Novo álbum do ABBA é um voo capaz de levar o ouvinte direto aos anos 70

Chega hoje às plataformas o ótimo 'Voyage', primeiro disco depois de 40 anos do término do quarteto sueco; shows de lançamento serão em maio de 2022, em uma arena montada em Londres

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Por Julio Maria
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O grupo ABBA lança hoje, 5 de novembro, seu novo álbum. E esta é uma notícia que não pode ser dada assim tão, digamos, pragmaticamente. Então, com a licença do equilíbrio que o fato pede, tentemos de novo: uma das maiores potências da música pop desde que se criou o próprio pop, com Elvis, nos anos 1950, o ABBA produz o primeiro evento musical mobilizador de massas pelo menos desde o início da pandemia, o único retorno planetário com integrantes originais em muitas décadas e um dos poucos motivos para se sorrir de verdade em pelo menos dois anos ao lançar, depois de 40 longe dos estúdios, um novo álbum.

Os quatro integrantes do ABBA. em 2021 Foto: Universal

Voyage é seu nome, e o Estadão ouviu o disco todo mediante promessa de firma reconhecida de que nada vazaria antes do grande dia. Eis então o grande dia e, de fato, um grande álbum. É preciso dizer que o ABBA, mesmo apanhando muito dos críticos entre 1972 e o início dos anos 1980, deixou de ser emissor para se tornar memória e ultrapassou a linha que separa os artistas das eras, algo que não se mede por talento. As eras, mais do que os próprios artistas que as produziram, são lugares. Beatles é era, Elton John é artista. James Brown é era, Eric Clapton é guitarrista. Michael Jackson é era, Prince não é. E qualquer análise de um disco do ABBA lançado em 2021 deve ficar mais honesta quando sentimos, para além dos detalhes de uma canção, os lugares para onde ela é capaz de nos levar.

Então, se o destino era o planeta ABBA, Voyage é a espaçonave perfeita. Mesmo assediados por linguagens do pós-streaming que poderiam levá-los para as terras prometidas dos likes milionários, a produção sólida de Benny Andersson não tem outra direção que não “o som do ABBA”. Um detalhe de ficha técnica, também guardada sob cadeados: quando o mundo troca orquestras por arranjos pré-gravados em sintetizadores, eles impressionam com um pop grandioso feito sob batuta e muitos instrumentos reais. Só a belíssima I Still Have Faith In You, um diamante na voz ressurreta de Agnetha Fältskog, de 71 anos, conta com 26 músicos da Stockholm Concert Orchestra conduzidos pelo maestro Göran Arnberg, além dos vocais e do teclado de Andersson, das vozes de Björn Ulvaeus, Agnetha e Anni-Frid Lyngstad, da bateria de Per Lindvall e da guitarra de Lasse Wellander.

O grupo ABBA, nos anos 70 Foto: Universal

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O ABBA vai lançar o álbum na Abba Voyage, em Londres, a partir de 27 de maio de 2022. Será uma experiência ainda pouco explicada, mas que promete, com os “abbatares”, os quatro integrantes originais, que estarão mas não estarão no palco. Há mais raridade por debaixo da superfície do ABBA. Seus arranjos inspirados em culturas celtas, os fragmentos do classicismo europeu, as vozes líricas e a linearidade de baixo e bateria que nunca buscam o groove do funk, nada em seus hits traz influências da música negra feita a partir dos Estados Unidos que assolava o planeta naqueles anos. É, ao contrário até do australiano Bee Gees, o pop mais branco que soou pelo mundo por tanto tempo, algo que jamais interceptou uma linha de suas conquistas. 

E muitas das canções novas, como a delicadeza de Little Things, a volta à noite com mais ternura do que furor de Don’t Shut Me Down, o sol californiano com ideias de Beach Boys de Just a Notion, a tristeza profunda e bela de I Can Be That Woman e a cantiga Bumblebee, criam um outro tempo, algum lugar entre o ontem e o hoje, o que está aqui e o que não está, algo que esquecemos de nomear e que, por isso, só conseguimos sentir.

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