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Marina Lima, de volta com sede de palco

Depois de seis anos, cantora retorna ao circuito com a turnê de Síssi na Sua, que chega nesta quinta a São Paulo

Por Agencia Estado
Atualização:

Em seis anos, muita coisa aconteceu na música brasileira. Mas não na música de Marina Lima, que simplesmente andou hibernando nos últimos seis anos, atingida por um mal invisível, mas letal. A cantora entrou numa espiral depressiva que a fez perder até o instrumento de trabalho, a voz. Livre do problema, Marina voltou com sede de palco. Ela estréia nesta quinta-feira, às 21 horas, uma temporada de duas semanas no DirecTV Music Hall do show Síssi na Sua, que será gravado no próximo fim de semana e gerará um disco ao vivo a ser lançado pela Universal Music. "Vejo o show um pouco como uma celebração, como se estivesse dividindo com o público algo do que estou sentindo agora", contou Marina, em entrevista na tarde de terça-feira, num hotel no centro da cidade. O show Síssi na Sua já passou por Juiz de Fora e Belo Horizonte (MG), Florianópolis, Curitiba, Porto Alegre, Brasília e Goiânia. "Sempre chego a São Paulo e ao Rio com o show já afinado", ela diz. "Os lugares que mais freqüento são Rio e São Paulo, onde eu habito, freqüento, onde sei os códigos, sinais, onde estão meus amigos - é como tocar em casa", afirma. AE - Em seis anos, muita coisa aconteceu. Surgiu uma nova leva de cantoras de trip hop, por exemplo, como Skye Edwards, do Morcheeba, e Beth Gibbons, do Portishead. Marina Lima - Eu gosto muito de Morcheeba, do Portishead ("Give me a reason to love you/Give a reason to be a woman", ela cantarola). Quando surge uma coisa nova, as pessoas começam com uma noção mais rasgada, menos depurada. Começam a cantar a essência das coisas que estão criando e isso é sempre muito bom, porque é como se você estivesse vendo, ouvindo as tripas de cada canção, de cada cantor. É tudo muito sentido: você aposta na emoção, numa verdade absoluta. Eu acho que, do jeito que está o mundo, quando surge uma cantora nova, é tanto truque, tanto trejeito, tanta mania, que você enjoa daquilo. Parece que a pessoa não aposta na alma, mas em tanta proteção que cansa um pouco. Mas eu acho o trip hop um pouco depressivo. Você não gosta de canções depressivas? Num disco de 12 músicas, acho legal ter três, quatro músicas assim. Mas se o disco todo for assim, melancólico acho que é um problema. Acho que aquele disco que eu fiz, Registros à Meia-Voz, eu não gosto dele, porque acho muito melancólico. Eu acho que, tudo bem, eu não tenho compromisso com a alegria, esse compromisso que o pessoal do axé tem, nem quero, mas eu acho que na minha vida tem de ter alegria, porque senão é muito difícil fazer os outros acreditarem no que você está cantando, se o que você canta, o que você vende é uma coisa toda que sugere que não há saída. Eu não gosto disso. Eu posso eventualmente fazer uma ou duas músicas assim, mas é porque eu estou muito agoniada com o assunto. Se o disco inteiro ficar assim, acho que eu não gosto, tenho de me tratar, descobrir onde está o problema - talvez ele esteja comigo, não com as coisas ao redor. Viajei pelo Brasil todo, o País está totalmente achatado economicamente, a classe média acabou. Sinto isso no Brasil afora. Por que consegue sobreviver, ao menos culturalmente? Porque a gente é um povo muito forte, muito otimista, inventivo. E na invenção há uma certa alegria, onde há invenção há alegria. E eu tenho isso também, se eu deixo isso me dominar, depois eu mesma não me agüento. Imagine os outros, que não têm nada com isso? Você geralmente toma muito cuidado com seus shows, são sempre muito caprichados do ponto de vista cênico. Mas dessa vez você foi ainda mais longe, trouxe um diretor de teatro, Enrique Diaz, para dirigir o show. O jogo com o Enrique é o seguinte: o tempo em que eu fiquei sem fazer show, sem cantar, eu ia muito ao teatro. Fiquei meio enjoada de música, meio brigada com a música. Vi pouquíssimos shows, como o da Björk. E ia