Mesmo desencantado com o mercado, Ivan Lins, aos 70 anos, acumula projetos

Para 2015 e 2016, dez iniciativas suas ou em sua homenagem estão previstas: de CDs a uma biografia e um documentário

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Por Roberta Pennafort
Atualização:

RIO - Ivan Lins fez 50 anos de música, 45 de carreira, 40 de parceria com o letrista dileto, Vitor Martins, e, em junho, completa 70 de idade. Diz que não é dado a festas, menos ainda a arroubos saudosistas, mas para 2015 e 2016 dez projetos seus ou em sua homenagem estão previstos na esteira das datas comemorativas: de CDs a uma biografia e um documentário. 

“Já comemorei 10 anos de carreira, 20, mas eu era mais jovem. Vou levando a vida, fazendo música, e aceito esse abraço que querem me dar, me faz bem”, agradece o compositor, suave como sua poética, sentado junto ao piano no escritório musical de sua casa - onde se senta cada vez menos para compor. 

Ivan Lins é um dos destaques da programação deste ano. Foto: WILTON JUNIOR/ESTADÃO

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“Com a idade, vai dando preguiça mesmo. Quando mando música, o Vitor demora mais a responder também. Há um desânimo com o mercado, você faz um trabalho e sabe que ele não chega mais ao público. Sou um privilegiado por ter aparecido num momento em que a mídia tinha espaço para a música de qualidade. Eu poderia gravar 20 CDs por ano. Mas para quê? Se você vende pela internet, ganha uma mariola e uma cocada. Para pagar as contas, é preciso fazer shows e, felizmente, meus shows são muito cheios até hoje”, diz Ivan, que já vendeu mais discos do que Roberto Carlos. 

“Isso foi em 1971 (o LP ‘Agora’, do sucesso ‘Madalena’, com o primeiro parceiro, Ronaldo Monteiro de Souza). Fiquei três semanas na frente, isso posso dizer! Hoje, eu entro no jogo do mercado. Lanço um disco e não espero nada”, ele afirma, sem demonstrar nenhum ressentimento. 

Nome internacional há mais de 30 anos, gravado por Sarah Vaughan, Ella Fitzgerald e, mais recentemente, Jane Monheit, ele se apresenta cada vez menos no exterior: “No mercado internacional, a música também vai ladeira abaixo”.

América, Brasil, CD com músicas suas e de Vitor pouco ou nada conhecidas, é o primeiro projeto a se concretizar da “leva comemorativa”. Nasceu de um documentário sobre canções no feminino, como Começar de Novo, Bilhete e Mudança dos Ventos. Com depoimentos de intérpretes (Nana Caymmi, Zizi Possi, Fafá de Belém), o filme acabou motivando uma pesquisa em sua trajetória, da qual saíram 12 faixas que nunca deixaram a categoria “lado B” - uma, Luxo do Lixo, de 1981, feita para um bloco de carnaval que nunca saiu, jamais havia sido gravada. 

O cantor e compositor, Ivan Lins, durante entrevista para o Estado de S. Paulo, em seu apartamento no bairro da Lagoa, na zona sul do Rio de Janeiro Foto: WILTON JUNIOR/ESTADÃO

A obra de Ivan ganhou tributos recentes de Leny Andrade, do jovem cantor João Senise, filho do flautista Mauro Senise, e terá um novo, do trio vocal Folia de Três. No ano que vem, devem sair um CD com arranjos sinfônicos - “vai soar como Gershwin ou um Ravel moderno” - e uma biografia não cronológica escrita pela pianista Thais Nicodemo, com momentos de enlevo da carreira. Fã desde a infância, Thais pesquisou as pontes da música de Ivan - autodidata desde os 18 anos - com a canção portuguesa e o jazz. Ela levou o acervo dele (discos, fotos, manuscritos), para a Unicamp, para que fique aberto a consultas. 

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Também está sendo gestado um CD só com músicas caipiras, letradas pelo paulistano Rafael Altério, compadre de Ivan - “é o gênero que mais me emociona e mais gosto de fazer”, surpreende -, e também uma coleção de fados seus, cantados por nomes em ascensão na música portuguesa, como António Zambujo e Carminho. 

Antes, Ivan entrega trilha para espetáculo da Companhia de Ballet de Niterói, que terá como norte Joana dos Barcos, composta para peça que não chegou aos palcos, e toca na abertura do Rock in Rio, que lembrará os 30 anos da primeira edição, da qual participou. E faz shows com Toquinho, parceria que surgiu ao acaso, de aparições eventuais de um em apresentações do outro. “Temos o mesmo público”, acredita Ivan. Eles também pensam em compor juntos.

Para além das quase 500 músicas já gravadas, duas dúzias de clássicos, em seu “cofre de pérolas”, caixa com melodias não letradas, moram guardados de até 40 anos. Em gavetas do escritório, versos inéditos de Vitor e de parceiros laterais como Sergio Ricardo, Zélia Duncan, Nelson Motta, Fausto Nilo e Gonzaguinha. Material que, um dia, pode vir a parar em CDs.

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