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"Macbeth" celebra vida e música de Verdi

Versão que o compositor italiano fez do texto de Shakespearte estréia neste domingo no Municipal, com regência de Ira Levin

Por Agencia Estado
Atualização:

Estréia domingo, no Teatro Municipal, uma produção da ópera Macbeth, de Giuseppe Verdi. Segunda da temporada de assinaturas deste ano, a montagem é a primeira grande prova do novo diretor musical Ira Levin (contratado como grande especialista no repertório operístico) e chega à cidade após já ter sido apresentada na Ópera de Dorsett, na Inglaterra, e no Teatro da Paz, em Belém - exemplo de uma iniciativa rara no Brasil de intercâmbio de produções. Co-produzida pela São Paulo ImagemData, a montagem traz novidades com relação àquela apresentada em maio no festival de ópera da capital paraense. No elenco, a principal é a troca do protagonista, que aqui será o baixo-barítono finlandês Juhä Uusitano; além dele, o baixo carioca Luis Ottavio Faria, que interpreta Banquo. Nos papéis de Lady Macbeth e Macduff, mantém-se, respectivamente, a soprano americana Gail Gilmore e o tenor mineiro Eduardo Itaborahy. Paulo Queiroz será Malcolm. A direção cênica também mudou, foi entregue à atriz Cristina Mutarelli, que conta ter encontrado dificuldades para criar sobre uma montagem que já vinha pronta, com cenários e figurinos que não haviam sido pensados em conjunto com suas visões sobre a ópera baseada na peça de Shakespeare. "Eu tinha divergências com relação à antiga concepção e trabalhei no sentido de corrigir alguns elementos que me pareciam equivocados. Na minha opinião, Macbeth é uma ópera de pessoas cerebrais, estrategistas. Ele é o exército que serve à ambição de sua lady e é esta ambição que acredito estar no centro da ópera." Segundo o maestro Levin, Macbeth foi escolhida para a temporada por ser a "mais genial" do período pré-Rigoletto. "Com ela, Verdi dá um grande passo à frente em seu modo de compor, seja em termos da harmonia revolucionária na Itália da época ou mesmo na caracterização das personagens, característica que será tão marcante em sua obra. É uma ópera fascinante." E essa fascinação, segundo a conversa com os artistas envolvidos na produção, está intimamente ligada ao fato de que, composta em 1846, a ópera foi revisada 20 anos depois pelo compositor. Em outras palavras, há nela música composta por um autor no início de sua carreira, procurando alternativas à tradição italiana, e música deste mesmo autor já mais próximo das grandes revoluções de óperas como Otello e Falstaff. "É preciso reconhecer que Macbeth não é uma ópera que tenha unidade, mas, como também acontece com Tanhäuser, é daí que surge a fascinação pela obra, a chance de perceber a clara evolução do trabalho de Verdi ao longo dos anos", explica Levin. Gail Gilmore ressalta que, no entanto, algumas preocupações frequentes em Verdi se mantêm. Para ela, com exceção de Falstaff ("matemático demais"), as óperas de Verdi prezam as possibilidades vocais de modo bastante interessante. "A voz, a linha do canto, é sempre mais importante e isso dá ao intérprete um prazer enorme." Indagada sobre as dificuldades do papel de Lady Macbeth, que exige tanto a tessitura de soprano como a de meio-soprano, Gail diverte-se. "No fundo, acho que Verdi deve ter odiado, por alguns períodos de sua vida, todas as sopranos. Veja a Abigaile, por exemplo."Mas o papel de Abigaile, na ópera Nabucco, foi criado por sua futura mulher. "Exatamente." Sombra - O elenco faz questão de ressaltar a importância da interpretação cênica em Macbeth. "É a primeira ópera em que ele se joga de cabeça na composição dramática do espetáculo", afirma o maestro. Mas, tendo em vista a adaptação ("genial", segundo Gail) de Shakespeare, o que pensam os cantores sobre suas personagens? Para Eduardo Itaborahy - que faz sua estréia em ópera no Municipal -, trata-se de personagens "que não sofrem grandes mudanças ao longo da ópera, mas possuem características bastante fortes, que os definem e tornam complicada a sua interpretação". "Macbeth é, em essência, um fraco, vive satisfeito com a idéia de viver à sombra de Lady Macbeth, recebendo - e cumprindo - suas ordens", diz Juhä Uusitano. E completa: "Mas sua fraqueza tem algo de universal, mostra que na vida pode-se subir rapidamente mas que, da mesma forma, pode ser rápida a queda." Segundo Luis Otavio Faria, o mais importante é ter em mente que há sempre em Verdi "um componente de realidade". "Não importa qual o tema de sua ópera, há sempre a presença no palco de elementos da vida real." O que não está apenas no texto, segundo Uusitano, mas também na música. "Seu trabalho não é intelectualizado, é humano, permite um reconhecimento direto com o público." "É preciso lembrar, sempre, que para ser popular não é preciso ser prosaico", observa Gail. Itaborahy concorda: "Verdi dominava elementos que permitiam a todo seu público compreender suas mensagens por meio da linguagem musical." Uusitano acrescenta: "Ele foi um grande símbolo do poder de comunicação, criou obras difíceis de se executar, mas, quando bem-feitas, chegam ao público de modo simples. É o que faz dele uma das pedras fundamentais da história da ópera ao lado de Mozart, Wagner e Puccini." E Gail completa: "Não, não, Puccini, não." Tendo isto em vista, mesmo levando-se em conta certos descompassos apontados entre música e cena ("O rei está morto e a orquestra toca uma valsa; Lady Macbeth morre louca, mas, enfim pelo jeito ela já nasceu assim", diz Gail), a produção quer ser, no final das contas, uma celebração à personalidade e a música de Verdi. E Macbeth, com todas as suas contradições e idiossincrasias, é emblemática o suficiente para permitir isso. Serviço - Macbeth. Domingo, às 17 horas; terça, quinta, sábado e segunda (29), às 20h30. De R$ 15,00 a R$ 100,00. Teatro Municipal. Praça Ramos de Azevedo, s/n.º, (11) 222-8698.

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