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João Bosco completa 60 anos e lança seu primeiro DVD

O DVD Obrigado, Gente! é o registro de show retrospectivo no Auditório Ibirapuera, em São Paulo

Por Agencia Estado
Atualização:

O cantor e compositor João Bosco completa 60 anos na quinta-feira e acaba de lançar seu primeiro DVD, Obrigado, Gente!, registro de show retrospectivo no Auditório Ibirapuera, em São Paulo. Foi coincidência, garante ele, que nunca ligou para datas redondas ou balanços de vida. "Essas datas são de mercado, como dia das mães, pais, namorados", disse, ao receber a reportagem em sua casa, na Gávea, bairro nobre cercado pela Favela da Rocinha. De lá, ele ouve funk e rap e gosta do ritmo: "Sem estar na pista, a gente sente falta de um pouco mais de harmonia, uma melodia interessante." Essa abertura para o novo marca sua carreira, que completa 35 anos em 2007. E ele parece ter acabado de entrar nos 50 de idade. O segredo? Ter planos. "Com projetos, você quer chegar ao futuro e realizá-los." Eis, um resumo da conversa. Como você selecionou o repertório e os convidados do seu show? Amigos com quem me encontro tocam músicas do gosto deles O Guinga adora Saída de Emergência. O Yamandú Costa tem muita verve e ficou com o samba-choro Benzetacil, que tem um grande solo de violão. Num show com o Hamilton de Holanda, em Brasília, tocamos Linha de Passe, que combina com o bandolim. Depois do Jacob, ele reinventa o instrumento porque é um músico jovem, aberto ao que está surgindo. O Djavan veio por causa da nossa amizade desde o início dos anos 70, quando ele chegou de Alagoas e eu de Minas. "Corsário" é dessa época e Ney Matogrosso gravou no disco depois dos Secos e Molhados. As outras músicas entraram porque as toco em shows, como é o caso de Ronco da Cuíca e Coisa Feita, ou porque não toco há muito tempo. Bala com Bala, que Elis Regina gravou em 1972, ganhou várias versões mas nunca toquei ao vivo. E há O Bêbado e a Equilibrista e Papel Machê. Não posso fazer shows sem elas. Quis também cantar o Gago Apaixonado, de Noel Rosa, um samba fantástico, partindo da gagueira para criar uma síncope. No DVD e no CD você tem sopros e convidados, mas o som continua característico, seu. Qual a influência de seus músicos no seu som? Fiz dois discos ao vivo, retrospectivos, Centésima Apresentação, em 1981, Acústico da MTV, em 1991. Nos dois estou solo, mas se você compará-los ao DVD, as músicas não mudaram, a instrumentação está dentro daquele universo, daquela concepção. Aqueles músicos estão comigo há muito tempo. Nelson Faria, há sete anos, Kiko há cinco, Ney há quatro e o Marçal desde sempre. Quando você compõe, pensa na sua interpretação como cantor e violonista? Nos oito anos em que fiz músicas para Elis, não pensava na interpretação. E me surpreendia com o acabamento que ela dava às canções, muito bom, definitivo. Hoje, mexo com o violão e com a voz, enquanto trabalho melodia e harmonia nessa combinação. Fica muito pessoal, mas gosto de procurar outras vertentes da canção e adoro que outras pessoas façam isso. É estimulante. Hoje componho menos, fiquei mais exigente e fujo do que já fiz. Não quero fazer outra Escadas da Penha, O Bêbado e a Equilibrista, quero me desvencilhar do passado e buscar o que posso fazer hoje. Aí complica, mas essa procura é interessante. Sempre tive intuição exploratória, procurei o melhor suingue para cada tema, a forma de usar as cordas do violão... Então, a demora é um tempo de exercício, de estudo. Ainda mais depois que me lembraram dos 60 anos, é um cuidado necessário. Se você tem uma idéia e a mão não vai, danou-se. Você já disse que não curte balanços de vida nem datas redondas. Por que mudou de idéia? Continuo sem dar importância porque o tempo passa e vou tocando meu violão. Essas datas são de mercado, como dia das mães, pais, namorados. Todo dia é dia do pai, da mãe e do namorado. Mas foi legal fazer um balanço da sua carreira? O convite veio de três instituições de mercado, a gravadora Universal, o selo de João Mário Linhares, MPB, e o Canal Brasil. E não foi pelos 60 porque este dado não é importante. Aceitei porque