Musical vai contar a saga de Cartola

O criador da Estação Primeira de Mangueira, inventor do desfile de escolas de samba, compositor e cantor Cartola vai ter sua vida de dificuldades e poesia contada num musical que começa a ser produzido agora

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Por Agencia Estado
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O compositor Cartola (1908-1980) dizia que sua vida dava um filme de bangue-bangue, pois o mocinho só venceu no fim e ele fez sucesso quando já tinha mais de 60 anos. Mas a escritora Sandra Louzada, que em 1997 escreveu o musical Somos Irmãs, sobre a vida das irmãs Linda e Dircinha Batista, preferiu fazer uma peça de teatro, contando a história do fundador da escola de samba Mangueira como se fosse um desfile no sambódromo. "Cartola é o exemplo do que nós podemos ser. Conseguiu tudo na vida com talento, persistência e doçura", comenta Sandra. Ela entrou no projeto a convite das atrizes Júlia Rabello, Laura Castro e Marta Nóbrega, recém-entradas nos 20 anos e estreando em produção com esse musical. O projeto foi lançado na quarta-feira no Centro Cultural Cartola, que fica próximo ao Morro da Mangueira, na zona norte do Rio, onde Cartola viveu a partir dos 10 anos, fundou sua escola de samba com Carlos Cachaça e conviveu com bambas como Noel Rosa (de quem era companheiro de copo e madrugadas), Nelson Cavaquinho e Paulo da Portela. Foi lá também que ele conheceu dona Zica, sua terceira e definitiva mulher, a grande homenageada da peça. "Ela é a responsável pela volta por cima do Cartola e também pela tranqüilidade que ele teve no fim da vida, quando compôs o melhor de sua obra", lembra Sandra. "A peça é sobre o compositor, mas é também sobre a convivência dos dois e o exemplo que eles deixam para todos nós." A autorização da família foi o primeiro passo para o projeto, orçado em R$ 900 mil e inscrito nas leis de incentivo à cultura federal, estadual e municipal. Flávio Bauraqui, o Jair Rodrigues da peça Elis, Estrela do Brasil e ator das biografias musicais de Clara Nunes e Dolores Duran, vai viver o compositor no espetáculo, previsto para 2003. "Queremos estrear em outubro, porque estarão se completando 40 anos do ZiCartola, o restaurante que mudou o cenário artístico do Rio, e 95 anos de nascimento do compositor", adianta Marta. "Ainda não escolhemos o elenco, mas pensamos em Maria Ceiça para dona Zica. A direção musical será de Leandro Braga, o mesmo de Somos Irmãs." Grande produção - Sandra Louzada ainda está no primeiro tratamento do texto e já sabe que escreverá uma grande produção, com muitos atores em cena, música ao vivo, mas cenários e figurinos mais enxutos que Somos Irmãs, em que a cena se passava em dois planos e o drama das cantoras que foram estrelas do rádio e decaíram com o advento da televisão tinha de ganhar leveza. "No caso de Cartola, não preciso amaciar a história, mas já estou sofrendo porque todos os seus sucessos não cabem no tempo de um espetáculo", avisa Sandra. "E não dá para excluir As Rosas não Falam, O Sol Nascerá, Tive Sim e uma lista enorme." Autor de mais de uma centena de músicas, sozinho ou em parcerias, Cartola nasceu Agenor de Oliveira, no Catete, zona sul, e viveu até os 9 anos como menino de classe média, pois seu pai era cozinheiro de uma família aristocrática. Com a morte dele, a família empobreceu e mudou-se para o Morro da Mangueira, uma das primeiras favelas do Rio. Lá conviveu com os primeiros sambistas, consolidou o gênero com eles, conheceu o sucesso nos anos 30 e voltou a ser reconhecido na década de 60. Se fosse possível deixar de lado sua obra musical, ainda assim Cartola seria fundamental para a cultura brasileira. Além de ter criado a Mangueira e o formato dos desfiles de escolas de samba (paternidade que divide com Paulo da Portela), influenciou o comportamento de várias gerações de músicos e ainda integrou samba e asfalto, ao abrir, nos anos 60, o restaurante ZiCartola, onde a classe média carioca (e brasileira) ia ouvir a música dos morros. Faltava mesmo alguém contar essa história.

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