“Para um octogenário, está mais do que bom, não?”, brinca o maestro Isaac Karabtchevsky. Ele se refere à sua agenda em dezembro. Entrou o mês à frente de uma nova produção de Madama Butterfly, de Puccini, no Teatro Municipal do Rio de Janeiro. Deu um pulo em João Pessoa, para reger a orquestra local, da qual se tornou patrono. No caminho de volta, fez uma turnê por quatro cidades com a Orquestra Petrobras Sinfônica – e tudo isso enquanto chegava às lojas seu novo disco, em que interpreta, com a Osesp, a Sinfonia n.º 10 de Villa-Lobos.
A rigor, Karabtchevsky ainda não é um octogenário, afinal ele completa 80 anos apenas no dia 27 de dezembro. Mas a agenda intensa já comemora a data – e nela ainda faltam dois concertos bastante especiais. Hoje, na Sala São Paulo, e na segunda, no Teatro Municipal do Rio, ele rege a Sinfonia n.º 2, Ressurreição, de Mahler, à frente das duas orquestras da qual é maestro titular: a Sinfônica Heliópolis e a Petrobras Sinfônica. As solistas serão a soprano Lina Mendes e a meio-soprano Ednéia Oliveira, às quais se unem o Coral Cultura Inglesa (São Paulo) e o Coral dos Canarinhos de Petrópolis (Rio).
“Não é a primeira vez que junto duas orquestras para tocar uma sinfonia de Mahler. Quando fiz a Oitava, no Rio, uni a Sinfônica da Petrobrás com a Sinfônica de Porto Alegre. Mas a questão ali é que a partitura exigia essa grande massa de músicos, era uma necessidade. Desta vez, e isso me deixa muito feliz, a reunião desses artistas tem um caráter festivo”, diz o maestro, para quem a recente turnê foi “um alento”. “Estar na estrada com a orquestra, por mais que seja em uma agenda cansativa como essa, é sempre bom. Foi especial ver, por exemplo, em Brasília, a catedral lotada de pessoas interessadas em música.”
A escolha de Mahler para o concerto comemorativo não se deu por acaso. O compositor é uma das especialidades de Karabtchevsky. Mas o simbolismo é ainda maior: foi com a Sinfonia n.º 2 que ele fez seu primeiro concerto com os músicos da orquestra do Instituto Baccarelli, em 2011. Na sequência, vieram as sinfonias n.º 1 e n.º 3 – e o maestro fala na possibilidade de abrir o próximo ano com a Nona. Isso se deve à crença, o maestro explica, de que a Sinfônica Heliópolis precisa enfrentar o grande repertório sinfônico – e de que obras do romantismo tardio, como as de Mahler, ajudam no processo de criação da sonoridade do conjunto.
Decano. Karabtchevsky chega aos 80 anos como o decano da regência brasileira. No passado, ocupou postos de destaque: no Brasil, foi diretor da Orquestra Sinfônica Brasileira por mais de 20 anos e também do Teatro Municipal de São Paulo; na Europa, dirigiu a Tonkünstler, de Viena, o lendário Teatro La Fenice, de Veneza, e a Orchestre du Pays du Loire, na França, entre outros. Como convidado, esteve à frente de orquestras como a das Óperas de Viena e Washington.
Já fez muita coisa, mas tem levado a sério sua máxima de que “aposentadoria é morte”. Além do comando das orquestras da Petrobras e de Heliópolis, ele é diretor do Municipal do Rio – e um dos principais regentes convidados da Osesp. Com ela, tem se dedicado a gravar todas as sinfonias de Villa-Lobos, para o selo Naxos. É um trabalho de fôlego, que inclui uma nova edição das peças, bancada pelo selo Criadores do Brasil. “Gravar Villa-Lobos é antes de mais nada estar atento à necessidade de lidar com partituras que nem sempre estão em bom estado e que exigem um cuidado na hora de fazer escolhas de interpretação”, ele diz.
Após a décima sinfonia, agora lançada (leia a crítica abaixo), maestro e orquestra se preparam para gravar a de n.º 8. O registro deve ocorrer em fevereiro, depois de uma pequena turnê que a Osesp faz com Karabtchevsky pelo interior do Estado, entre os dias 5 e 8, na qual passará por Paulínia, Salto, Pirassununga e Guarulhos. O grupo vai interpretar, além da Sinfonia n.º 8, o Prelúdio das Bachianas brasileiras n.º 4, também de Villa-Lobos, e O Pássaro de Fogo, de Stravinski – o mesmo programa será apresentado na Sala São Paulo, nos dias 12 e 13.