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Moacir Santos volta ao Brasil para gravar CD

Por Agencia Estado
Atualização:

O maestro e saxofonista Moacir Santos está voltando ao Brasil, depois de passar mais de 30 anos nos Estados Unidos. Ele está aqui desde a semana passada e nunca deixou de passar férias no País. Só que, desta vez, veio para gravar e lançar um álbum com dois CDs, reunindo 28 músicas suas, tocadas por uma constelação de instrumentistas brasileiros e cantadas por Ed Motta, Joyce, João Donato, João Bosco e Djavan. É o resgate de um artista cujo nome geralmente não é associado às suas composições. E também preenche uma lacuna porque Moacir Santos gravou apenas seis discos, em mais de 60 anos de carreira nenhum deles reeditado. O próprio Moacir vai tocar pouco nos discos porque, aos 75 anos, perdeu parte de sua habilidade motora por causa de um acidente vasocerebral sofrido há cinco anos. "Ele preferiu deixar de se apresentar em público enquanto ainda era muito solicitado. É bom para o artista deixar saudade", explica sua mulher, Cleonice, companheira de mais de 50 anos, que veio com ele da Paraíba, no fim dos anos 40, quando um desentendimento com a direção da Rádio Tabajara, de João Pessoa, o fez vir tentar a sorte no Rio. "Ele enxerga mais adiante e, se um dedo não obedece a uma ordem sua, compensa com a outra mão." Moacir, reverenciado por Baden Powell e Vinícius de Morais no Samba da Bênção, é um caso de talento precoce e perene. Ele não se lembra de quando começou o interesse musical. "Quando me entendi como gente já fazia música, e ganhei meu primeiro cachê entre os 9 e 10 anos de idade. Foram 30 mil réis, uma fortuna, para a época", conta. "Ao chegar ao Rio, em 1949, toquei no Dancing Brasil e, um mês depois, era contratado da Rádio Nacional, o que significava, na época, o ápice da carreira de um músico." Ele acompanha as gravações para cuidar que tudo soe exatamente como compôs e, nos intervalos, conta como se radicou nos Estados Unidos, tendo gravado ou tocando com os grandes músicos de jazz (só Nanã, seu maior hit, tem mais de 150 versões). Seu discurso, como a música, não é direto, segue em espiral, cercando o assunto principal de preciosas metáforas. "Fiz a trilha sonora para um filme americano, executada por 65 músicos, uma autêntica sinfônica. O Itamaraty entendeu que eu deveria ir, me deu a passagem e, quando cheguei, vi que tinha espaço para mim, pelo grau de desenvolvimento que minha música tinha alcançado", lembra. "Chamei minha mulher e fiquei, porque encontrei em Passadena um paraíso, um inspirador, silencioso." Agora, Moacir e Cleonice querem voltar ao Brasil. "O tempo que eu devia ficar lá terminou e quero me equilibrar entre as duas Américas", diz o músico, que sabe de seu valor, mas não tem ilusões quanto a seu público brasileiro. "Tenho impressão de que sou muito conhecido aqui, mas não sou um artista popular como Roberto Carlos. As pessoas que me ouvem, lá como cá, são escassas. São especiais, como minha música." O álbum duplo pode aumentar esse público, pois será lançado em grande estilo, com show no Rio e distribuição pela gravadora Universal. O projeto é dos músicos Mário Adnet e Zé Nogueira, que obtiveram R$ 430 mil da Petrobras, usando a Lei Rouanet. A produtora Marisa Adnet decidiu que Moacir não deve ser fotografado com o saxofone barítono, porque já não toca mais. Diante da impossibilidade de tocar, Moacir passou seu instrumento a Vittor Santos. Marisa define também como ele superou a falta de seu saxofone, instrumento para o qual criou uma linguagem. "Moacir é um artista tão completo que superou a falta do sax tocando outros instrumentos, escrevendo arranjos, compondo e até cantando. Nesse disco, ele divide a faixa Bodas de Prata Dourada com a cantora Muisa Adnet e sola April Child", adianta Marisa. O próprio Santos dá outra versão. "Como a idade não me permite mais essas façanhas, eu vejo, em outros músicos, a continuação do que comecei", teoriza. "Tive uma enorme alegria quando encontrei o Ivan Lins e disse que havia adorado seu disco. Ele me abraçou e disse que aprendeu tudo comigo e com o Tom Jobim. Então, vejo-o tocando a música que não posso mais fazer; é como se fosse minha." O álbum duplo faz parte dessa herança. "Representa, sobretudo, a colheita dos frutos que plantei desde quando cheguei ao Rio, há 52 anos", diz Moacir. "E tem a vantagem de chegar a tempo", completa Cleonice. "Eu sempre digo que, se querem homenageá-lo, aproveitem enquanto o Moacir está vivo, porque depois não interessa virar nome de rua, show em memória, até porque ele já recebeu muitas honras em vida. Até o governo brasileiro reconheceu sua importância e fez dele comendador."

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