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Neta de Caymmi lança livro sobre a bossa nova na obra do avô

Stella Caymmi analisa, em 'Caymmi e a Bossa Nova', de que maneira a obra estética de seu avô foi valorizada

Por Roberta Pennafort
Atualização:

A relação de Dorival Caymmi com a bossa nova é lembrada quase somente por sua proximidade com Tom Jobim, com quem o baiano fez Caymmi Visita Tom, disco antológico de 1964, e com quem mantinha estreita ligação de admiração e amizade. E, claro, por ser Caymmi um compositor fundamental para João Gilberto - uma mostra recente disso foi dada nos shows de João pelos 50 anos da bossa, nos quais ele cantou e tocou Você Já Foi à Bahia?, Rosa Morena, Doralice e Você Não Sabe Amar, em homenagem ao compositor, que morreu no dia 16 de agosto.   Esse genial baiano, que, na passagem dos anos 30 para os 40, começou a carreira como autor regional, ligou-se bem mais do que isso ao "movimento" urbano de modernização da música popular brasileira do fim dos 50. E essa ligação é considerada fundamental para a permanência de sua obra, constatou a neta e biógrafa Stella Caymmi, durante a pesquisa para a dissertação de mestrado que defendeu em 2006 na PUC do Rio. O trabalho se transformou no livro Caymmi e a Bossa Nova (Ibis Libris), que Stella lança nesta terça-feira, 9, no Mistura Fina, no Rio, agora sob o impacto da perda do avô e da avó, Stella (ela morreu no dia 27). Como se sabe, esse é um ano significativo para os bossa-novistas, e também para Caymmi, que celebrou sete décadas de carreira em junho. O lançamento neste momento, portanto, vem a calhar.   A idéia do livro surgiu quando Stella trabalhava na biografia Dorival Caymmi: o Mar e o Tempo (2001). Dois anos antes, ela foi pega de surpresa por uma afirmação de Chico Buarque, um de seus entrevistados: "Por ser um movimento revolucionário, a bossa nova recusou muita coisa. Recusou Noel, Ataulfo Alves.... os grandes da música brasileira. E não podia recusar Caymmi." Stella pensou: por que não?   "Com a bossa nova, tudo ficou velho de repente. Mas a obra de Caymmi já tinha elementos que a bossa nova iria aprofundar: a liberdade harmônica, as letras enxutas, a temática amorosa e do mar", aponta ela, que havia começado o mestrado com a intenção de tratar das representações da Bahia nas músicas de Caymmi. "A partir da frase do Chico, tudo mudou."   Compositor de canções fundamentais do gênero, Carlos Lyra concorda com as constatações de Stella. "Caymmi não é datado. A qualidade da música dele supera a de Ary Barroso em modernidade e em frescor. Já nasce moderna, rica." Carlinhos chama a atenção para o tom coloquial e leve das letras, bem diferente do rebuscamento que era rechaçado por ele e seus pares à época. "Não tinha aquela coisa de ‘garçom, apaga a luz que eu vou me matar’. Caymmi cantava um amor de classe média, como o da bossa nova, não era vulgar. Por isso sempre foi apreciado por Tom, por João, por mim e por todo mundo." Stella lembra que o dramalhão dos sambas de dor-de-cotovelo aos quais ele se refere de fato não combinava com o estilo do avô - nem na música, nem na vida. "Não dá para imaginá-lo em tom dramático, porque ele era contra queixas. Tudo isso, essa leveza, o aproxima da modernidade."   Roberto Menescal, também da chamada primeira geração da bossa nova, se recorda do fascínio de sua turma por canções como Sábado em Copacabana, Só Louco e Você Não Sabe Amar: "Sábado em Copacabana era um hino pra gente. Vivíamos uma coisa muito cosmopolita, numa Copacabana que crescia, e Caymmi simbolizava isso", conta, referindo-se ao Caymmi carioca, cuja música vivia sua "fase urbana" - antes dela, vieram a dos "sambas sacudidos", também conhecidos como "postais da Bahia", a das canções praieiras e das folclóricas. Segundo Menescal, Caymmi, além de encantar os então rapazes da bossa nova com suas músicas, tinha com eles uma relação de carinho. "Ele abriu as portas de casa pra gente."

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