PUBLICIDADE

Maazel comanda o vestibular da batuta

Em busca de alunos para a escola que está criando, o maestro americano passou o fim de semana em São Paulo testando três jovens regentes. Gostou do que viu, mas prefere continuar os testes ao redor do mundo antes de divulgar os seus preferidos

Por Agencia Estado
Atualização:

Maestros costumam parecer pessoas sisudas, mal humoradas e interessadas apenas em música clássica. Puro preconceito. Durante a etapa sul-americana do Maazel-Vilar Conductors Competition, que terminou ontem em São Paulo, o maestro norte-americano Lorin Maazel e os três regentes brasileiros que participaram do concurso jogaram por terra esta imagem. O significado deste concurso e a importância do maestro Maazel podem ser compreendidos com a seguinte comparação: é como se Mick Jagger estivesse viajando pelo mundo em busca de pupilos para treinar. Maazel já ouviu 40 candidatos a maestro para a escola que está criando e esteve em São Paulo para conhecer os talentos sul-americanos. Os brasileiros são Mateus Araújo, de 31 anos, Marcelo Ramos, de 29, e Rodrigo de Carvalho, 28. Maazel chegou ao Brasil na sexta-feira, primeiro dia de apresentação dos candidatos, de blusa de lã. Estava gripado, enfraquecido e com um pouco de febre. Apesar disso, apresentava bom humor. Quando o maestro americano entrou no Teatro Municipal, onde foram realizados os testes com os candidatos, o ar a sua volta parou. Os músicos da Orquestra Experimental de Repertório - que tocaram ontem sob a batuta de Maazel e estavam incumbidos de acompanhar os regentes - não conseguiam disfarçar a tensão. Maazel entrou no palco e os fez rir: "Não ajudem, mas também não atrapalhem os candidatos", orientou. Depois das primeiras apresentações dos candidatos - que foram testados por 20 minutos na sexta, no sábado e no domingo, com repertórios diferentes -, Maazel também parecia mais relaxado. "Fiquei impressionado com a qualidade dos músicos. Não imaginava que fossem tão bons", disse. Alívio para Jamil Maluf, criador e maestro da Orquestra Experimental de Repertório. "O elogio dele é uma vitória para a orquestra, que existe há 12 anos, e para nosso país, onde a arte não costuma ter continuidade." O spalla Davi Graton, solista no espetáculo de ontem, também respirou aliviado. "Fiquei muito nervoso ao ver o maestro porque ele é um grande violinista. Tenho vários discos dele." Já os regentes candidatos não conseguiram relaxar. A expectativa de poder estudar durante três anos com um dos melhores maestros do mundo, fazer contatos internacionais e ainda receber US$ 45 mil em prêmio era grande. O resultado dos testes só sai em agosto. Confira trechos da entrevista que Lorin Maazel deu ao JT na sexta-feira. Qual a impressão que o senhor teve neste primeiro dia de testes? Lorin Maazel - Acabei de chegar, mas minha primeira impressão é boa, principalmente em relação à orquestra, formada por gente jovem e talentosa. Eles tocaram muito bem o primeiro movimento de Stravinsky, que não é fácil e exige desafios individuais dos instrumentos. Estão realizando as peças com louvor, tocando muito bem. Mas a escolha dos regentes vai ser difícil porque há muita gente talentosa nos países em que estive. Fala-se que os regentes brasileiros sofrem com a falta de orquestras para treinar. Esta deficiência fica evidente? O mundo todo tem o mesmo problema: há mais maestros que orquestras. Talvez aqui seja um pouco pior, mas basicamente em todos os países há poucas escolas para maestros. Apesar de existirem bons maestros professores, as escolas são raras. A tradição prevê que as escolas dêem treinamento aos estudantes. Antes existia o terceiro regente, o segundo regente, o primeiro regente e o diretor musical. Havia tempo para aprender e errar. Hoje é preciso começar no topo no mundo, caso contrário ninguém irá levá-lo a sério. Isto é muito ruim porque você pula etapas. Este é o principal problema em todos os lugares. Esta falta de preparo atrapalha os novos regentes? Sim. Mas por outro lado há muitas pessoas mostrando que têm talento, embora não tenham tido esta experiência. Durante os testes vejo muitas trapalhadas, mas observo as inspirações, as tiradas geniais. É justamente isso que procuro. Então os erros não são eliminatórios? Não. É o insight, a percepção que pode fazer a diferença durante a regência. Não estou preocupado se o maestro comete erros, muitas coisas podem ser corrigidas. Mas é preciso encontrar este "clarão" mental . Esta competição é basicamente sobre isso: encontrar alguém iluminado. Isso definitivamente não é fácil de achar.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.