Lenine lança "Falange Canibal"

Lenine só canta em português e seu disco está saindo ao mesmo tempo em 30 países. Ele diz que continua compondo "para que Bráulio Tavares goste e Dudu Falcão fique feliz"

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Por Agencia Estado
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Encruzilhada de caminhos. Ponto de aglutinação. Essas são expressões que Lenine usa para explicar um movimento cultural - reunião pouco formal de gente ligada a música, teatro, poesia e outras manifestações artísticas - surgido no fim dos anos 80, no centro do Rio de Janeiro. Chamava-se, o movimento, o palco aberto, o espaço livre, Falange Canibal. Não havia ali restrições estilísticas (embora o olho atento dos participantes cuidasse da questão estética), mas a troca, o devoramento de informações, a promoção do casamento das novidades de cada um com as histórias individuais, o aceno do samba para o pop, o sorriso da guitarra pesada para a viola caipira. Falange Canibal é o nome do novo disco de Lenine, lançamento BMG, nas lojas a partir desta semana. Um título que remete ao time central daquelas reuniões cariocas - o próprio Lenine, seus parceiros Bráulio Tavares, Lula Queiroga, Ivan Santos, Dudu Falcão; somam-se Sérgio Natureza, Carlos Rennó, Paulo César Pinheiro. Estão aqui os autores de todas as músicas do novo CD. Mas a cozinha neo (ou pós)-antropofágica tempera-se com mais paladares, gente de correntes diversas da música popular brasileira e da música internacional preocupada em não soar como fast food sonoro - da Velha Guarda da Mangueira ao elenco da peça Cambaio (de Edu Lobo e Chico Buarque, de que Lenine fez direção musical), os franceses Claude Sicre e Ange B., dos Fabulous Troubadors (Lenine já tocou com eles muitas vezes no exterior e uma vez no Brasil, no Heineken Concerts), Alexander Cheparukin, do grupo russo-ucraniano Farlanders, gente do Living Color, o cubano Yerba Buena, o sanfoneiro Regis Gistavo, de Madagascar, o trombonista porto-riquenho Steve Turré, que no disco sopra conchas, cortadas manualmente para obter determinadas notas da escala - e assim por diante, muito. Falange Canibal foi gravado parte no Brasil, parte nos Estados Unidos, na segunda metade do ano passado. Era para sair em outubro. Lenine pediu adiamento. "Precisava deixar passar um tempo, terminadas as gravações, para ver se concordava com tudo o que estava gravado", conta. De fato: reouviu a primeira montagem do disco em janeiro, mudou alguma coisa, tirou uma faixa e outra e liberou o CD. Em obediência a um conceito, uma idéia pré-definida de como o disco deveria soar? "Não tenho conceito, nunca tive um conceito", diz o músico. "Nunca sei onde quero chegar, tenha perfeita consciência de onde não quero chegar", conta. "O que me estimula é olhar a oferta de novas ferramentas e incorporá-las, retrabalhá-las, sejam eletroeletrônicas, valvuladas, virtuais; a idéia de pegar isso e ver como usar, explorar as possibilidades." E como essas novidades (um novo grupo, um procedimento de estúdio, a nova combinação do que parecia esgotado, etc.) estão sempre surgindo, não há - Lenine garante - um "start", um momento em que o novo disco tem início (muito menos, naturalmente, um conceito pré-determinado. "É que estou sempre gravando", conta ele. "Tenho um baú de gravações e um baú de cacos, para aproveitar, para recombinar." Claro que isso é possível porque Lenine tem absoluto poder sobre cada disco seu. Ele o entrega à gravadora pronto, produzido, com capa feita e tudo. Seu poder cessa, porque ele abre mão, na hora em que a gravadora começa o processo de divulgação. "Se eles - a gravadora - pedem sugestão sobre a ´música de trabalho´ aquela que deve tocar no rádio, eu declino da responsabilidade de apontar. Seria como, depois de que eu desse banho e vestisse os meus filhos, alguém me perguntasse qual deles é o mais bonito. Eu não teria condições de dizer." O que move, então, esse compositor que se tornou uma das referências fundamentais da música popular a partir dos anos 90? "Eu continuo compondo para que o Bráulio Tavares goste, para o que o Dudu Falcão fique feliz", afirma Lenine. O que não faz sua música "internacional" - não naquele sentido do trabalho musical descaracterizado, voltado para um possível gosto mundial. "O conceito de world music foi um tiro no pé dado pela indústria. Existe o interesse na diferença" - Lenine só canta em português. Falange Canibal está saindo ao mesmo tempo em 30 países.

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