Herbert Vianna lança novo disco-solo

O Som do Sim, o terceiro de uma carreira de 18 anos dedicada ao rock brasilis, será lançado este mês, trazendo nomes consagrados como Nana Caymmi e desconhecidos como Luciana Pestano

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Por Agencia Estado
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De um lado, uma legião de desconhecidos: Gustavo Black Alien, Rodrigo DJ Nuts, Ricardo Ortega, Carlo Bartolini, Luciana Pestano, Érika Martins. Do outro, um time consagrado: Cássia Eller, Fernanda Abreu, Nana Caymmi, Zélia Duncan, Fernanda Takai. O Som do Sim, novo disco-solo de Herbert Vianna - o terceiro de uma carreira de 18 anos dedicada ao rock brasilis -, chega às lojas este mês promovendo um inesperado cruzamento entre astros emergentes da música brasileira e estrelas sacramentadas da canção nacional. E não se trata apenas de um cruzamento virtual: as modernas técnicas da produção de estúdio convivem com a tradição vocal da MPB, a bossa nova encontra-se com a fuzzy bossa, a eletrônica e o hip hop dão as mãos a instrumentos acústicos dos anos 60. "Os novos produtores de estúdio representam uma linguagem nova, que está sendo elevada à categoria de arte fina", diz Herbert, anfitrião de diferentes gêneros e cruzamentos em mais um disco interessante em sua carreira off road - ele já lançara anteriormente Ê Batumaré (1992) e Santorini Blues (1997). "Não estou em busca de uma pseudo-assinatura de modernidade", ele avisa. Em verdade, ele não poderia mesmo ser acusado de oportunismo eletrônico, já que - de Lobão a Lulu Santos - quase todo o rock nacional já passou pelo batismo dos big beats e das bases programadas. O disco de Herbert é até um pouco temporão, nesse sentido. A idéia do músico, originalmente, era regravar composições suas que já integraram o repertório de intérpretes femininas. Que não foram poucas: Zizi Possi, Gal Costa, Paula Toller, Ivete Sangalo, Daniela Mercury, Renata Arruda, entre outras. "Mas eu cheguei à conclusão que regravar essas canções seria algo meio autocelebratório e não seria artisticamente tão interessante." Então, passou à busca de um repertório novo, que veio acompanhado de uma sonoridade igualmente nova. "Eu estava predisposto a aceitar tudo, a experimentar tudo e não premeditar nada", conta. "Abaixei todas as defesas e deixei a coisa correr." Doméstico - Herbert Vianna tem um curso curioso dentro do rock nacional. Ao mesmo tempo em que encabeça a maior banda do gênero, superpopular, em atividade desde o início dos anos 80 ele arrisca-se eventualmente numa viagem solitária, caseira, fazendo um trabalho-solo com recursos domésticos e sem ambições comerciais. Não faz show, não inclui suas canções-solo nos concertos dos Paralamas e não declara demasiada convicção. Seus outros discos-solo pareciam querer ser uma janela de escape da linguagem escancaradamente pop dos Paralamas. Mas, neste, ele aparece até mais pop que nos anteriores. "Os outros discos aconteceram involuntariamente", lembra. "Eu preparei umas fitas-demo e algumas delas tinham uma qualidade superior, o que me forçou ao primeiro disco, Ê Batumaré", conta. "O segundo, Santorini Blues, é uma aquarela pálida; eu entrei no estúdio para gravar algumas canções e acabei fazendo um disco inteiro." De qualquer modo, avisa Herbert, o som que ele obtém no disco não é um compartimento especial dentro do conceito todo do trabalho. "É tudo muito conectado com o sentimento que originou tudo isso, que é um sentimento de indignação pelo que acontece atualmente no País, a banalização da morte, o desamor pelo próximo, a desumanição", afirma o cantor. "Eu falo de uma maneira taoísta de reagir às coisas, um modo de não confrontação de não tentar devolver na mesma moeda", diz. Parece um lance meramente discursivo, mas as histórias que