ainda não tinha DVD, um suporte de luxo em que o público tem o áudio do show e vê o artista. Poderia ter feito antes, quando lançamos Malabaristas do Asfalto, disco e show muito bonitos, de muito sucesso, mas não apareceu ninguém para me lembrar isso... Foram dois dias. No primeiro, os câmeras observaram o show e no segundo, registraram Não se perdeu nenhuma imagem dos músicos, os solos todos estão presentes. E não tem efeitos especiais. Fico na fronteira do intérprete, do músico, do compositor. De 1972, quando você estreou (num compacto com Agnus Sei na voz dele, e Águas de Março, com Elis Regina)até hoje a música evoluiu ou involuiu? Mudou. A palavra evolução era usada na bossa nova. Depois não fez mais sentido atrelar a mudança ao processo de revolução. Porque, às vezes, não se anda para frente, mas para o lado, o que também é mudança. A música de hoje não é melhor nem pior que de oito anos atrás, é diferente porque mudam as tribos e a gente também muda. A favela, a periferia que fazia o samba, faz funk e hip hop, rap. Como essa informação chega a você? Isso está aqui em casa. De quinta a domingo só escuto isso, do espaço Emoções e outros lugares da Rocinha. Vai de 11 da noite às 4 da manhã. A sorte é que não é diário, mas um dia no fim de semana. É um alto-falante poderoso que você ouve o dia inteiro. E você gosta? As coisas rítmicas sim, porque é o ritmo que está no meu trabalho, mesmo as músicas românticas têm suingue. Você não fica parado com um funk, porque é muito bom. A música diz diretamente ao corpo, não vai para a cabeça, você quer dançar, curtir, ficar num espaço grande, com muita gente. Com o rap é igual. O discurso ritmado também é bom, mas sem estar na pista, a gente sente falta de um pouco mais de harmonia, uma melodia interessante. Mas a idéia não é essa. É ir para a pista, dançar e não pensar em mais nada. Você tem e teve parceiros importantes. Como eles te influenciaram? A palavra é fundamental na música. Fiz muita melodia a partir da palavra, que traz um universo, uma cena, um movimento e a minha música tem muito isso. Já musiquei muito texto e acho que preciso da palavra, é importante na minha música, o significado e também o som, singularidade de uma herança africana de sonoridades. Desde Agnus Sei, em que o Aldir falava "ei anda pacaparandá...". Você e Aldir voltaram a compor, não é mesmo? Não com a mesma intensidade, ímpeto e voracidade de antes. Como você escolhe seus parceiros atuais? Quando faço música já imagino que tipo de poeta combina com ela. Durante dez anos era eu e Aldir direto. Depois que diversificamos o trabalho, buscamos amigos novos, penso na canção e na palavra mais indicada para aquela canção, que poeta combina com ela. Você sente o peso de ser sexagenário? Isso mudou muito. Na minha juventude, via um sujeito de 60 anos com o pé na cova. Hoje não sinto isso. A medicina é outra, a alimentação é outra, a gente se preserva e todo mundo é mais curioso em relação ao futuro... E quer ficar para ver o que vai acontecer. Há pouco, achei maravilhoso ver o Niemeyer na prancheta, como se fosse um jovem arquiteto. Na minha infância e juventude isso não era normal. Então ter planos evita envelhecer? Esse é o segredo. Com projetos, você quer chegar ao futuro e realizá-los. Tenho uma turnê com o Gonzalo Rubalcaba (pianista cubano) em outubro e novembro, na Europa. O Gonzalo tem 43 anos, muita técnica e preciso ficar muito bem ao lado do cara. Esse projeto me estimula a estudar e me cuidar. Garanto que até outubro, novembro, estarei bem porque tenho um projeto. E tem também um disco de inéditas para fazer. Tenho muitas, recentes... Pensava em gravar na volta da turnê com o Gonzalo, mas as pessoas envolvidas no projeto pensam que seria melhor no verão, para lançar no início de 2007. Então, devo gravar em fevereiro. Mas você não gosta de cair no carnaval nesta época? Não gasto mais de três/quatro semanas para gravar um disco. Meu sistema de gravar é o mesmo de sempre, como no DVD. Entrou no estúdio e gravo direto, valendo. Depois coloco os arranjos que faltam. Então, é rápido...

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