Ópera "Andrea Chénier" estréia no Municipal de SP

Célebre por um de seus trechos principais, a ária La Mamma Morta, trilha sonora de um dos momentos mais tocantes do filme Filadélfia

PUBLICIDADE

Por Agencia Estado
Atualização:

A única ópera do compositor Umberto Giordano a sobreviver ao tempo, Andrea Chénier goza dupla fama. Para o público em geral, ficou célebre por causa de um de seus trechos principais, a ária La Mamma Morta, trilha sonora de um dos momentos mais tocantes do filme Filadélfia, de Jonathan Demme. A ária é o momento-chave de Filadélfia, a expressão dilacerada do sofrimento humano diante da finitude, interpretada por Tom Hanks, o homem que perde o emprego por assumir ser portador da síndrome de imunodeficiência adquirida e é defendido por um advogado, interpretado por Denzel Washington. A cena, overacted, foi decisiva para que ele ganhasse o Oscar. Para o fã da música lírica, é daqueles "operões", em que todas as características do gênero - drama, grandes vozes, etc. - são elevadas à máxima potência. E é para esses dois públicos que estréia neste sábado a nova montagem de Andrea Chénier, assinada pelo maestro Jamil Maluf e o diretor André Heller, no Municipal de São Paulo. "Esta é uma ópera de cantores", explica Jamil Maluf. "Tem grandes momentos para o tenor, a soprano e o barítono, colocando à prova toda a técnica e experiência deles. É daquelas ópera que, se você não tem bons artistas disponíveis, não vale a pena montar", completa. "É uma história de amor em tempos de cólera", brinca o diretor André Heller. "Estamos no meio da Revolução Francesa. Uma jovem mimada descobre o mundo por meio de um poeta que, por sua vez, é perseguido por suas posições políticas." Ópera é do período conhecido como Verismo De um lado, a música; de outro, o texto. Mas uma das coisas que fazem de Andrea Chénier uma ópera tão importante é o modo como esses dois elementos se encaixam. A obra faz parte de um período que, na ópera do fim do século 19, ficou conhecido como verismo. A partir dali, enquanto na literatura Émile Zola descrevia a greve de mineiros no norte da França no ano 1860, os palcos de ópera foram invadidos por personagens tidos como marginais, muitas vezes das classes sociais mais baixas. Falando assim, parece pouco. Mas, em música a mudança foi bastante significativa. O novo formato passou a exigir um tipo diferente de canto, menos ornamental, rebuscado. Também a estrutura das óperas e seus trechos - árias, duetos, trios, quartetos, etc. - sofreu alterações. E Andrea Chénier"é exemplo interessante desse período. "Música e drama trabalham aqui de maneira indissociável. Talvez em parte pela qualidade do libreto que Giordano tinha em mãos. E as situações extremas de violência e revolta narradas pelo texto fizeram com que o compositor construísse a partitura de um modo totalmente original", diz Maluf. Autores usam fontes diversas para recriar história de amor e traição de Andrea Chénier Em Andrea Chénier, o estilo verista está misturado a uma fantasia histórica. Esse poeta adepto da revolução, que pregava com seus textos e acabou guilhotinado, de fato existiu. Mas pouco se sabe de sua vida. O próprio libretista Luigi Illica diz não ter se inspirado em fatos, mas, sim, em sugestões dadas pelo editor dos textos do verdadeiro Chénier, ao incluí-lo nesta trama de amores frustrados musicada por Umberto Giordano, que estréia neste sábado no Teatro Municipal de São Paulo. A história é a seguinte: Maddalena é uma jovem aristocrata, que leva uma vida frívola até conhecer o poeta revolucionário Chénier. Cinco anos se passam desde que eles se conhecem em uma festa e, com a revolução levada adiante, surge um problema. Gerard - que, naquela festa, trabalhava como mordomo, e agora é um dos agentes de Robespierre - ama Maddalena Para ficar com ela, livra-se do rival, acusando-o de ser um contra-revolucionário, levando-o à prisão, onde vai aguardar pela guilhotina. E por aí vai. O importante é dizer que Illica constrói, enfim, uma história na qual são dependentes o drama pessoal dos personagens e o contexto histórico em que vivem. O que, para um libreto de ópera - muitas vezes entregue a histórias fantasiosas e pouco verossímeis -, é um belo feito. História de amor em momento político conturbado "Cada vez mais tenho certeza de que a ópera lida com emoção, sentimentos. Para mim, Chénier é uma história de amor que se dá em meio a um momento político conturbado. Poderia tê-la ambientado em meio à guerra no Iraque ou coisa assim. Sabe não preciso ser careta. Mas, se eu atualizo uma história como essa, de alguma maneira estou subestimando a capacidade do público de fazer suas próprias relações", diz o diretor André Heller, que acaba de voltar de Londres, onde trabalhou por dois anos em Covent Garden, a casa de ópera de Sua Majestade. A poesia está no centro do enredo da ópera - e no da montagem de Heller. "Madalena é uma menina mimada, inexperiente. Ela passa a conhecer a realidade por meio da poesia de Chénier", explica o diretor. A soprano norte-americana Maria Russo, que foi a Brunhilde do Anel do Nibelungo, de Wagner, no Festival Amazonas de Ópera, concorda. "Maddalena é uma personagem em constante transformação. Não sabe o que fazer com aquilo que sente, com a sua própria sensibilidade poética até encontrar Chénier." Ao lado de Maria Russo, participam do elenco o tenor búlgaro Kaludi Kaludov (Chénier) e o barítono brasileiro Lício Bruno (Gerard), além de vários cantores pertencentes aos corpos estáveis do Municipal. "Em um momento em que a gente pensa em criar uma companhia própria de ópera, é fundamental dar espaço a cantores que trabalham dentro do teatro, no coro", diz Jamil Maluf. Assim, na récita de segunda, Maria Russo e Kaludov dão lugar ao tenor Marcelo Vanucci e à soprano Mônica Martins, ambos membros do Coral Lírico Municipal. Ainda no elenco, estão nomes como Edinéia de Oliveira, Homero Velho, Silvia Tessuto, Sebastião Teixeira, Paulo Queiroz e Miguel Geraldi, entre outros Andrea Chénier. 3h (três intervalos de 15 min. cada). Teatro Municipal. Praça Ramos de Azevedo, s/nº, Centro, 3222-8698. Sábado, 2.ª, 4.ª e 6.ª (dia 9), 20h30; dom. (dia 11), 17 h. R$ 10 a R$ 40. Até 11/6

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.