Gil, Caetano e Mautner fazem shows em SP

E durante ensaio, esta semana no Rio, chamaram a reportagem para falar de música, política e de suas expectativas sobre o Brasil

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Por Agencia Estado
Atualização:

Pela primeira vez em muitos anos, Gilberto Gil e Caetano Veloso fazem shows na mesma cidade, em São Paulo. Gil leva Kaya n´Gan Daya para o Credicard Hall, sexta e sábado, e Caetano faz, com Jorge Mautner, sábado e domingo, na Via Funchal, o show do disco Eu não Peço Desculpas, que lançaram em agosto. Eles ensaiaram esta semana no Rio e chamaram a reportagem para falar de música, política e de suas expectativas sobre o Brasil. A amizade dos três da Tropicália e cresceu nesses 30 anos. Gil e Caetano fizeram mais sucesso, mas declararam a influência que Mautner, a quem chamam de profeta, em suas vidas e em suas carreiras. Ele fala pouco, apenas pontua a conversa, como se resumisse o sentimento comum. Agência Estado - É coincidência vocês estarem fazendo shows na mesma época? Gilberto Gil - Absoluta, fiquei sabendo na semana passada, quando eu cheguei de Belém. Como será o show "Eu não Peço Desculpas"? Caetano Veloso - Vai ser muito bom (risos). A gente resolveu fazer o show antes da minha turnê nos Estados Unidos, porque volto só em dezembro, quando vem o Natal e eu vou para Salvador. Um não rouba público do outro, não? Gil - Eu nunca sei dessas coisas (risos). Não sinto essa sensação porque Caetano faz uma coisa especial e há uma expectativa em relação a ele. Eu volto com um show de sucesso, com uma complementação de demanda. Atendimento complementar à demanda excedente (riso). Jorge Mautner - O show do Gil é muito bonito, espetacular.... Gil - Liberou o lado mais negro da minha voz, o cantar alto, a emotividade explícita. Foi o mais interessantes desse trabalho, uma renovada mesmo. Caetano - Para mim foi uma surpresa. Podia ser tudo certo, sem erro, mas redundante. Na verdade, o disco e o show sobre Bob Marley evidenciaram a ligação histórica do Gil com Marley. Têm a dimensão sagrada do repertório, da história do reggae, do pensamento sobre o Terceiro Mundo. E quanto a "Eu não Peço Desculpas"? Caetano - Fiz esse disco para me sentir bem, para fazer para criar coisas mais soltas, mais pop, mais populares. E isso é o tom do Jorge. Gil - Dentro de linhagens populares já reconhecidas, gêneros estabelecidos. "Kaya n´Gan Daya" celebra a alegria e "Eu não Peço Desculpas" parece dizer ´vamos sair da tristeza´... Mautner - Mantendo a angústia, proclama e a celebração da vida. Aliás, é cantando que eu mando a tristeza embora. (risos) Às vésperas das eleições, como vocês se colocam? Gil - Eu sou Lula desde o início do segundo mandato do Fernando Henrique, mas não estou na campanha, não tem sido necessário. A campanha está muito tranqüila; o Lula, muito cônscio de seus deveres de candidato. É um candidato primoroso, magnífico que eu espero que se repita como presidente. (riso) O Lula que trouxe essa idéia de união nacional em torno de uma posição, um deslocamento complicado. Perigoso, mas necessário. E você Caetano, como está nessa situação toda? Caetano - Estou igual, mas a situação está mudando tanto!... Desde o início, gosto dos três candidatos, o Ciro, o Lula e o Serra, das qualidades individuais e do valor histórico das três candidaturas. Não me decidi, mas o Brasil já se decidiu. O que não quer dizer que o Lula já ganhou a eleição. Eu estive com ele na casa do Gil e não disse que ia votar nele. Mas não disse também que não ia votar. Transmiti meus receios das pressões internas e externas. Mas é como o Gil disse. Não é por ser arriscado que você vai deixar de querer, né? As pressões que eu temia com o Lula talvez sejam piores com outro presidente. Eu tinha muita simpatia pelo Ciro Gomes, por causa das coisas que ele falava e ao Mangabeira Unger. Digo isso desde quando o Ciro tentou a eleição há quatro anos e não vi ser publicado na imprensa. Tenho vontade de votar em Ciro só para me opor a isso, mas meu voto é secreto. E o Ciro implodiu a candidatura, com aquelas coisas que falou, o modo de se comportar. Parece que não quer, inconscientemente. Estou falando como um psicanalista (riso), mas é porque gosto muito dele. E o Serra? Caetano - É o candidato mais razoável. Mas é chato falar de política porque parece que estou tomando posição. Não é o caso do Gil que tem uma posição clara. Eu não tenho. Então, eu fico contando às pessoas as minhas dúvidas, por onde minha cabeça anda, os caminhos que ela percorre. Mas o Serra é excelente, vem da área mais bem-sucedida do governo Fernando Henrique Cardoso, por causa das conquistas importantes do Ministério da Saúde, da altivez brasileira no caso dos genéricos. E o Serra foi, no governo Fernando Henrique, o maior crítico dos aspectos menos aceitáveis pelas mentes progressistas das decisões da equipe econômica. Ele deveria representar de pacificação da sociedade e Lula, a ruptura, mas o que a gente está vendo é Lula como consenso. Como vocês imaginam o Brasil em 2003, seja lá quem for o eleito? Gil - Eu imagino que vai dar muito trabalho. Lula vai dar trabalho (riso), não quer dizer exatamente que vai dar emprego. Tomara que esse trabalho se transforme em emprego. (riso) Caetano - Eu tenho dificuldade de imaginar o futuro próximo porque a situação mundial é intensamente dramática. Mautner - Eu vejo o Brasil com o maior otimismo. As novas gerações vão construir tudo, novas estradas, livros, canções. Eu sou um otimista convicto em nome de Jesus de Nazaré e Xangô do candomblé. Em quem votam os filhos de vocês? Caetano - Meu filho que vota, o Moreno, é Lula. Gil - As minhas meninas mais velhas se dividem. A Nara, deve votar no Lula. A Marília, a Preta e a Maria, não sei. O Bem vota no Lula porque é jovem, músico, tem uma posição parecida com os meninos da idade deles que contestam o papel da burguesia na política. Tem uma alma proletária e então vota no Lula. Muitas canções de vocês traduziram um momento político. Houve e há ainda essa intenção? Mautner - Eu tenho. Caetano - Eu não tenho. Às vezes reflete, mas é espontâneo, porque a música tem de ser música e você quer dizer algumas coisas em música, mas não tudo. Nem pensa que a música deve acompanhar os acontecimentos. Eu não Peço Desculpas parece totalmente de brincadeira, mas ali está o homem-bomba, o narcotráfico, em tom jocoso. Gil - Eu faço uma homenagem a Bob Marley e essa pergunta tem a aura política da figura e do discurso dele. O que digo agora atribuo a Bob Marley, a seu ideário progressista. A sociedade não está precisando de linha auxiliar que, em muitos momentos históricos, eram a classe artística e os autores musicais. Serviço - Caetano Veloso e Jorge Mautner. Sábado, às 22 horas; e domingo, às 20 horas. De R$ 20,00 a R$ 100,00. Via Funchal. Rua Funchal, 65, tel. 3846-2300. Gilberto Gil. Sexta e sábado, às 22 horas. De R$ 20,00 a R$ 80,00. Credicard Hall. Avenida das Nações Unidas, 17.955, tel. 6846-6000. Patrocínio: AOL. Em São Paulo.

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