Polêmica: Barenboim quer reger Richard Wagner

O maestro argentino-israelense reafirmou ontem sua intenção de interpretar obras do compositor alemão no Festival de Israel. Para muitos judeus, a obra de Wagner é tida como um símbolo do nazismo

PUBLICIDADE

Por Agencia Estado
Atualização:

O maestro argentino-israelense Daniel Barenboim reafirmou ontem sua intenção de interpretar obras do alemão Richard Wagner no Festival de Israel, em julho, em Jerusalém. Ante os protestos suscitados em Israel há alguns dias, com a divulgação do repertório que integrará o festival, no qual constam peças de Wagner - considerado por israelenses como um símbolo do nazismo -, Barenboim lançou um comunicado em que reitera sua decisão: o compositor estará entre os que terão peças interpretadas sob sua regência. "As óperas de Wagner não são anti-semitas, ao contrário de seus escritos", explicou Barenboim, que tem 57 anos, é judeu e rege uma das mais importantes orquestras do mundo, a Staatsoper de Berlim. Mas, admitindo que a música de Wagner, uma das figuras mais importantes da escola romântica, evoca "terríveis associações" em algumas pessoas, Barenboim disse: "compreendo tais sentimentos e não desejo feri-los". O maestro lembrou que outros personagens do mundo da ópera e do teatro foram usados pelos nazistas, e citou Shylock, da peça O Mercador de Veneza, de William Shakespeare. Uma comissão do parlamento israelense mobilizou-se na semana passada e, durante uma sessão extraordinária, tomou posição contra o concerto, programado para o dia 7 de julho. Por 17 votos a 0, os deputados pediram sua anulação e decidiram reexaminar o assunto em sessão plenária. Por décadas, Richard Wagner - autor de virulentos escritos anti-semitas, entre eles o ensaio Os Judeus e a Música, datado de 1850 -, foi vetado em Israel. Mas, nos últimos anos, esse tabu perdeu força. A música de Wagner tem sido ouvida em rádios e em alguns concertos. Primeira vez - Esta seria, no entanto, a primeira vez que uma obra do compositor alemão seria interpretada no Festival de Israel, a maior manifestação cultural do país, subvencionada pelo estado. Em nome do governo israelense, o ministro Raanan Cohen pediu aos organizadores que tirem Wagner da programação. O ministro, porém, afirmou que a iniciativa do executivo ficaria limitada a esse pedido. A rejeição a Wagner em Israel já causou problemas para outros maestros. Em 1981, a Filarmônica de Israel, sob regência de Zubin Mehta, ofereceu um bis ao fim de um dos concertos de sua temporada. Ao anunciar a peça que a orquestra executaria, extraída da ópera Tristão e Isolda, Mehta fez um curto discurso no qual lembrou que Israel é uma democracia e que "todo tipo de música deve ser executado no país". No entanto, os palavras de Mehta provocaram uma comoção na platéia. Muitos espectadores passaram a gritar, tentanto silenciá-lo. Mehta disse que, se aquela música ofendia os sentimentos de ouvintes, estes poderiam retirar-se. Dois integrantes da orquestra foram dispensados de atuar na execução da peça. Alguns espectadores mais velhos levantaram-se e saíram. Outros permaneceram no teatro, manifestaram-se ruidosamente e tentaram invadir o palco. Mas a peça de Wagner foi executada até o fim. Alguns anos depois, em enquete para saber se a Filarmônica de Israel deveria tocar Wagner, realizada por um jornal, 50% dos entrevistados foram contra, 25% a favor e 25% não tinham opinião formada. Em 1992, a Filarmônica realizou sua própria pesquisa sobre a questão. A maioria foi favorável a Wagner. Mas, em respeito aos 30% contrários à execução da música wagneriana, o músico continuou a ser oficiosamente vetado em Israel.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.