Não foi tempo perdido

Legião Urbana tem seu mais luxuoso relançamento desde a morte de Renato Russo

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Por Lauro Lisboa Garcia
Atualização:

O trocadilho infame todo mundo já fez, mas desta vez o legado da Legião Urbana volta com um pouco além de “mais do mesmo”. A propósito dos 25 anos do lançamento do primeiro álbum, toda a discografia de estúdio da banda chega às lojas na segunda-feira em três formatos (CDs avulsos, caixa de CDs e discos de vinil), com algumas novidades. Não espere, porém, faixas bônus, takes alternativos, coisas do gênero. Isso vai ficar para outra ocasião, segundo o guitarrista Dado Villa-Lobos. “Lembro de Juízo Final, de Nelson Cavaquinho que a gente gravou para o segundo disco e não entrou porque não cabia. Tem também uns ensaios em estúdios com temas que a gente nunca gravou”, diz Dado. A novidade é que os oito discos ganharam edições de qualidade superior às anteriores.

 

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As versões remasterizadas em Abbey Road já tinham saído em 1995. Os atrativos para os fãs agora são as fotos inéditas, textos exclusivos de Christina Fuscaldo sobre as circunstâncias em que cada disco foi gravado, e o formato digipack do CD, além dos LPs. Dois deles saem pela primeira vez em vinil, A Tempestade (1996) e Uma Outra Estação (1997), lançado depois da morte do cantor e letrista Renato Russo (1960-1996). Os demais, que saíram primeiro em LP, voltam com vinil de melhor qualidade e capas duplas (as originais eram simples). “Na época a gente não teve um vinil tão bom. Esse tem uma gramatura alta, muito boa”, atesta Dado.

 

Os valores nas lojas são salgados, e esses dois discos inéditos são duplos, ao preço (sugerido pela gravadora EMI) de R$ 190 cada. Os demais custam cada R$ 120 (As Quatro Estações e Descobrimento do Brasil) e R$ 140 (Legião Urbana, Dois, Que País É Este? e V). Os CDs vendidos separadamente devem custar em torno de R$ 30 e o box, com tiragem limitada de 2 mil exemplares, sai por R$ 350.

 

Vai vender tudo

 

A brincadeira com o “mais do mesmo” (título da faixa que encerra Que País É Este?) não é só pela falta de novidade de conteúdo. É que esse tipo de investimento acaba levando os mesmos fãs, que têm uma devoção pela banda comparável a Elvis Presley e Beatles, a comprarem tudo de novo. Qualquer item interessa e vende. Além do mais, o rock da Legião continua tendo apelo para outras gerações. Por isso o alto custo não representa risco. “A gente não começou a vender sabonete ainda”, brinca o baterista Marcelo Bonfá. “São só mil cópias de cada vinil. Vai vender tudo. Acho que tem gente que vai comprar e nem vai ouvir.”

 

Segundo Dado, não foi feita nenhuma pesquisa sobre a demanda de público para um lançamento de luxo como este. “O catálogo sempre esteve à venda, as novas geração vão lá e compram. A última notícia que tivemos é que foi lançado um pacote mais barato nas Lojas Americanas, e foram vendidas 500 mil cópias”, conta. “Acho que isso é um sinal de que todas as mídias estão aí para sobreviver. Isso fortalece todo mundo, a indústria, o Brasil, a percepção de que é possível se vender música hoje. Vejo isso como um sinal muito positivo.”

 

Há tempos, Dado e Bonfá vêm falando de se reunir para tocar o repertório da Legião e agora, mais uma vez se cogitou a ideia. “Estamos com Carlos Taran, que é muito responsável pela coordenação quase total desse projeto. E é uma pessoa agregadora entre eu e o Dado, coisa que a gente não tinha há muitos anos”, diz Bonfá. “Estávamos dispersos, cada um voltado para seus trabalhos individuais. A gente está conversando há um certo tempo sobre voltar a tocar juntos.”

