Primeiros álbuns do Stereolab têm edição nacional

Chegam ao País os três primeiros registros iniciais da banda que já foi chamada de marxista, retrô-futurista e que tem como intuito vislumbrar os limites do pop

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Por Agencia Estado
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Entusiasta e colecionador da música popular feita no Brasil nas décadas de 60 e 70, Tim Gane teve a oportunidade de conhecer a atual cena alternativa (o termo é horrível) da terra brasílis no ano passado. A banda inglesa Stereolab, na qual ele responde por instrumentos diversos e composições, esteve no País em agosto para uma série de belos shows. "Ficamos realmente impressionados com o interesse das pessoas pelo nosso trabalho", diz Gane, de sua casa em Londres, ao Estado. "Há uma cena independente bastante particular no Brasil; a maioria dos músicos é influenciada por bandas sixties européias e norte-americanas e não pela típica MPB que nós conhecemos aqui no exterior", continua. No entanto, ele redime a fixação indie-tupiniquim com a produção estrangeira usando a si próprio como exemplo. "Além dos brasileiros, adoro música alemã e francesa, nacionalidade não importa muito nesses casos", diz. Das várias aquisições que fez nas lojas de disco do centro de São Paulo, Gane destaca toda a discografia de Egberto Gismonti, descrita por ele como "incrível". "A verdade é que ainda me faltam alguns títulos", reconhece. Outro item que saltou aos olhos do líder do Stereolab foi o álbum Plastic Soda (Trama) do músico gaúcho Jupiter Apple. "Nos encontramos no Rio e ele nos deu o CD; a mistura de bossa nova e psicodelismo que ele faz é bem interessante." As lembranças da turnê brasileira esbarram ainda na festinha quase privê no club underground A Torre do Dr. Zero, no boêmio bairro da Vila Madalena. "Após o último show da turnê fomos todos para o bar encher a cara e dançar, foi ótimo." Ainda no campo das lembranças, dessa feita mais palpáveis, a Trama aproveita o rescaldo da passagem do grupo pelo Brasil e lança a compilação de singles Switched on (1992), o álbum de estréia Peng! (1992) e o posterior (The Groop Played) Space Age Batchelor Pad Music (1993). Registros significativos que compõem a extensa discografia do grupo fundado na Londres de 1991 por Gane e sua mulher, a charmosa vocalista francesa Laetitia Sadier. "Eu adoro fazer discos, o estúdio é para mim um espaço sagrado de experimentações sonoras, pois nele posso colocar minhas idéias em prática." Entre singles e álbuns irrepreensíveis, a prateleira de CDs do grupo vai até o 13.º título, isso, é bom lembrar, em dez anos de atividade. Diferentemente do que é alardeado por outros artistas, compor e elaborar discos é uma tarefa fácil? "É mais ou menos (pausa), talvez o prazer que o desenvolvimento de uma canção me proporciona faz com que eu não enxergue as dificuldades", continua. "Por outro lado, eu não consigo conceber a idéia de não lançar nada novo por dois ou três anos, isso é loucura." Prova disso é que o grupo já se encontra no playground, quer dizer estúdio, preparando o sucessor do EP The First of the Microbe Hunters (2000), editado no Brasil pela produtora mineira Motor Music. Segundo Gane, Soundust (nome provisório) terá 11 "canções impressionistas repletas de novos elementos e texturas". A idéia é conciliar as datas de apresentação (o grupo toca nas próximas semanas em Moscou e Istambul) com os trabalhos de produção para que o álbum esteja nas lojas em setembro. Como de costume, o discurso das peças será assinado por Laetitia e os arranjos criados, por Gane. "Isso é bem definido dentro da banda, admiro a maneira com que Laetitia trata de algumas questões", elogia. A verve da francesa já rendeu até mesmo comparações com a dialética à esquerda. Não raro, eram chamados de marxistas por conta de uma composição enigmática denominada Ping Pong. Há realmente um direcionamento político nas letras? "Essa você vai ter de perguntar para ela", desconversa. Mas voltando ao lançamento dos primeiros trabalhos, vale dizer que a música que abre a compilação de singles raros, a boa Super-Eletric, causou uma comoção sem tamanho na crítica inglesa. Corria o ano de 1991 e um dos escribas do semanário New Musical Express não se conteve em afirmar que Super-Eletric era " a melhor canção já escrita". "Eu me divirto muito com essa história, não acho que o pessoal da NME estivesse falando sério quando estamparam isso no jornal; Super-Eletric é uma boa música, bastante diferente do que estava rolando na época, mas não concordo que seja a melhor música já escrita." Na mesma medida, os singles de The Light That Will Cease To Fail (prensagem original de 880 vinis) e Changer (vendido exclusivamente pelo correio) estabeleceram o frenesi em torno do grupo antes mesmo do lançamento do primeiro álbum. Exageros à parte, a fusão de easy listening com kraut-rock alemão, passando pelo pop francês, groove e antigos teclados Moog e farfisa, faz a diferença e imprime ao Stereolab algo que vai muito além do rótulo retrô-futurista. "Termos como retrô e vanguarda me assustam, quero mesmo é captar a música pop de hoje." Se o desejo é só esse, o casal Gane e Laetitia, em companhia dos amigos MaryHanser, Richard Harrison e Andy Ramsay, estão no caminho certo desde sempre.

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