HQ de Haroldo Costa e Ykenga narra a história do samba aos jovens

Projeto contemplado pela Lei Aldir Blanc, 'A História do Samba em Quadrinhos' passa por nomes essenciais da música brasileira, como Dona Ivone Lara, Donga, Cartola, Nelson Cavaquinho

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Por Eliana Silva de Souza
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Ritmo brasileiro que ganhou o mundo, o samba já teve sua história contada de diversas maneiras, inspirando livros, filmes e obras das artes plásticas. No entanto, ainda havia uma defasagem no que se refere a material sobre o assunto destinado ao público infantojuvenil. Ao perceber esta quase inexistência de obras abordando o tema que atingissem essa parcela da população, o produtor cultural Robson Lo Bianco, o Robson Mangueira, teve a ideia de criar um gibi contando fatos que permeiam a trajetória do samba. Para dar corpo ao projeto, contou com dois nomes de peso: o ator e escritor Haroldo Costa, responsável pela pesquisa e pelo texto, e o cartunista Bonifácio Rodrigues de Mattos, o Ykenga, que aceitou colocar seus traços na HQ. O objetivo é fazer o lançamento de A História do Samba em Quadrinhos até junho, contando também com material online. 

Ilustração de Ykenga para o gibi 'A História do Samba em Quadrinhos' Foto: Ykenga

Projeto contemplado pela Lei Aldir Blanc, o gibi terá 60 páginas e será todo colorido. Junto com o lançamento impresso, a equipe prepara também um material de apoio para a internet, que ficará disponível em uma página ainda em fase de construção e na qual o público jovem poderá conferir algumas interpretações de obras que marcaram a trajetória do ritmo. Trata-se de um aspecto muito importante do projeto, pois colocará esse público em contato com nomes essenciais da música brasileira, como Dona Ivone Lara, Donga, Cartola, Nelson Cavaquinho. Por ser um tema amplo, os realizadores planejam continuar contando essa história, que se desdobraria em uma série com mais edições. Para Robson Lo Bianco, a HQ chega para suprir uma necessidade de fazer chegar aos jovens informações sobre o samba que, segundo ele, é pouco ouvido por essa parcela do público, diferentemente do que acontecia antigamente. Foi observando o filho Lorenzo, de oito anos, que o produtor viu como o samba estava distante das gerações mais novas, mais acostumadas a ouvir outros ritmos, como o funk, lembra ele.  Ao pesquisar por títulos sobre o assunto para levar mais informações ao filho, percebeu que não havia obra sobre o assunto dedicado ao público infantil e juvenil. “Eu e minha mulher, Janaina, que também é produtora, começamos a pesquisar alguma literatura que fosse específica para o público infantil, e não encontramos absolutamente nada”, conta o sambista, percebendo a necessidade de se elaborar algum projeto destinado aos jovens. Incrédulo com a descoberta, Robson revela seu inconformismo ao constatar que o samba, um ritmo mais que centenário, não fosse tratado em obras específicas para os pequenos leitores. E assim surgiu a ideia do gibi, um sonho que se torna realidade. 

O sambista Cartola é um dos personagens da HQ Foto: Acervo Estadão

Neste primeiro exemplar, Haroldo Costa utilizou seu conhecimento sobre o samba para contar a trajetória desse gênero musical, desde as raízes na África até os dias atuais. “Faço uma retrospectiva dessa história, passando por todos os caminhos percorridos pelo samba, as suas transformações, até chegar no ritmo que hoje conhecemos”, revela o pesquisador, cujo trabalho se insere “na sequência de pesquisas que desenvolvo ao longo dos anos, iniciado com o livro Na Cadência do Samba, de 2000, sobre as cinco décadas na história do ritmo”. E essa longa história começa na África, de onde vieram os negros escravizados, obrigados a enfrentar viagens desumanas, em navios negreiros. “É uma história longa, dolorida, e importante”, diz Haroldo. Para ele, a revista em quadrinhos é uma possibilidade para que os jovens saibam mais sobre si mesmos e suas próprias origens, tendo o samba como foco. “Esse novo livro pretende mostrar para as crianças, em uma linguagem de fácil compreensão, como o samba viajou nos navios negreiros de Angola para o Brasil e como ele foi transformado aqui”, observa Haroldo.  Após essa viagem intercontinental, o ritmo daria seus primeiros passos até chegar ao que conhecemos hoje no Rio de Janeiro, mais especificamente na Praça Onze, lugar apontado como o berço do samba. Era nessa região onde se concentravam os negros e ali tocavam as batucadas baianas que foram misturadas ao lundu, ritmo vindo da África. A partir desse ponto, a história começa a tomar forma, com o surgimento de importantes nomes que fizeram o samba se tornar o ritmo mais popular do País.  Em 1916, foi oficialmente registrado o primeiro samba no Brasil – Pelo Telefone, composição de Donga e Mauro Almeida tida como um marco e criada durante um evento na célebre casa da Tia Ciata, como ficou conhecida a baiana Hilária Batista de Almeida, mãe de santo e também festeira, que costumava reunir músicos da época. O local se tornou um ponto de encontro e referência do samba. A casa passou a ser frequentada por nomes como Pixinguinha, João da Bahiana, Heitor dos Prazeres, Sinhô, João da Mata, Catulo da Paixão Cearense. Para narrar esta história para crianças e jovens, o gibi trará a menina Lara como condutora da trama, personagem inspirada na própria neta do cartunista Ykenga. O gibi começa com um trabalho de escola que a menina precisa fazer sobre o samba. “Na trama, Lara precisa preparar esse material escolar e, para isso, começa a pesquisar na internet e acaba encontrando uma pessoa que vai contar a história toda, desde a África até os dias atuais”, revela o quadrinista. Entre os cuidados que teve ao criar os desenhos, Ykenga conta que precisou transformar a dor em algo que conseguisse atrair o público-alvo. “Tenho que usar a linguagem deles e, para isso, contei com a parceria da minha neta, que mora comigo agora”, afirma o premiado artista, cujo contato direto com a menina permitiu ter uma ideia do que a garotada gosta e está vendo agora. O chargista, que está no ramo há mais de 40 anos e também já foi professor, acredita que esse trabalho seja “muito relevante, pois ainda não existia uma literatura voltada para esse público”.

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