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Melodia recria seu disco de estréia na íntegra na Virada Cultural

O cantor e compositor tocas as canções de 'Pérola Negra' neste sábado

Por Lauro Lisboa Garcia
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Há 35 anos, descendo o Morro de São Carlos, no bairro carioca do Estácio, Luiz Melodia lançava seu primeiro álbum, 'Pérola Negra', provocando espanto pela originalidade das misturas rítmicas, pelos versos poéticos com requintes de nonsense - e com a elegância natural que transparece até hoje na voz sedosa. Naquele ambiente pós-tropicalista, público e crítica ainda mantinham as referências estereotipadas do negro sambista. Melodia, que recria seu disco de estréia na íntegra neste sábado, 25, na Virada Cultural, chegou para contrariar. Mas esse, digamos, "distanciamento" do samba, não foi determinante para ele se estabelecer. Diversidade, segundo ele, é a característica que melhor identifica seu trabalho, desde o início até hoje.   Veja também: Ouça 'Estácio Holly Estácio   "Meu pai era compositor, que fazia marchinhas e até boleros, não só samba. E isso juntava com meu gosto musical. Eu ouvia muito rádio - música nordestina, jovem guarda, boleros - e também ia para a escola de samba. Então toda essa variedade de sons veio a me influenciar", diz o cantor e compositor, que no final dos anos 60 integrou uma banda de iê-iê-iê. Essa diversidade é nítida em 'Pérola Negra', que começa com o choro 'Estácio, Eu e Você', em que ele é acompanhado pelo Regional de Canhoto (a flauta é de Altamiro Carrilho), e já na segunda faixa, 'Vale Quanto Pesa', funde pop, marcha e mambo. Tem rock adiante ('Pra Aquietar'), balada ('Magrelinha'), blues ('Abundamentemente Morte'), samba-canção ('Estácio, Holly Estácio'), rhythm and blues ('Objeto H') e termina com o 'Forró de Janeiro'.     Revisando o disco hoje, Melodia diz que ele tem "uma quantidade de situações" - canções que viraram clássicos nas vozes de Gal Costa e Maria Bethânia, o fato de ser o primeiro, e por figurar sempre nas listas dos melhores dos anos 70 - que o fazem considerá-lo "da maior importância". "Fico feliz pelos elogios ao disco, que tem arranjos maravilhosos de Perinho Albuquerque, mas aquilo foi de uma época. É um disco que está do lado esquerdo do meu peito, mas acho que não dá para considerá-lo o mais importante. Depois fiz discos como 'Maravilhas Contemporâneas' (1976) e 'Mico de Circo' (1978), de que gosto muito, têm uma sofisticação maior."     Na falta de parâmetros para classificá-lo, Melodia logo foi assentado no nicho dos "malditos", ao lado de Sérgio Sampaio, Jards Macalé, Jorge Mautner, porque não fazia música dita comercial. E olhe que ele foi revelado por duas divas em absoluta ascensão na época: Gal e Bethânia. Amigo de Waly Salomão, que dirigiu o histórico show Fa-Tal, Gal a Todo Vapor, foi ele quem levou a canção 'Pérola Negra' para a cantora incluir no roteiro. A gravação saiu no LP lançado em 1971. No ano seguinte, foi a vez de Bethânia incluir 'Estácio, Holly Estácio' no álbum 'Drama', um dos marcos daquele período. Gal voltaria a gravá-lo ('Presente Cotidiano') no disco 'Índia' (1973). Foi o aval que Melodia precisava para a gravadora (Philips, hoje Universal) investir no jovem de 22 anos e produzir seu primeiro LP em 1973.     Com exceção de 'Pra Aquietar' (dedicada à Ilha de Paquetá), as demais canções do álbum (todas dele) foram inspiradas pela namorada, de apelido Deda. Por sugestão de Salomão, 'Pérola Negra' também acabou se tornando uma homenagem a um certo Aluísio, homossexual que usava esse codinome. Diversas letras, entre elas 'Farrapo Humano' ("Viro um farrapo, tento o suicídio/ Com caco de telha/ Ou caco de vidro") e 'Abundantemente Morte' ("Um morto mais vivo/ De vida privada"), foram censuradas, algumas depois liberadas.     No show deste sábado, 25, às 18 horas no Teatro Municipal, além das dez faixas do disco, Melodia vai interpretar três canções dos mais recentes, como o ótimo 'Estação Melodia' ('Contrastes', de Ismael Silva, e 'Dama Ideal', de Alcebíades Nogueira e Arnaldo Passos) e 'Luiz Melodia Convida' ('Cuidando de Você', parceria dele com o fiel Renato Piau). Tocando guitarra, Piau está no quarteto que acompanha Melodia amanhã, ao lado de Renato Fonseca (piano), André Vasconcelos (baixo) e Alan (bateria).   "Os arranjosque Perinho Albuquerque fez para o disco são excelentes, mas não tenho como reproduzir aquele som no palco, hoje", diz Melodia. "Precisaria de uma banda grande, com sopros e todo um aparato, não tenho como bancar isso. Vou fazer o possível para chegar o mais próximo." O show faz parte do projeto de "discos antológicos" que a Virada Cultural experimentou no ano passado e repete neste.

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