Madeleine Peyroux lança seu terceiro CD

Dois terços das canções de "Half the Perfect World" são covers escolhidas a dedo, como "Everybody?s Talkin", de Fred Neil

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Por Agencia Estado
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Madeleine Peyroux não canta, ela toma posse das canções. Alguém disse isso uma vez, e não é possível achar nada mais exato. Há 10 anos, ela surgia para o mundo com um disco espantoso, "Dreamland", que a projetou - a contragosto - para os holofotes, a fama, o culto popular. Ela não é fresca, absolutamente. Só não concorda que a música deva necessariamente se tornar um fenômeno maciço para ser reconhecida. E olha que agora ela chegou a tocar até na novela das 8, o que era impensável inicialmente. Sério que deu até um certo medo de que ela se tornasse um daqueles fenômenos do "bom gosto" de classe média, que torna tudo sagrado, intocável, reveste as coisas de um ar yuppie. Mas ela prossegue com seu jeito sem pressa, sem concessões, sem deslumbramento. E chega agora ao terceiro álbum, "Half the Perfect World" (Universal Music). A canção que dá título ao disco é do bardo Leonard Cohen, um dos mestres a quem ela agradece nas notas do álbum, além de outros "loucos pensadores". Dedilhado acústico, costurado por um pianinho, maravilhosa. Há ainda uma outra de Cohen, "Blue Alert", talvez uma das mais bonitas no disco inteiro. Dois terços das canções são covers escolhidas a dedo, como "Everybody?s Talkin", de Fred Neil, celebrizada por Harry Nilsson (da trilha do magnífico filme "Perdidos na Noite", que a cada dia que passa fica melhor). "Todo mundo fala comigo/Não ouço uma palavra do que dizem, só os ecos em minha mente", diz a letra. Tem também "River", de Joni Mitchell, que Madeleine canta em dueto com outro monstro sagrado, a canadense k.d.lang. Poderia parar tudo por aqui e dizer que é um disco sensacional. Nada menos. Mas tem ainda Serge Gainsbourg ("La Javanaise"), Tom Waits (o blues "Looking for the Heart of Saturday Night"), Charles Chaplin ("Smile", do filme "Tempos Modernos"). De novo, ela toma posse das canções, da mesma forma que Tony Bennett ou João Gilberto. O mais surpreendente é que suas próprias composições (em parceria com seus músicos e o produtor Larry Klein), como "A Little Bit" e "Once a While", embalada pelo órgão e o som vibrante do piano Wurlitzer de Sam Yahel, Madeleine não faz feio no meio das canções consagradas. "Tudo que eu preciso é um pouquinho", canta, em "Little Bit". Tudo que a gente precisa é de um pouquinho de Madeleine, mas esse disco traz um tantão. Sobra prazer, sobra delícia.

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