Nos seus 50 anos, o clássico 'Álbum Branco' dos Beatles ganha reedição

Com belas melodias, boas poesias e rock autêntico, disco que marcou o fim da banda está de volta remixado

PUBLICIDADE

Por Carlos Oliveira
Atualização:

Os Beatles não acabaram em Abbey Road, último álbum gravado pela banda, em 1969. Também não acabaram em Let It Be, gravado antes de Abbey Road, mas lançado em 1970. A banda terminou melancolicamente bem antes, durante as gravações de um álbum que nasceu e foi lançado sem nome. O Álbum Branco foi assim batizado pela crítica há meio século, mais exatamente em 22 de novembro de 1968. Ele marcou o fim dos Beatles.

PUBLICIDADE

Filme mostra os anos de turnê dos Beatles, da euforia à exaustão

Nos estúdios de Abbey Road, não estava mais aquela banda de rock que anos antes encantara o mundo com sua alegria e ousadia. Como sombras do que um dia foram, John Lennon, Paul McCartney, George Harrison e Ringo Starr fecharam-se em seus egos e produziram uma obra temperada a mau humor, brigas, egoísmo e individualismo. Não mais se suportavam. Mal se falavam.

Mesmo assim, apesar do clima pesado, o conteúdo do álbum duplo reuniu belas melodias (Julia), boas poesias (While My Guitar Gently Weeps), rock autêntico (Back in the USSR), blues (Yer Blues) e o embrião do que viria a ser chamado de heavy metal (Helter Skelter), além de baladas bucólicas (Mother Nature’s Son) e algum experimentalismo (Revolution 9).

Paul, Ringo, George e John, os Beatles em 1965 Foto: Apple Corps Ltd./Reuters

Dois LPs e um encarte. Os Beatles acabavam como banda, mas o talento individual de cada um ainda estava lá, preservado e em evolução. Basta ver a carreira solo de George, Paul e John, além a de um acanhado Ringo Starr. Quase como se quisessem se esconder de si mesmos, camuflaram as palavras The Beatles, impressas em corpo pequeno, em relevo branco como o resto da capa e da contracapa da obra. Dentro, dois LPs e um encarte de dupla face: numa, fotos (a maioria individuais) dos músicos; na outra, as letras de 28 canções. 

Disco mais ousado dos Beatles, 'Álbum Branco' completa 50 anos e ganha reedição de luxo

Se há uma palavra que possa definir o processo de criação do Álbum Branco, que agora completa 50 anos, melancolia seria a mais adequada. E não sem razão. Pressão demais. Bem no momento em que decidiram buscar alguma orientação espiritual com o guru indiano Maharishi Mahesh Yogi, as coisas pareceram desandar para o grupo. Em 24 de agosto de 1967, partiram para Bangor, no norte do País de Gales, em busca de seus mantras com o tal guru.

Publicidade

Guru morto. Três dias depois, a notícia que mudaria radicalmente a história da banda. Seu empresário Brian Epstein, uma espécie de pai e gerente comercial dos quatro músicos, estava morto aos 32 anos. Causa oficial da morte: “Overdose acidental” de Carbitol, uma droga contra a insônia.

Guru vivo. Mesmo abalados, partiram para a Índia, para um curso de meditação transcendental no asham (algo como escola) de Maharishi, em Rishikesh. No fundo, tentavam, em vão, manter a unidade do grupo. Paul e Ringo logo se desencantaram e voltaram para Londres. John e George (o mais comprometido espiritualmente com o guru) voltaram depois, em meio a rumores de que o indiano teria tentado se aproveitar sexualmente de uma de suas alunas, o que nunca ficou comprovado.

Já na Inglaterra, um novo desafio: criar composições que superassem o sucesso de Sgt. Pepper's, mas com que ânimo? Tinham que resgatar parte dos prejuízos que tiveram com o filme Magical Mistery Tour e encontrar alguém que pudesse cuidar do milionário negócio Beatle. Fundaram a Apple e afundaram de vez. Tentaram fazer o que hoje se chama de um projeto multimídia, mas não souberam administrá-lo.

Cada vez mais ensimesmados, deram-se mais uma chance: reuniram-se no bangalô de George Harrison, em Esher, e gravaram várias fitas demo de suas novas composições, a maioria criada durante o exílio espiritual na Índia. No fundo, as demos de Asher, como passaram a ser chamadas, foram um grande ensaio meramente acústico. Violões em vez de guitarras e um imenso desfile de egos inflados.

PUBLICIDADE

'The Beatles - A Biografia' chega finalmente ao Brasil

“Paul disse ter composto dezenas de novas canções. George disse que criou seis e eu escrevi 15”, disse um John Lennon soberbo. Seja como for, o embrião de um novo álbum estava pleno de referências do que viram e viveram em Rishikesh (Dear Prudence).

De volta aos estúdios de Abbey Road, mais desavenças. John levou consigo sua nova namorada, Yoko Ono, quebrando um protocolo pétreo: durante as gravações, só os quatro no estúdio. Ao mesmo tempo, John rendia-se à heroína (Happiness Is a Warm Gun). Resultado: em que pese toda a qualidade musical inegável do Álbum Branco, o fato é que cada músico decidiu isolar-se nos vários espaços de gravações e cuidar das próprias canções. Apenas no registro de Yer Blues os quatro estiveram juntos no mesmo ambiente e portaram-se como uma banda de verdade.

Publicidade

De volta. 50 anos depois, remixado, remoçado e com todas as faixas demo gravadas em Esher, o Álbum Branco está de volta, a provar que o autor do slogan Beatles 4ever é não só um gênio de marketing, mas um profeta.

Do ponto de vista comercial, uma tacada ousada, a um passo do sucesso. O cinquentão Álbum Branco ressurge em várias versões e vários preços, que podem variar de R$ 100 (os dois CDs originais, mais as demos de Esher) a R$ 1.500 (valor ainda estimado). Neste último caso, o material vem em uma caixa de “superluxo” com sete CDs, entre eles um Blu-Ray, e vários encartes. A procura nas lojas e importadoras é intensa.

Para o beatlemaníaco, pouco importa se o Álbum Branco foi uma coletânea de desavenças. Vale, sim, reviver as emoções de 28 músicas que marcaram uma época fadada a ser atual para sempre.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.