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Manu Chao mistura línguas em novo CD

...próxima estación... Esperanza tem canções, uma em francês, uma em português, uma em árabe, duas em inglês, 9 em espanhol e 2 em portunhol. "Uma mistura de português e espanhol, inventada por pessoas que vivem em zonas fronteiriças - meus lugares favoritos", diz ele

Por Agencia Estado
Atualização:

Esse disco está cheio de pedaços que escaparam de Clandestino, avisa Manu Chao. O músico franco-espanhol fala de ...próxima estación... Esperanza (Virgin Records), seu segundo trabalho. Manu fala sério: é como se fosse uma coisa grudada na outra, um disco que prossegue sua farra musical como se fosse uma sucessão de barulhos de feirantes - diferentes entre si, mas todos entrelaçados organicamente. São 17 canções, uma em francês, uma em português, uma em árabe, duas em inglês, 9 em espanhol e 2 em portunhol. "Uma mistura de português e espanhol, inventada por pessoas que vivem em zonas fronteiriças - meus lugares favoritos", diz Manu Chao. Não há espaço entre uma e outra música, e a sonoplastia primitiva de Chao permeia todo o trabalho, com vozes infantis, locuções radiofônicas, idiomas toscamente falados. O lado musical também é um frankenstein sonoro, começando com o reggae (o ritmo mais caro a Manu), passando pela música räi árabe, o jazz, o ska, o flamenco, a música popular brasileira. O primeiro disco de Manu Chao, Clandestino, foi um sucesso fantástico (1998). Vendeu 1 milhão de cópias só na França e outro milhão de cópias ao redor do mundo. Manu tornou-se sucesso, mas já tem uma carreira de 20 anos, iniciada com o grupo Mano Negra. No Brasil, ele incendiou festas e bares e levou 4 mil pessoas ao Free Jazz Festival, no ano passado. Reafirmando sua mística de cigano desregrado, fez show em acampamentos de sem-terra, de graça, e depois acabou indo cantar no programa de Jô Soares, com seus músicos vestindo saiotes improvisados com as bandeiras do MST. Segundo ele, essas excursões à América do Sul foram determinantes para a concepção desse novo álbum. "Eu comecei a ter orgulho quando um músico de rua da Argentina me contou que algumas músicas de Clandestino haviam conquistado dinheiro suficiente para as refeições de um dia", lembra Manu. Claro, também tem uma mulata maravilhosa na parada, Valéria, filha de um capoeirista de Santa Tereza, que canta com Manu e é co-autora de uma faixa (Homens). "Homens, gosto de todos", ela diz. "Tem homem corno, homem baixo, homem gordo, homem ingrato, safado, careca, cabeludo, veado, ousado tem muito tem muito homem." Ela já tinha feito uma ponta no show que ele fez no Free Jazz, e é uma inspiração, sem dúvida. Manu Chao radicaliza a estética "no tengo calefaccion, can´t get no satisfación", uma mistura que está duas doses acima da world music. "Caixa de Guerra, guerra da paixón, portuñol connection, lixo atômico, piranha e jacaré, x-tudo e mac podrão." Usando o hit Bongo Bongo, de seu antigo grupo Mano Negra como uma espécie de mote básico, ele põe sua leitura do mundo a serviço da alegria. "La vaca de mala leche", diz ele, em Vaca Loca. E vai tecendo seu comentário zappatista do mundo, que é elástico, vai de Chiapas à Bastilha em um pulo, sem crise de consciência e ao mesmo tempo com extrema consciência. É uma política infantil que faz Manu, com o melhor que esse termo carrega, a inocência e a perspicácia simples e eficaz - como se fosse uma Mafalda de posse de uma máquina de samplear. Ao mesmo tempo que sofisticou alguns dos seus temas (como é o caso de Trapped by Love), ele também investiu mais fundo ainda no folclore dos altiplanos bolivianos (caso de Papito e La Chinita). Manu é um falso naïf, porque sabe o que faz, embora persiga justamente o efeito de fazer algo com o mínimo de arquitetura. "Eu encontrei um lugar em Barcelona, onde descanso as malas nos intervalos de minhas viagens", diz Manu Chao. "Eu tenho um quarto, um estúdio na sala, eu tenho uma praça vizinha e as ruas dos arredores - o mundo não fica muito longe e voltar para ele não é nenhum problema." Como um velho pirata, Manu Chao roda o mundo, passa por mares e portos. Mas, em vez de saquear a prata, carrega sua nau com sons e pequenas maluquices - um boletim de meteorologia aqui um mugido de vaca ali, um balido de ovelha acolá. Chamou ao disco de ... próxima estación: Esperanza por nenhum motivo de resignação, mas por ter, segundo diz, uma vontade de bater a cabeça na parede. "É por isso que ando por aí com minhas músicas que não são nem alegres nem tristes, mas alegres e tristes, como trens no meio do nada: sempre haverá outra estação e todos podem ter a esperança de subir ou descer onde quiserem."

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