anterior abria com um canto à rainha do mar, Yemanjá, este é todo conduzido pela serenidade que René atribui à força da entidade maior, conhecida no Brasil como Oxalá. "Em mim, Obatalá fala através da música", diz o compositor, que abre o CD cantando versos como "sobre as águas do mar eu vi pombas brancas a voar", na faixa-título. "Ando dando graças à vida por cada amanhecer, por estar ao lado da pessoa amada", comenta. Além de tocar violão e percussão, René assina todas as faixas - duas em parceria com Carolina. Há uma única com letra em português, Rio, cantada pela pernambucana Cynthia Zamorano, a Cyz, jurada do programa Ídolos, do SBT. O samba dá o ar da graça em Habana 1800. O approach com o Brasil reverbera de longe. Ele aponta entre suas influências Djavan, Chico Buarque, Caetano Veloso e Gilberto Gil, além de Silvio Rodriguez, Pablo Milanes, Carlos Varela, expoentes da nueva trova cubana (que já não é tão nova assim). À base de violão, baixo e percussão, Obatalá tem sutis auxílios de trompetes, violinos e flautas. Movido a son, mambo, rumba, samba leve e reggae, entre outros ritmos, René destila uma certa nostalgia em canções de grande beleza e harmonia, mal deixando escapar resíduos de sua faceta rapera (Ave Maria é exceção). "Isto já vem incorporado na melodia, mas é uma nostalgia sadia. Nunca deixei de ir a Cuba e quando estou lá faço música brasileira, quando estou aqui faço música cubana. Ponho para funcionar o que aprendo em cada lugar. Em Cuba até falo mais português porque não tem ninguém para me corrigir", diz, bem-humorado. Da tradição de seu país, René traz não apenas o lirismo melódico, mas também a vocação melancólica do canto aliada ao prazer da fluência rítmica. Não que isto seja novidade em seu estilo, mas se mostra mais acentuado. "Sempre tive essa facilidade de interpretar a canção tradicional cubana. O rap foi uma variação novidadeira. Procuro sempre experimentar novas formas de transmitir algo", conta. Ele começou a carreira com o perfil sonoro que mantém hoje, aos 36 anos. Depois virou rapero e até cantou numa banda de rock, que fundia trash metal com os ritmos de suas experiências anteriores. Sua busca maior, no entanto, é pela tradição africana, sempre deixando os sentimentos a bailar ao ritmo dos tambores.

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