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Filarmônica de Pasárgada explora as linguagens digitais no disco 'Algorritmos'

Novo disco da trupe paulistana discute como os meios digitais afetam a vida contemporânea

Por Pedro Antunes
Atualização:

Numa não tão hipotética situação assim, o rapaz ou garota, apaixonado por outro alguém, planeja fazer a sua declaração online. Com a limitação do uso dos 140 caracteres do Twitter, arrisca, enrola, dá voltas e prepara-se para o grande “eu te amo” quando percebe que já havia estourado o limite de letras disponível. “Eu digo que te...”, canta Paula Mirhan, uma das vocalistas da Filarmônica de Pasárgada, em 144 Caracteres, quarta faixa do novo disco da trupe paulistana Algorritmos (Coaxo do Sapo, R$ 25). A letra de Marcelo Segreto, compositor, guitarrista e por vezes também vocalista do octeto, é ácida. Sem dizer muito – e inclusive deixando o amor de fora literalmente –, apresenta a reflexão de como a vida contemporânea, quando humanidade e o ambiente virtual se confundem, se misturam e se atrapalham. 

Dois bons discos depois, O Hábito da Força (2012) e Rádio Lixão (2014), a banda volta a entrar nesse diálogo entre os ambientes físico e online, como fizeram quando participaram da gravação do EP Tribunal do Feicebuqui, de Tom Zé, lançado em 2013. Lá, o mestre tropicalista rebatia as acusações que sofria online. Era um exemplo, três anos antes da chegada de Algorritmos, de como os limites entre os mundos já não era tão claro. E facilmente a vida em carne e osso era afetada por bites e linguagens em HTML. 

Filarmônica de Pasárgada Foto: Ines Bonduki/Divulgação

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Algorritmos é, desde sua fundação, um exercício ousado de transformar a linguagem da composição de uma canção e levá-la à fronteira virtual. Como a construção das relações humanas foi transformada pela ausência de pele com pele um beijo no rosto? Um “eu te amo” é incompleto por falta de espaço no Twitter, em 144 Caracteres, mas há também a melancolia de Offline, quando Paula se lamuria sobre como é possível algo tão impalpável quanto um e-mail pode fazer doer no plano físico.

“Desde Rádio Lixão, pensava num disco que tivesse essa temática”, explica Segreto, autor de todas as 15 canções – embora algumas delas tenham parceria, como Ctrl C ctrl V (com Paula Mirhan), São SP (com Martim Bernardes, d’O Terno e Tom Zé) e 7 Comentários (com sete compositores). Segreto criou canções sob a influência da colaboração anônima das páginas da Wikipédia (em Kiwi), sobre a enxurrada de comentários em um post de Facebook (7 Comentários), e sobre um chat naquelas salas de bate-papo virtual (Fernando Henna Está Online). 

É curioso, contudo, como é a humanidade que salta aos ouvidos em canções tão inorgânicas. Não é por acaso que Offline encerra o disco. A personagem – a mesma de 144 Caracteres – desconecta-se de tudo. E, frente a frente, consegue dizer aquilo que o twitter lhe impedira. Algorritmos chega ao fim da forma mais humana possível: com o verso de “eu digo que te amo”. 

FILARMÔNICA DE PASÁRGADA Auditório Ibirapuera.  Av. Pedro Alvares Cabral, s/nº,  Portão 2, tel.: 3629-1075.  6ª (2), às 21h. R$ 20

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