Morre Adelino Moreira, o poeta da dor-de-cotovelo

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Por Agencia Estado
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O compositor Adelino Moreira morreu na madrugada de hoje, em casa, no Rio. Teve um enfarte enquanto dormia, segundo um amigo da família. Estava com 84 anos e morava em Campo Grande, na zona oeste carioca, com a segunda mulher, Arzina. O enterro está marcado para as 16h30 de hoje, no cemitério do bairro. Adelino foi o autor de alguns dos maiores êxitos da música de dor-de-cotovelo: Negue, Fica Comigo Esta Noite, A Volta do Boêmio - todas lançadas por Nelson Gonçalves. Durante um tempo, nos anos 50, tornou-se o compositor favorito de Ângela Maria, para quem escreveu, entre outros números, a balada Cinderela - de gosto duvidoso, foi um dos maiores sucessos da cantora. Nascido no Porto, em Portugal, em 28 de março de 1918, Adelino Moreira de Castro era filho de joalheiro. A família veio para o Brasil em 1919 e fixou-se no subúrbio carioca de Campo Grande. Adelino abandonou os estudos no segundo grau e foi trabalhar com o pai, que adorava música. Não foi bom joalheiro. Tornou-se compositor. Começou, em 1938 (já casado com a primeira mulher, Maria da Conceição, com quem viveria até 1951), tocando bandolim, que trocou, em seguida, pela guitarra portuguesa. A joalheria do pai patrocinava o programa Seleções Portuguesas, da Rádio Clube do Brasil, onde Adelino começou a se apresentar - como cantor. Foi Braguinha quem o lançou para o sucesso. Dirigia a gravadora Continental e, em 1945, convidou Adelino para gravar, como autor e intérprete. As primeiras gravações foram dois fados (Olhos d´Alma e Anita), um samba (Mulato Artilheiro) e uma marcha (Nem Cachopa, nem Comida). Em 1948, Adelino foi tentar a sorte como artista em Portugal. Gravou discos, por lá, e participou, como cantor, de teatro musical. Voltou ao Brasil dois anos depois e, em 1951, lançou a marcha Parafuso, parceria com Zé da Zilda e Zilda do Zé, sucesso nas vozes da dupla. A sorte viria, mesmo, no ano seguinte, quando foi apresentado ao novato Nelson Gonçalves, a quem mostrou a composição Última Seresta, uma parceria com Sebastião Santana. Daí em diante, Nelson seria, além de amigo íntimo, por muito tempo, seu principal intérprete. Nelson gravou, em 1955, Meu Vício É Você, e, no ano seguinte, A Volta do Boêmio; outros sucessos deles foram os boleros Escultura (1958) e Êxtase (1959), além do bolero Fica Comigo Esta Noite (1961). No anos 60, o tipo de música chorosa, dramática, feita por Adelino, foi jogada para escanteio - a bossa nova, com seu coloquial econômico e visão de mundo pertinente à zona sul do Rio, pôs no ostracismo os autores de boleros e sambas-canções. Alguns desses autores foram, com o tempo, reabilitados - é o caso do gaúcho Lupicínio Rodrigues. Adelino continuou sendo "o cafona" - mesmo gravado por alguns dos nomes mais importantes da música brasileira, a começar por Maria Bethânia, que, nos anos 70, deu ao samba-canção Negue a versão definitiva e insuperável - a música foi também gravada pelo grupo Camisa de Vênus, em 1986, e por Ney Matogrosso e Raphael Rabello, 1991. Ângela Rô Rô gravou, em 1980, Fica Comigo Esta Noite, bolero que deu título ao disco da cantora Simone em 2000. As irmãs Tetê e Alzira Espíndola regravaram, em 1998, Garota Solitária. Sim, e Tom Jobim, com Miúcha, Chico Buarque, Cristina Buarque e turma gravaram, no disco Tom e Miúcha, a engraçadíssima marcha Turma do Funil - poucos associam aqueles versos gaiatos ("Chegou a turma do funil/ Todo mundo bebe, mas ninguém dorme no ponto/Nós é que bebemos/ E eles que ficam tontos") ao autor compositor de boleros sofridos. Autor de cerca de 200 músicas, Adelino teve gestão longa e controvertida à frente da sociedade arrecadadora de direitos autorais Sbacem, cargo que manteve até há pouco tempo. Brigou com Nelson Gonçalves, lançou um imitador dele - Carlos Nobre - e abriu, nos anos 70, uma churrascaria, em Campo Grande, refez a amizade. Nunca foi reconhecido como grande compositor. Mas foi um dos grandes autores da MPB.

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