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Na vida pós-OSB

Demitidos, músicos renomados seguem tocando em outros grupos e dando aulas, mas ainda não desistiram

Por Roberta Pennafort e RIO - O Estado de S.Paulo
Atualização:

O violoncelista inglês David Chew completou 30 anos de Rio de Janeiro e de Orquestra Sinfônica Brasileira no último sábado. Não comemorou. "Não tem clima. É o momento mais triste da minha carreira", conta o músico, um dos 36 demitidos por justa causa no mês passado.

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Spalla (primeiro violoncelo) da OSB, Chew não se submeteu à avaliação de desempenho na qual, acompanhado de uma banca, o maestro que lhe ouve nos ensaios e nos concertos verificaria sua afinação, precisão técnica, domínio dos estilos e da obra tocada, entre outros quesitos.

Michel Bessler, spalla dos violinos, no prestigioso posto desde 1977, sendo o mais jovem a alcançá-lo (tinha 28 anos), e também o primeiro brasileiro, compara: é como se um jornalista tivesse de passar por uma prova de redação, ou se um advogado experiente fosse submetido novamente ao exame da OAB.

"Foi uma agressão muito forte. Vivi metade desses 70 anos da OSB. Tenho 62 anos e nunca estive tão em forma", garante. "Passei noites colando pedaços de partituras para tocarmos, porque não tínhamos novas."

Os irmãos gêmeos Paulo e Ricardo Santoro, violoncelistas de 43 anos, eram universitários quando passaram na audição para a OSB, aos 18. "Fomos criados com nosso pai (contrabaixista) tocando em orquestra e meu sonho era ter um filho vendo o pai numa orquestra", lamenta Paulo, que planejava com a mulher ter um filho este ano.

Paulo e Ricardo formam o Duo Santoro, que se apresenta pelo Brasil e o mundo há 21 anos. Michel Bessler também toca em formações camerísticas, assim como David Chew, o violista Nayran Pessanha, o trompista Antonio José Augusto e a maior parte dos dispensados.

Dos 36, 25 são integrantes de orquestras com as Sinfônicas da Petrobrás e da UFRJ ou fazem participações a convite. Treze são professores, sendo dois na Escola de Música da UFRJ, a mais tradicional do País. Conquistaram reconhecimento de colegas, maestros, críticos, assinantes. Eles desejam manter-se unidos, apresentando-se em formações diversas. "Todo mundo sempre vestiu a camisa da OSB, mas cuidou de suas carreiras. Seguramos firme nos momentos difíceis, ficamos até seis meses sem receber salário. A OSB nunca será página virada para mim", conta Pessanha.

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A expressão também é usada por Antonio Augusto. "Essa OSB que está aí não existe de fato, só no discurso de alguns. Da minha OSB eu não abro mão." Ele talvez seja a cara mais dramática da crise, que começou nas férias de janeiro, quando foi enviada a notificação sobre a prova, marcada para março (as negociações se encerraram em abril, porque os músicos demandaram a saída do diretor artístico e regente titular, Roberto Minczuk, e a Fundação OSB não aceitou): aos 46 anos, o trompista teve um enfarte na semana seguinte à prova não realizada.

Cerca de 30 instrumentistas compareceram. São, em geral, mais jovens, e muitos, estrangeiros, europeus e latino-americanos, alguns movidos pelo temor de perder o visto de trabalho.

Semana que vem, começam as audições para 33 vagas de violinista, violista, violoncelista, contrabaixista, flautista, oboísta, clarinetista, fagotista, trompista, trombonista, trompetista e pianista. Serão de segunda a quarta em Londres, de sexta a domingo em Nova York, e, entre os dias 25 e 28, chegam ao Rio. Entidades e músicos de vários países fazem campanha na internet para que sejam boicotadas.

Especialistas calculam que provavelmente serão necessárias décadas para que a identidade musical da OSB seja recuperada. A Fosb sustenta que o processo é benéfico para a orquestra, que busca alcançar nível internacional. Seu site anuncia que a temporada começa em agosto, "em virtude do processo de reorganização de seu corpo orquestral" - embora na página do Teatro Municipal todos os concertos até dezembro estejam com o aviso: "Venda de ingressos suspensa temporariamente, a pedido da Fosb".

 

O QUE É

Orquestra Sinfônica Brasileira

Fundado em 1940, é o mais tradicional conjunto sinfônico do País, havendo formado gerações de plateias. Desde 2005, tem como diretor artístico e regente titular o renomado maestro Roberto Minczuk, que enfrentou - e venceu - embates com os músicos em 2008 e neste ano. Minczuk sustenta que trabalha pela excelência da orquestra; os instrumentistas o definem como déspota.

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