Herbert amealhou recentemente parecem legitimar seu arrazoado. Uma das canções do disco, por exemplo, A Mais, foi feita numa circunstância trágica. Ele conta que, há alguns meses, conversava com o compositor e cantor Pedro Luís (da banda Pedro Luís e A Parede) sobre a violência. "As notícias de mortes eram tantas, da Malásia à Baixada, que a gente sentia que aquilo acabava dessensibilizando as pessoas", lembra. Alguns dias depois da conversa, a irmã de Pedro Luís, Margot, foi assassinada no Rio com três tiros na cabeça. Estava no lugar errado na hora errada, durante um acerto de contas entre bandidos. Tinha ido visitar uma amiga. Ele e Pedro fizeram a música. "Não leve a mal/Sou só mais um/Quero uma noite tranqüila/Um amanhecer comum", diz a letra. A paternidade também acentuou essa preocupação do guitarrista dos Paralamas com a violência. Não é a primeira vez que ele fala do medo que tem do vale-tudo que impera nas grandes cidades brasileiras. Fala mesmo em sair do País. "Penso sobre isso uma boa parte do tempo", admite. "A gente tem números de guerra civil no Brasil há muito tempo e eu não consigo considerar isso como uma coisa normal, tenho pesadelos, acordo com freqüência no meio da noite; para onde a gente vai correr?" pensa. Ele acha que todo mundo deve fazer sua parte para melhorar a situação. A saída que encontrou foi fazer um disco afirmativo, esperançoso. A morte e o tempo são os temas mais recorrentes. "Tenho 39 anos e a morte é algo que aflige o ser humano num determinado período da vida, quando ele começa a ver morrer os amigos dos pais e mesmo os seus amigos", diz. Um desses amigos mortos recentemente foi Renato Manfredini, ou Renato Russo, do Legião Urbana. No dia em que Russo morreu, Herbert compôs Une Chanson Triste, que aparece no seu disco-solo com participação da cantora Daúde, além de Tácio Farias (da banda de reggae Negril) e Kuki Stolarski (do Karnak). "Tem dias como este/Que parecem não ter fim", canta. Há uma única cover no disco, Inbetween Days, do The Cure, hit dos anos 80 que retorna como um dueto entre Herbert Vianna e Érika Martins, da banda Penélope. Mas talvez a grande novidade mesmo seja a apresentação ao grande público de uma desconhecida cantora gaúcha chamada Luciana Pestano, que divide os vocais com ele na faixa Eu não Sei nada - que tem ainda a participação de Henrique Portugal (do Skank) e Fred (baterista dos Raimundos). Luciana, dona de uma ´voz de lixa´ estupenda, é uma saudável boa nova. "Lembra o Rod Stewart, não é?", pergunta Herbert, encantado. "Eu a conheci num festival no Sul da França parecia uma Joni Mitchelzinha com o cabelo na testa e o violão", lembra. O cantor ficou tão entusiasmado que também estuda a possibilidade de produzir um disco e lançar um CD de estréia da cantora. Outra boa parceria é com a diva Nana Caymmi na bossa Hoje Canções. Herbert Vianna a conheceu quando os Paralamas gravavam Bora-Bora nos estúdios antigos da EMI, em Botafogo, no Rio. A família Caymmi também estava gravando no estúdio, na porta ao lado dos Paralamas e um belo dia - como de hábito - Nana deu uma estourada com os irmãos de sangue. "Ela veio andando pelo corredor, encostou a cabeça no vidro do nosso estúdio e começou a cantar o refrão de Quase Um Segundo, fazendo uns vocalises", lembra o compositor. Na ocasião, Nana não quis dividir os vocais porque achou que a versão dos Paralamas estava OK. Agora ela cedeu. "Eu espero por isso há muito tempo", diz Herbert. Com Sandra de Sá, ele divide a voz em Vamos Viver, talvez a canção mais ilustrativa do conceito todo do disco. "Vamos consertar o mundo/Vamos começar lavando os pratos", diz a letra. "É um jeito de brincar com as grandes utopias e os pequenos passos", afirma o cantor. "Eu acredito nos pequenos passos."

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