muito ao teatro. O que me encantava era como as pessoas do teatro usavam melhor o espaço cênico do que nós na música. Os músicos parece que têm algumas regras sobre o uso do espaço do palco. Um concerto, a banda, tudo meio formal. E o pessoal de teatro é mais louco, brinca com o espaço. E eu gosto disso. Gosto do que instiga. E eu vi dois espetáculos dele em que a encenação era muito boa. Adorei Melodrama, adorei Tristão e Isolda. Queria que você visse a banda, o repertório, e propusesse climas cênicos e até brincadeiras. E foi isso que a gente fez. Música, naturalmente, não precisa ter coisa demais. Mas a linguagem visual é mais teatral. E a sua banda? Não conheço quase ninguém. Quem são eles? São cinco músicos absurdos. Nosso show, nosso som é muito potente, não é um som cheio de camadas, com violinos, violas. É outra concepção, mais ligada ao eletrônico, algo em que estou muito ligada agora. Tem coisas acústicas também, mas quando tem eletrônico, é para botar para quebrar. O Edu (Martins baixista e tecladista) foi meu professor de linguagem e mídia, a relação de sintetizador com computador. Aqueles teclados, que não são pianos, que têm sons de bateria, baixo, piano, prato - aqueles teclados são sintetizadores. Por meio de programas, eles se comunicam com o computador e você pode montar um estúdio em casa. Eu fiz o curso para poder montar um na minha casa. O Edu me foi apresentado pelo João Marcelo Bôscoli. Depois gravei o disco Pierrot do Brasil, já com eletrônica. O Edu me apresentou o Cuca Teixeira, o baterista. O William Magalhães é um dos maiores tecladistas do Brasil. Eu não consigo ficar sem ele, pelo menos por enquanto não sei, ele é imprescindível. O Gustavo (Corsi) era um guitarrista que já estava no show e toca muito bem e toca bem no meu estilo. Porque tem gente que é muito versátil, sabe muita coisa, mas não sabe muito uma única coisa. O tipo de som que eu quero ouvir ele faz. E o Giovanni Bizzotto era meu professor de violão. Eu o conheço há uns sete anos. Ele toca violão e faz vocais comigo. É uma banda pequena, sintética, de som potente. Esse conceito musical vai ao encontro de que área da música eletrônica? Você gosta de drum´n´bass, de jungle, de trip-hop? Eu gosto de todo tipo de música. Mas, nesse momento, por ter aprendido a mexer com o computador, eu gosto daquele tipo de música que as pessoas chamam de bate-estaca. Música eletrônica, techno mesmo, às vezes não tem nem cantor. Gosto desse negócio de baixo e bateria. Isso para ouvir. Para fazer, como eu componho canções, eu não faço tanto temas para dançar, porque eu sou uma compositora de música popular. Embora eu ache que o technão faça parte disso hoje em dia, eu sinto falta de música, de melodia - e ainda assim cada vez menos. Eu estou compondo cada vez de modo mais diferente, tento explorar outras linguagens que quero dominar. O que eu gosto de música eletrônica é que ela é vazia. Eu fiz um disco chamado Abrigo como intérprete, que era interessante, com muitos arranjos de cordas. Aquilo é muito difícil. É difícil de mixar, qualquer erro parece que aquilo vai para o brejo, fica muito cheio. Música eletrônica tem algo muito visceral, que bate com o estado de espírito no qual eu me encontro e, ao mesmo tempo, por ser mais vazia, você trabalha muito com freqüência, graves, agudos, coisas para estarem lá como se nem estivessem e menos ordenada. Tem muito ruído. Não é tão arranjada. É mais louco, você arrisca mais, tem mais barulho. Nesse momento, é uma linguagem mais revolucionária, na qual tudo ainda pode mudar. Nos shows de música eletrônica do Free Jazz, por exemplo, por que o cara quando vai fica em frente da caixa de som? Por causa do grave, porque aquilo causa um efeito, você pode enlouquecer com aquilo, é quase um choque. A música eletrônica abriu esse campo sensorial. Marina Lima - Quinta-feira, às 21h30; sexta e sábado, às 22 h; e domingo, às 19 h. De R$ 40 a R$ 100. DirecTV Music Hall. Alameda dos Jamaris, 213, tel. 5643-2500.

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