Jessye Norman chega ao Brasil

Uma das mais importantes figuras do canto lírico internacional, seu repertório surpreendentemente amplo inclui de compositores do século 17 aos dos dias atuais

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Por Agencia Estado
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A soprano norte-americana Jessye Norman chega nesta sexta-feira ao Brasil para uma série de quatro recitais: três a partir de terça no Teatro Alfa em São Paulo e o quarto no dia 7 no Municipal do Rio. As apresentações anteriormente estavam previstas para outubro do ano passado, mas foram canceladas por causa dos ataques terroristas de 11 de setembro que fizeram com que a cantora decidisse não vir ao País. Uma das mais importantes figuras do canto lírico internacional, com um repertório surpreendentemente amplo, que vai de compositores do século 17 aos dos dias atuais, ela apresentará em São Paulo canções de Schubert, a Xerezade de Ravel e os Wesendonck Lieder, ciclo de canções de Richard Wagner. Pela segunda vez no País, a soprano iniciou sua trajetória internacional no fim da década de 60, na Deutsche Oper de Berlim. Foi o início de uma grande carreira da qual fazem parte apresentações nos principais teatros e festivais do mundo e gravações com os principais maestros e selos, com um repertório que vai de Haendel a Schoenberg, dos spirituals a canções de Michel Legrand. Jessye Norman conversou com a reportagem por telefone de Nova York. E explicou o porquê da escolha do repertório dos recitais. "Ao escolher as canções de Schubert, procurei mostrar duas facetas do compositor, uma mais lírica e outra dramática. A peça de Ravel é excelente oportunidade de experimentar as cores daquilo que chamávamos de Oriente. Já os Wesendonck Lieder são peças importantes para mim, antecipam temas de Tristão e Isolda, com os quais qualquer pessoa se identifica." Ao reunir obras do repertório germânico e francês, os programas mostram um painel consistente da atividade de Jessye Norman, que tem no currículo, além de Wagner e Ravel, papéis de Bizet, Saint-Saens, Berlioz, Debussy, Poulenc, Richard Strauss, Weber. "Minha relação com o repertório francês começou com meu professor Pierre Bernac, que também me apresentou à literatura francesa", lembra a soprano. Século 20 - Ela ressalta que o compositor e maestro Pierre Boulez desenvolveu papel importante nesse processo. Boulez, no entanto, também foi o responsável, "cerca de mil anos atrás", segundo a sempre bem-humorada Jessye, por ela ter encarado o repertório do século 20, que até então "me botava medo". "Quando ele me convidou para fazer canções de Alban Berg, fiquei desesperada, mas depois pensei: bom, se alguém entende desse assunto é ele, portanto, se ele está falando...", ri Jessye, que ao longo dos anos acrescentou à sua discografia peças de autores como Bartók (O Castelo do Barba Azul) e Schoenberg (o monólogo expressionista Erwartung e as Canções de Cabaré), entre outros. "Da mesma forma que eu perdi o medo, fico feliz de ver outras pessoas se surpreendendo e divertindo-se ao ouvir as Canções de Cabaré, quebrando o preconceito de que a música contemporânea é séria demais e sem graça." Jessye se diverte ao comentar o "grande mistério" que se tornou a diversidade de seu repertório e o modo como ela passa, em alguns casos, do registro de soprano para o de meio-soprano, mais grave. "Sou alguém que se esforça e trabalha duro. Faço apenas aquilo que amo, que me atrai, e dou o melhor que tenho. Meu limite é a imaginação." É assim que ela define seu repertório, que também é influenciado, diz, pela personalidade das personagens. "Gosto de papéis multifacetados, não gosto de mulheres que são vítimas e não possuem força." Isolda, Salomé, Carmen, Dalila são alguns exemplos do oposto. "Estou interessada em bons textos de bons escritores e nem todos os libretistas o eram." Algo que a toca profundamente são os spirituals norte-americanos. Buscando uma ligação forte com a natureza, no entanto, ela não se considera uma pessoa religiosa. "Não gosto do termo religião, que hoje, devido à sua má interpretação, está associado a dogmas que excluem outras crenças e geram intolerância", afirma. E que, segundo ela, provocam desastres como os ataques às Torres Gêmeas. Meses após o ataque, a voz séria substituindo a descontração, ela diz que o mundo hoje não é mais o mesmo. "Sabemos que vamos superar, mas não sabemos como nem quando. Nesses momentos a arte pode ajudar as pessoas a exprimir o que sentem." Jessye Norman, ligada a instituições de direitos humanos incluiu em sua agenda no Brasil um recital beneficente, o do dia 1.º, no Alfa. "É muito bom dar um incentivo às pessoas que trabalham para ajudar crianças carentes." Para tanto, convidou Gilberto Gil e Milton Nascimento para a apresentação. Apesar de não conhecê-los pessoalmente, os dois brasileiros fazem parte de sua discoteca "há mais de 20 anos". "Garanto que vocês terão boas surpresas." Quais? O riso, agora de volta, parece indicar que teremos todos de esperar para ver. Aviso: ainda há ingressos apenas para esse recital beneficente, de R$ 180 a R$ 360. Bilheteria do Teatro Alfa: tel. (0--11) 5693-4000.

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