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Um punhado de clássicos

 

Poucas bandas contemporâneas da Legião têm tanto alcance e tantos hits que reverberam de geração para geração. Desde a explosão de Será?, há uma penca de clássicos: Ainda É Cedo, Por Enquanto, Teorema, Quase Sem Querer, Tempo Perdido, Índios, Há Tempos, Pais e Filhos, Quando o Sol Bater na Janela do Teu Quarto, Monte Castelo, Meninos e Meninas, Eu Sei, Faroeste Caboclo, Que País É Este?, Metal Contra as Nuvens, Vento no Litoral, O Teatro dos Vampiros, Giz, Perfeição, Soul Parsifal... São muitas opções pra quem não aguenta mais ouvir a pegajosa Eduardo e Mônica. Está tudo aí rebrilhando de novo. Música Para Acampamentos e o Acústico MTV, ambos ao vivo, ficaram de fora.

 

Disco a Disco, por Dado e Marcelo

 

Legião

 

 

“A história da nossa adolescência estava ali. O disco traduz o momento que o país vivia: a redemocratização. Estávamos aprendendo a lidar com tantas novidades.”

 

Marcelo Bonfá

 

“A gente brigou com vários produtores porque eles queriam que a gente fizesse um som que achavam que a gente sabia como era, mas a gente não sabia! Só sabíamos fazer punk-rock!”

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Dois

 

 

“No dois rolou aquela sensação que bate no 2º álbum: o que vamos fazer agora? Vamos ser um grupo de rock mesmo? Vamos continuar nesse caminho?”

 

Marcelo Bonfá

 

“Foi complicado. Eu estava morando sozinho no Rio e comecei a entrar em parafuso. Tinha uma pressão forte externa e uma pressão minha. Acho que foi um dos que mais vendeu. Mas foi um parto.”

 

Que país é esse?

 

 

“O grupo estava querendo fazer canções novas naquela época, mas a gente tinha que lançar um disco novo e acabou sendo muito divertido regravar coisas do aborto elétrico.”

 

Marcelo Bonfá

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“Gostávamos muito das músicas, elas são responsáveis pelo que fazemos até hoje. A preocupação ali era a sonoridade. Por isso acho que este disco, em termos de sonoridade, é o melhor de todos.”

 

As 4 estações

 

 

“O sucesso anterior de ‘Que país é este’ nos deu tempo para gravarmos de uma maneira e por um caminho diferente do que havíamos feito antes. Ele é mais espiritual, menos material, menos urgente.”

 

Marcelo Bonfá

 

“Tivemos muitos problemas com o (baixista) Renato Rocha. Ele esquecia o baixo, chegava atrasado. Eu e o Renato Russo achamos o momento de afastá-lo. A gente nunca se entendeu.”

 

V

 

 

“Foi feito na época do Collor que agora, infelizmente, está de volta à cena política. Era um momento esquisito, havia um sentimento de revolta geral. Por isso o disco tem uma certa raiva nas canções.”

 

Marcelo Bonfá

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“Já estávamos escravos da tecnologia. Ficava todo mundo dentro do estúdio com fones de ouvido. Sentamos todos na mesma sala e o disco foi todo feito assim.”

 

O descobrimento do brasil

 

 

“A gente tinha chegado à conclusão de que iria fazer canções com um formato mais pop. A ideia era pensar em vários ‘singles’, mas sempre tratando de questões importantes.”

 

Marcelo Bonfá

 

“Me lembro da gravação do vídeo da música título. A gente foi pro rio gravar o clipe e foi uma produção super legal, com figurinos e tudo mais, como a gente nunca tinha feito.”

 

A tempestade

 

 

“Foi quase um disco de despedida, apesar de isso não ter sido percebido durante a feitura. Hoje a gente consegue ver, depois que tudo já passou. Foi um disco difícil, mas está aí.”

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Marcelo Bonfá

 

“A gente já falava com o Renato mais pelo telefone do estúdio. Foi complicado, ele já não estava bem e a gente sabia que precisava tocar o barco. Era a melhor coisa a fazer para ele e pela gente.”

 

Uma outra Estação

 

 

“É um projeto póstumo, o Renato ja não estava mais entre nós. E era um disco meio urgente pra fechar tudo aquilo que foi a Legião Urbana, a produção musical no estúdio.”

 

Marcelo Bonfá

 

“O melhor de nós nesse projeto. De fato, ‘Uma outra estação’ foi o último disco. Apesar de as músicas gravadas nele serem belíssimas, é um álbum realmente muito triste.”

 

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