Gravadora é abrigo da boa música brasileira

A independente Biscoito Fino é responsável por alguns dos melhores lançamentos recentes, como Áfrico, de Sérgio Santos, e, agora, Compositores, de Miúcha

PUBLICIDADE

Por Agencia Estado
Atualização:

Criada no ano passado, a gravadora independente Biscoito Fino é responsável por alguns dos melhores lançamentos recentes da música brasileira, como a obra-prima Áfrico, CD do compositor e cantor mineiro Sérgio Santos, e Gafieira Moderna, registro do samba urbano suingado da cantora e compositora Joyce. Relançou, ainda, o disco Estrela da Vida Inteira, original de 1986, de Olívia Hime, diretora artística da gravadora. São poemas de Manuel Bandeira musicados, a pedido de Olívia, por Gilberto Gil, Francis Hime, Tom Jobim, Milton Nascimento, Wagner Tiso, Moraes Moreira, Ivan Lins, Dorival Caymmi, Toninho Horta, Joyce, Radamés Gnatalli, Dori Caymmi e por ela mesma, Olívia. Maria Bethânia, cansada do esquema apressado das multinacionais, mudou-se para a nova gravadora carioca, que é presidida por Kati Almeida Braga, e por ela pretende lançar, comercialmente, o disco de benditos, preces e ladainhas que realizou para ajudar nas obras de restauro da igreja de Santo Amaro da Purificação, sua cidade natal. Esses são alguns dos títulos levados ao mercado e há uma penca de outros na linha de produção. Os laçamentos mais recentes são Mar de Algodão, com Olívia cantando Dorival Caymmi, e Compositores, com Miúcha interpretando os autores que mais a sensibilizam. Nenhum desses discos é "comercial" - ou seja: nenhum deles acena para o mercadão dos programas de auditório televisivo. São discos orientados por conceitos claros, quase temáticos, produtos sofisticados - o que não quer dizer "difíceis", que é o argumento usado pelas grandes fábricas de disco para só realizar porcarias. Trata-se sempre de música alfabetizada, que lida com sentimentos delicados. Parece que isso não soa bem, mais, para o mercado. Quem quer fazer trabalho assim, precisa do refúgio nos selos alternativos. Eles são muitos, no Brasil, alguns com longo tempo de operação - como o carioca Kuarup, tocado pelo produtor Mário de Aratanha, que já completou 20 anos; o Velas, do compositor Vítor Martins (Ivan Lins foi seu sócio até há pouco), criado em 1990; ou o Eldorado. Nos últimos anos surgiram selos de grande importância - o Acari, do Rio, dedicado ao choro e congêneres, a Lua Discos, de São Paulo, de alvos mais diversos, como também é diverso o elenco do paulistano CPC-Umes, criado em meados da década passada. Eles e os outros (o número de gravadoras independentes sobe a mais de 400) são o abrigo da boa música. O único abrigo. A Biscoito Fino criou para seus discos um padrão de capa caprichoso, com embalagem de papel, que se abre, mostrando, do lado direito, o CD, e, do esquerdo, encartado em dobra que forma bolso, um encarte com letras, informações técnicas, ilustrações. O disco de Olívia Hime cantando Caymmi é, como tudo o que ela fez, pérola de delicadeza - e também de coragem. As Marinhas de Caymmi aborda a parte talvez mais conhecida e regravada da obra do grande compositor baiano. No fim dos anos 90, Dori Caymmi gravou boa parte dessas canções no impecável "Tome Conta do Meu Filho Que Eu também já Fui pro Mar", acompanhando-se ao violão. Olívia, auxiliada por Francis Hime, seu marido, preferiu dividir as marinhas em três blocos - "Mar da Manhã", "Mar da Tarde", "Mar da Noite", com arranjos, no primeiro segmento, de Paulo Aragão e Proveta, no segundo, de Wagner Tiso e, no terceiro, de Francis. Fino biscoito que reforça a marca.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.