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Michael Jackson, imensa capacidade de inovar

Autodenominado rei do pop foi o artista da música mais importante em (e para) mais de uma geração

Por Lauro Lisboa Garcia
Atualização:

O autodenominado "rei do pop" foi o artista da música mais importante em (e para) mais de uma geração. Nos últimos anos tornou-se uma pálida e triste paródia de si mesmo, figurando no noticiário mais por atitudes excêntricas do que pela música genial que fez, principalmente na virada dos anos 1970 para os 80, e durante essa década, quando lançou os álbuns fundamentais Off the Wall e Thriller. Foi nesse período que se tornou com Madonna e Prince o trinômio de maior poder do pop dos EUA. Mas Michael era maior do que os dois, a quem influenciou, como a toda uma leva de astros.

 

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Michael foi além de compor (na idade adulta) e cantar, o que fazia muito bem desde criança. Foi inovador não apenas na música - fundindo soul, funk, pop e rock -, mas no uso da imagem. O antológico filme Thriller é um marco revolucionário da era do videoclipe, em que unia música, dança e cinema com maestria. A influência de Michael sobre o mundo pop (branco, negro ou seja lá de que cor) é imensurável, como a de Elvis Presley para o rock, como a de Louis Armstrong para o jazz talvez. Todo menino que testemunhou seu auge, músico ou não, sonhou ser como ele.

 

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Ele próprio quando garoto já impressionava com seu incrível alcance vocal, dentro e fora do grupo que formou com os irmãos, o Jackson 5, em meados da década de 1960 e 70. ABC, I Want You Back, Going Back to Indiana e Never Can Say Goodbye estão entre seus melhores momentos dançantes da época, além de baladas como I'll Be There.

  

Em paralela carreira-solo, Michael emplacou Rockin' Robin e baladas melosas como Ben, Music and Me, Go to Be There, One Day in Your Life, mas também canções mais densas, como Ain't no Sunshine e I Wanna Be Where You Are. Todas essas gravações estão na compilação da série The Motown Years, lançada no Brasil, para celebrar os 50 anos da gravadora onde Michael e tantos ícones da soul music começaram.

 

Thriller (1982), produzido por Quincy Jones, é sua maior referência, álbum que parece compilação de sucessos. Mas seu grande salto qualitativo foi o álbum anterior, Off the Wall (de 1979), que acabou de certa forma ofuscado pelo sucessor. Ali, em seu primeiro álbum "adulto", Michael já deu indícios de sua capacidade inovadora. Puxado por canções poderosamente dançantes como Rock With You e Don’t Stop ’Till Get Enough, o disco bateu recorde de vendas no setor de música negra, até ser superado pelo próprio Michael, com Thriller, que transcendeu todos os parâmetros de alcance da música popular, branca ou negra, americana ou interplanetária.

 

O clipe de Thriller tinha 14 minutos de duração e custou US$ 600 mil, considerado de alto custo para a época. Uma das canções de maior sucesso do álbum, Beat It, era um libelo contra a violência urbana. Billie Jean foi baseada num episódio envolvendo o próprio cantor, acusado por uma fã de ser pai de um filho que não seria dele. The Girl Is Mine, parceria com Paul McCartney, foi outro dos trunfos de um disco que contou com o que havia de melhor em produção nos EUA naquele momento.

 

A saúde musical de Michael foi se debilitando à proporção de seu delicado quadro físico. Em 1987 ele lançou Bad, que ainda tinha boas canções, mas sem a repercussão dos trabalhos anteriores. Tanto a canção como o clipe pareciam forçados. Michael se via na defensiva, diante de tantas especulações sobre sua vida pessoal.

 

Talvez o último suspiro criativo de Michael tenha sido Black or White, no álbum Dangerous (1991). Se musicalmente ele já não era tão original, sensibilizou o mundo e mais uma vez inovou utilizando recursos visuais inéditos para o videoclipe de Black or White, fundindo imagens de pessoas anônimas de várias etnias, como uma espécie de manifesto antirracista. As tentativas de reanimá-lo musicalmente nesta década foram infrutíferas. Michael, que ditou moda e comportamento, ficou para trás.

 

Em 2007, quando se comemorou os 25 anos de Thriller, recordista de venda no mundo, com cerca de 105 milhões de exemplares, uma edição especial foi lançada mundialmente com clássicos como Beat It e Billie Jean remixados em faixas extras, com participação dos ídolos da música negra de hoje. O título de seu último álbum, Invincible (2001) soou como uma triste ironia desse Peter Pan do pop. Com excesso de baladas repetitivas, o álbum não justificou o absurdo custo de produção alardeado pela Sony - cerca de US$ 20 milhões. Com apenas uma canção divulgada de maneira tímida nas rádios, You Rock My World, o álbum foi o maior encalhe de sua carreira, um fracasso fenomenal.

 

Mas não é por isso que Michael deve ser lembrado. Pelas obras geniais que deixou, pela influência que exerceu sobre o mundo esquizofrênico da música pop, sobre a moda, e, para o bem ou para o mal, sobre a negritude e o comportamento sexual, merece sim o reconhecimento, um mito com todos os predicados. Todo grande artista tem algo de louco, de excepcional mesmo. Se não, não faz diferença. Michael perdeu o trono há muito, mas não foi rei por acaso.

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