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Gal dá a partida para o reencontro dos Doces Bárbaros

Show da cantora no sábado, ao lado de Ed Motta, no Ibirapuera, é o primeiro de uma série que inclui apresentações de Gil, Caetano e Bethânia e que culmina, no fim do ano, com a reunião dos quatro, 26 anos depois do encontro original

Por Agencia Estado
Atualização:

Os Doces Bárbaros existiram por um show e um disco, gravado ao vivo, em 1976. Reuniam quatro das mais importantes figuras da música brasileira - Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa e Maria Bethânia. Baianos, saíram juntos de Salvador, nos anos 60, para ganhar o País. Trabalharam juntos, eventualmente. Os quatro, de uma vez só, foi uma vez, só. Os Doces Bárbaros foram enredo de escola de samba - da Mangueira, em 1994 -, mas desfilaram em carros separados. Gravaram, no ano passado, o hino do Esporte Clube Bahia, num disco promocional. Mas show, nunca houve. Pois em dezembro, 26 anos depois do encontro original, os Doces Bárbaros estarão juntos, novamente. Farão dois shows. O primeiro, no dia 7, na Praça da Paz, do Parque do Ibirapuera. O segundo, no dia seguinte, na Praia de Copacabana, no Rio. O reencontro é uma produção do projeto Pão Music, do grupo Pão de Açúcar. O projeto prevê espetáculos de cada integrante do grupo - sempre com diferentes convidados e a reunião, no fim do ano. Gal Costa é a primeira. Canta sábado, ao lado de Ed Motta, no Ibirapuera, em São Paulo, e repete o espetáculo no domingo, no Rio. Nos dias 17 (São Paulo) e 18 (Rio) de agosto, será a vez de Caetano Veloso. Maria Bethânia canta nos dias 7 e 8 de setembro e Gilberto Gil encerra o ciclo nos dias 12 e 13 de outubro. Depois, todos se juntam. Gal Costa guarda boas recordações daqueles idos de 1976. "Foi um encontro inesquecível para nós e imagino que também para o público", diz. "Cada um de nós tinha importância grande, já definida, na música popular brasileira, e havia, muito clara, uma irmandade espiritual, que nos interligava." Ela e os três companheiros ainda não se reuniram para decidir como será o reencontro. Mas já está na história. Memória - Eles não eram apenas vozes, ainda que a letra da música dissesse: "Nós somos apenas vozes/ Nós somos apenas nós/ Por exemplo." Nós, por Exemplo foi o nome de um show que Caetano Veloso dirigiu, em 1964, na reinauguração do Teatro Castro Alves, em Salvador. No elenco, além dele mesmo, Gal Costa, Maria Bethânia, Gilberto Gil e Tom Zé. Era um desaforo, que os quatro reminiscentes daquele espetáculo encerrasse, 12 anos depois, seu novo encontro, agora no Canecão, no Rio, sob o nome coletivo de Doces Bárbaros. Vivia-se o que se costuma chamar de época do desbunde. "Fulano? Desbundou." Significava: pirou, endoideceu, entregou-se às drogas, virou hippie - tardio - caiu sem rumo no mundo. À juventude descontente com o regime militar (nada de liberdades civis, censura rígida e repressão feroz aos resistentes) cabia quase que só a adesão ao absurdo da luta armada ou a sisudez da resistência cultural - pela música de protesto, pela literatura cifrada, pelo teatro necessariamente hermético, já que nada podia ser dito com todas as letras. Pouco existiu entre um extremo e outro - e exemplos são o teatro de Zé Celso Martinez Corrêa e o tropicalismo, do qual o show dos Doces Bárbaros era extensão nítida. Entre a brutalidade e a sisudez, o grupo politizou o desbunde, num protesto comportamental - Gil, de tranças, vestia-se como um arlequim, malha branca, cruz vermelha bordada no peito; Bethânia vinha com seus colares religiosos no pescoço; Caetano, de bustiê e calças bufantes; Gal, no esplendor da beleza, era um acinte de sensualidade explícita. Caetano sabia - e o disse muitas vezes - que aquela forma de burlar a rigidez censória (porque não havia nada de claramente subversivo, no décor ou nas palavras) provocava mais interrogações do que mil palavras de ordem. Sabia-o desde o fim dos anos 60, quando explodiu o tropicalismo, e transformou a prática do protesto comportamental em marca. Doces bárbaros, pois é. A canção que deu nome ao grupo diz: "Peixe-espada, peixe-luz/ Doce bárbaro, Jesus/ Sabe bem que é otário/ Peixe nada no aquário." Uma luta para ser travada com "alto-astral, altas transas, lindas canções", recrutando "afoxés, astronaves, aves, cordões" para "avançar através dos grossos portões". Não ouviu quem não quis ouvir. O show colecionava, de quebra, clássicos como Esotérico (Gil), Um Índio (Caetano), São João, Xangô Menino (dos dois) e até uma rara parceria de Gal com Caetano e Gil, Quando. O disco tornou-se um dos fenômenos da indústria fonográfica da época e está disponível em CD.

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