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Filarmônica de Dresden faz concerto único em SP

Sob a regência de Gerd Albrecht, orquestra apresenta-se nesta quarta-feira, na Sala São Paulo

Por Agencia Estado
Atualização:

Aos 17 anos, Gerd Albrecht saiu de Hamburgo e, de bicicleta, percorreu 800 quilômetros até Salzburgo, onde assistiu uma produção da ópera Elektra, de Richard Strauss, com a Orquestra Filarmônica de Viena regida por Dimitri Mitropoulos. Extasiado com o que acabara de ver, o jovem presenciou uma cena que marcaria toda a sua vida. Após o concerto, os músicos abandonaram seus instrumentos e uniram-se ao público em uma grande ovação ao maestro. A este gesto, Mitropoulos respondeu com um grito de basta e, com o sotaque carregado gritou: "Parem com isso. Não gosto de ser aplaudido quando faço a orquestra tocar forte. Isso é estupidez. A verdadeira música, inteligente, é tocada em piano". Décadas depois, Gerd Albrecht, que rege a Orquestra Filarmônica de Dresden em concerto único, amanhã, na Sala São Paulo , relembra a cena e afirma que a mensagem passada por Mitropoulos nunca saiu de sua cabeça. É em busca dessa sonoridade clara, pura e inteligente que ele afirma ter guiado seu trabalho. Foi isso, também, que orientou a escolha do programa. No concerto que faz em São Paulo, a orquestra interpreta a abertura Der Freischütz que, mesmo abrindo a ópera de mesmo nome de Carl Maria Von Weber, é constantemente incluída sozinha em programas de concertos por todo o mundo. Na seqüência, aparece o Concerto n.º1 Para Piano e Orquestra de Beethoven, um dos favoritos do público e dos pianistas (os solos serão do alemão Camillo Radicke). A Sinfonia n.º 4, de Robert Schumann, encerra a apresentação. Segundo Albrecht, as peças casam bem com o estilo de interpretação da Filarmônica de Dresden. "Ela possui uma maneira calorosa e bastante característica de interpretar a música romântica alemã", afirmou em entrevista ao Estado. Tradição - Aliás, para ele, esta é uma das grandes qualidades da orquestra, fundada em 1870 e que tem como diretor musical o francês Michel Plasson. "Se você ouve no rádio Gigli, Callas, Flagstad ou Caruso cantando, imediatamente reconhece suas vozes, no entanto, hoje, se o que você está ouvindo é uma orquestra, não dá para saber quem está tocando: todas, com pouquíssimas exceções, soam da mesma maneira, não há mais uma sonoridade característica." Para ele, hoje, as orquestras inglesas, americanas e francesas soam de forma muito parecida. "Até mesmo a Filarmônica de Berlim perdeu algo que fazia dela uma referência musical", acredita. Já nas orquestras do leste europeu, Albrecht acredita que a situação é um pouco diferente. "De certa forma, essas orquestras mantêm algumas características ligadas a suas tradições." A tradição, aliás, para o maestro, é algo essencial no trabalho das orquestras. "Não quero ofender a Sinfônica de Chicago ou outras orquestras americanas ou da Europa, mas é muito importante para um grupo orquestral não perder a tradição." Para explicar esse "problema", Albrecht recorre a duas razões principais. A primeira é a busca incessante, e nem sempre produtiva, da perfeição. Outra explicação está no fato de as orquestras buscarem tocar sempre "mais forte". "Hoje mesmo estive almoçando em um restaurante italiano aqui em São Paulo e estava tocando no rádio música italiana cantada pelo tenor Andrea Bocelli; tive que pedir para abaixar o volume, pois não conseguia nem comer nem ouvir a música direito: as pessoas acham que a música interessante é aquela que é tocada de modo forte, alto, o que não é verdade", explica o maestro. Antigo regente principal da Deutsche Oper de Berlim e já tendo regido todas as principais casas de ópera da cidade, Albrecht critica, também, a intervenção de políticos e burocratas na área cultural. "Esse projeto de unificar as casas de ópera berlinenses é absurda." Essa postura também está de acordo com a luta pelo resgate da tradição. "Eu cresci vendo óperas nessas casas, já regi em todas elas e sei que as tradições, as características e as personalidades de cada uma são muito diferentes." Albrecht coloca-se, também, ao lado do maestro Daniel Barenboim, que anunciou sua saída da direção da Staatsoper de Berlim no ano que vem devido a conflitos com o governo local. "Ele está muito desapontado pois não há interesse político: eles prometem investimentos desde que ele assumiu mas se revelam verdadeiros mentirosos." Orquestra Filarmônica de Dresden - Quarta-feira (27), às 21 horas. De R$ 60,00 a R$ 180,00. Sala São Paulo. Praça Júlio Prestes, s/n.º, tel. 3351-8000.

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