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Hamilton de Holanda e a turma que revigorou o choro não param de dar boas notícias

Músico presta homenagem ao centenário de Jacob do Bandolim com lançamento de quatro álbuns

Foto do author Julio Maria
Por Julio Maria
Atualização:

Eles não usam ternos nem sapatos bicolor. De mãos velozes e cabelos desajustados, seus instrumentos, em algum momento, vão inevitavelmente provocar um incêndio. Cem anos depois do nascimento de Jacob do Bandolim, 170 depois da aparição de Chiquinha Gonzaga, uma geração de pensamento longe do convencional revira do ritmo dos pés às harmonias da cabeça o primeiro gênero instrumental urbano do País. Incendiários pelo gosto que alimentam no virtuosismo, compõem e repassam obras para criar um “hard choro” de grande impacto.

Hamilton de Holanda e seu bandolim de dez cordas, duas a mais do que as tradicionais, são, ao lado do violonista gaúcho Yamandú Costa, dos maiores responsáveis pelo revigoramento que o gênero experimenta há pelo menos dez anos. Carioca criado em Brasília, 42 anos, seus álbuns começam a sair em 1997 e, muitos deles premiados, já passam dos 25. Ao aproximar muitas vezes o choro do jazz e abrir mão de formatos clássicos, abriu caminho para nomes como os também bandolinistas Henrique Araújo e Fabio Perón, os violonistas Gian Correa e Cainã Cavalcante e o clarinetista Alê Ribeiro. “O choro não teve tempo de ir para fora do País. Quando isso poderia acontecer, a bossa nova explodiu”, fala Hamilton, lembrando que muitas bossas também são choro, como a seminal Chega de Saudade, de Tom e Vinicius.

O bandolinista Hamilton de Holanda Foto: Wilton Junior/ Estadão

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Hamilton imprimiu em sua carreira uma produção intensa de álbuns e projetos. Ele lança nesta sexta, 25, na Casa Natura, o primeiro de quatro álbuns que vão homenagear o centenário de Jacob do Bandolim. Jacob 10ZZ, gravado com Guto Wirtti no baixo acústico e Thiago da Serrinha na percussão, vem com temas que, por vezes, aproximam a linguagem do maior bandolinista do choro à do jazz. Alvorada, Nostalgia, Remelexo, elas vão revelando como o fraseado de Jacob já era criado fora de caixas da própria tradição. Os outros discos que fecham o Ano Jacob serão Jacob Bossa, com piano no acompanhamento; Jacob Baby, com temas mais lentos e um contraponto de cavaquinho; e Jacob Black, com um centro forte de percussão e o “violão afro” de Rafael dos Anjos. O tema Assanhado vai estar nos quatro discos, ganhando uma linguagem diferente em cada um.

O entendimento do choro como uma linguagem também jazzística, um tabu entre representantes mais tradicionalistas, parece ser uma marca entre os nomes jovens. “Jacob tem o jazz, mas não é jazz o tempo todo. De qualquer forma, são músicas muito próximas, com essa mistura de Europa e África e essa predisposição para ser uma música de momento, feita ali na hora”, diz Hamilton. Izaías, do grupo Izaías e seus Chorões, pode estar na outra ponta. Ele fala com respeito dos mais novos, mas pontua diferenças. Um seguidor da escola clássica, ele e seu regional apresentam no sábado, 26, um concerto na Casa Tupi or not Tupi para também mostrar a obra de Jacob. Ao seu lado estarão os músicos do grupo camerístico Quintal Brasileiro, um quinteto de dois violinos, viola, violoncelo e contrabaixo.

O músico Jacob do Bandolim Foto: Reprodução

Mudanças de rumo? Izaías, 81 anos, que tocou com o próprio Jacob, já viu muitas. “O próprio Jacob, ao fazer temas como Remelexo e Assanhado, já vinha com um pé na linguagem do jazz.” A velocidade e outros virtuosismos, para ele, quando bem executados, fazem parte da interpretação. “Mas é preciso tomar cuidado com a sensibilidade, é o que está faltando na música de hoje. As pessoas querem tocar de forma mais contagiante, e tenho certeza de que essa forma agrada mais à plateia. Só não podemos deixar de sentir o luar”, ele fala, para emendar depois de um segundo. “Bem, não sei se alguém ainda fala de luar?”

Zé Garcez, violonista das seis cordas, atuante em núcleos de choro mais tradicionais ao lado de Luizinho Sete Cordas e Euclides Marques, ele vê perdas e ganhos no novo ponto colocado na linha histórica do choro. “Poucos grupos usam hoje um violão de seis cordas, e isso muda a postura do violão de sete em um grupo.” Garcez acredita que o violão agora fraseia mais e não investe tanto nas perguntas e respostas clássicas do gênero. “Ele vem mais misturado ao jazz.” A harmonia, os acordes, no entanto, se libertaram de qualquer amarra. “Há um ganho na harmonia. Ela ficou mais complexa, ganhou mais dissonâncias.” 

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